- O Globo
O novo episódio político revela como a presidente Dilma é confusa na administração de crises. Primeiro, isolou o vice-presidente da República, agora se encaminha para entregar a ele a articulação política. Isso depois de ter convidado um ministro do PMDB para a função, ter desagradado o partido, provocado a demissão do ministro do PT e ouvido um "não" como resposta. Tudo isso em 24 horas.
Na economia, um quadro político assim produz incertezas que se juntam a outras fontes de dúvidas e reduzem qualquer ímpeto de investimento. Em cada área que se olhe, há problemas sobre como se atravessará o ano, que é recessivo, de inflação alta, e em que a presidente bate cabeça na área política sem conseguir ser o polo de atração que normalmente o governante consegue ser no presidencialismo.
De novo, os líderes políticos reclamam da forma como a presidente conduz suas ideias de solução dos problemas políticos: sem consultas aos líderes da base que ela precisa unificar. Em momentos como esse, não funciona inventar uma solução e impor à base de sustentação. Não se pode também expor mais fragilidades. A cada evento como o do ministro Eliseu Padilha, mais fraca fica a presidente. Não se sabe como vai funcionar, porque a articulação política sem a Casa Civil é fraca.
Na economia, aumentam as incertezas. As empresas vivem seu próprio tormento de um país em recessão, com inflação alta e com dificuldades de prever a demanda para seus produtos. A Anfavea, entidade que reúne as montadoras de veículos, reduziu ontem para 10% de queda as projeções de produção de automóveis este ano. Como no ano passado houve diminuição de consumo, o setor considerava a hipótese de uma recuperação em 2015. Previa alta de 4% na última projeção. Agora, prevê queda de 10%.
É um setor grande, que teve alta forte de vendas em anos anteriores e muito apoio do governo, mas há setores mais fracos e mais expostos às intempéries. De Brasília não vem qualquer sinal de que os administradores sabem para onde vão.
Há uma agenda a ser tocada, mesmo em períodos de crise, para criar as bases para a retomada. Uma agenda microeconômica de retirada de obstáculos do caminho das empresas, como redução da burocracia e das dificuldades na área normativa. Mas o governo administra o país por espasmos. De repente, vem um decreto presidencial que promete facilitar as licitações para retomar o processo de concessões de rodovias e ferrovias. De repente, aparece uma alta de imposto ou ameaça de nova tributação.
O governo manda Medidas Provisórias do ajuste fiscal para o Congresso, e em seguida emite sinais de que pode ceder e alterar a proposta. Mesmo tendo um político na chefia da Casa Civil e tendo - até ontem pelo menos - um ministro do partido da presidente no ministério que cuida da articulação política, quem é enviado ao Congresso para negociar com os presidentes das duas Casas ou líderes políticos é o menos político dos ministros: Joaquim Levy, da Fazenda.
A presidente enfraquece os ministros que deveriam fazer a articulação, o governo anuncia como fato consumado o que não foi ainda amadurecido. A chefe do time escala mal os jogadores, e ainda manda o zagueiro ir para o ataque. O meio de campo está completamente embolado. Mesmo setores que não dependem do governo para tocar seus negócios estão hoje em dúvida sobre a conjuntura econômica e política do país.
A inflação terminou o primeiro trimestre em um nível intolerável. A previsão do professor Luiz Roberto Cunha, da PUC-Rio, é de que hoje será anunciado que o IPCA de março ficou em torno de 1,4%. Isso levaria a inflação em 12 meses a passar de 8%. Um nível alto assim alimenta expectativas negativas. O empresário, mesmo sabendo que pode diminuir a demanda por seus produtos, prefere elevar o preço para garantir a manutenção da margem de lucro. Há vários setores na área de serviços que estão reajustando preços em 10%.
Crescem os custos financeiros das empresas e das famílias. O preço da energia em alta está elevando a inadimplência, o que pode provocar mais aumento de tarifas. O país está refazendo um circulo perigoso que leva à mais inflação.
A presidente Dilma não pode continuar improvisando na área política e na economia. Incerteza é o pior ambiente que existe para a retomada do crescimento que se espera que aconteça em 2016.
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