• Coisa jamais vista: um ministro é convidado para outra pasta e joga a presidente da República na frigideira
- O Globo
Para o governo, diante das manifestações de rua e da queda de sua popularidade, era necessário haver mais diálogo “de coração aberto”. E assim foi convidado o ministro Eliseu Padilha. Dilma Rousseff em 2015, chamando-o para a pasta da Coordenação Política? Coisa nenhuma, Fernando Henrique Cardoso em 1997, nomeando-o para o Ministério dos Transportes. Atazanado pelas pesquisas de opinião e pela inevitável rebelião do PMDB no Congresso, o presidente agradou ao deputado Michel Temer e recompôs sua base parlamentar. Padilha assumiu dizendo que “qualquer suspeita de corrupção deve ser investigada a fundo”.
Em 1997, FH relutou durante três meses para nomear Padilha. Em 2015, num episódio inédito foi ele quem relutou em fazer a troca. São comuns os casos em que uma pessoa é convidada para um ministério e recusa. A escolha recente de Luiz Carlos Trabuco para a Fazenda foi um exemplo disso. Em geral, essas sondagens são mantidas em sigilo e a recusa é educadamente dissimulada. No caso de Trabuco, construiu-se meio vexame, pois ela foi pública. Com Padilha, articulou-se o vexame total. Um ministro da pasta inútil da Aviação Civil resistindo publicamente a trocar de cadeira foi coisa nunca vista. A ideia de que, mesmo assim, continue ministro, jamais foi imaginada. A doutora Dilma ficou numa posição vexatória. O desconforto cresce quando se sabe que Padilha iria para uma posição relevante. Faltou ao PMDB o respeito à regra de etiqueta enunciada pelo bandido Elias Maluco aos policiais que o capturaram: “Não esculacha.”
Nas semanas seguintes à reeleição da doutora, o comissariado do Planalto teve a ideia de excluir o PMDB do centro de decisões do governo. Os 55 milhões de votos que ela recebera pareciam um cacife suficiente para aquilo que os petistas achavam que era uma manobra estratégica. Como todo o poder emana do povo, eles eram o povo e não haveria o que discutir. Arlindo Chinaglia seria o novo presidente da Câmara, o ajuste fiscal seria o salto para a marquetagem do novo patamar de progresso e, enfim, começaria o governo do PT. Era delírio e deu tudo errado, com quatro comissários batendo cabeça na coordenação política do governo. A ida de Padilha para essa cadeira fazia muito sentido. Seus cinco antecessores vieram do PT e a entrega da posição a um cacique do PMDB mostrava um passo conciliador da doutora.
O PMDB está rebelado (até onde e para que, só seus caciques sabem) e parece surfar na onda de impopularidade que emborcou o governo da doutora. Há aí uma curiosidade, ele se aproveita da insatisfação da rua mas não a representa. Quem quiser testar essa hipótese pode sair no próximo domingo com uma faixa: “Viva Renan Calheiros” ou “Todo o poder a Eduardo Cunha”. Ambos estão na lista do procurador-geral Rodrigo Janot. Os marqueses do partido sabem disso e movem-se com a única finalidade de enfraquecer o governo. Para quê?
Olhado da rua, o PMDB não é parte da solução, mas do problema. Por pior que seja a agenda da doutora Dilma, é difícil encontrar alguém que prefira a de Renan Calheiros e Cunha, até porque não sabe qual seja.
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Elio Gaspari é jornalista
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