- O Estado de S. Paulo
Apesar de todo o cuidado e de todas as ressalvas que o fato e o momento exigem, a delação premiada do senador Delcídio Amaral é álcool puro na fogueira no impeachment da presidente Dilma Rousseff e abre uma nova fase da interminável crise brasileira: a montanha-russa já foi mensal, passou a ser semanal, virou diária e agora começa a ser de hora em hora.
Vejamos como foi o dia de ontem. Pela manhã, a reação geral à reportagem de Débora Bergamasco, na revista Isto É, foi apontando Delcídio Amaral como “o Pedro Collor de Dilma Rousseff”. Assim como Pedro derrubou o irmão Fernando Collor, Delcídio estaria enterrando o mandato de Dilma, de quem foi líder no Senado.
Já pela hora do almoço, depois de uma reunião de Dilma com Jaques Wagner e José Eduardo Cardozo, o governo ensaiava a estratégia de desqualificar o novo delator da Lava Jato e tudo o que ele fala. Delcídio era ótimo, a ponto de virar líder do governo, mas virou péssimo, a ponto de não valer mais um tostão furado.
No meio da tarde, Wagner armou-se de adjetivos e declarou que a delação não tinha sido homologada, não se sabia sequer se a reportagem era verdadeira e não havia prova de nada. Em seguida, Cardozo armou-se de dados objetivos para dar entrevista rebatendo, ponto a ponto, tudo o que havia sido publicado. De tão longa e de tão consistente a entrevista, ficou parecendo que ele já conhecia muito bem a delação e já se preparara previamente para reagir.
Para fechar o dia, eis que o advogado de Delcídio, Antônio Figueiredo Basto, curiosamente especialista em delações premiadas..., diz que ele e seu cliente não reconheciam a autenticidade dos termos publicados pela revista, nem tinham sido consultados. Mas, atenção!, em nenhum minuto, em nenhuma linha, ele disse que a delação não existiu.
Apesar de todo o suspense, a nova bomba incendeia novamente a tese do impeachment por vários motivos, a começar do fato de que Delcídio não é qualquer um, ele era próximo de Lula e, como líder do governo, participava de reuniões dentro do Planalto e dividia segredos com a própria presidente da República.
Tudo o que ele diz pode até ser um “conjunto de mentiras”, como classificou Cardozo, mas cada uma das histórias tem lá seu fundo de verdade ou, ao menos, ares de veracidade. Dilma, efetivamente, se encontrou fora com o presidente do STF, Ricardo Lewandowski, em Portugal. Ela sempre se esforçou para defender as empreiteiras, o que pode explicar, por exemplo, os termos camaradas definidos para os acordos de leniência das empresas. E, por fim: a Lula, não convinha nem um pouco que seu compadre José Carlos Bumlai entrasse na Lava Jato e saísse dela abrindo o bico.
Há, também, o ambiente em que tudo isso explode, com quatro fatores de origens diferentes incendiando o impeachment: é o começo do fim de Eduardo Cunha, desde ontem réu no STF. Isso tira o bode da sala do julgamento da presidente da República na Câmara; João Santana, o marqueteiro de Dilma no governo e nas eleições de 2010 e 2014, que está desde ontem em prisão preventiva, sem tempo para terminar, não apenas sabe como participou de coisas do arco-da-velha; a economia vai ladeira abaixo e exatamente ontem os parlamentares e os brasileiros ficaram sabendo que a recessão de 2015 foi de 3,8%, o pior resultado em 25 anos, com um recuo da indústria de 6% e do consumo das famílias, de 4%, uma tragédia; e vêm aí as manifestações do dia 13 de março!
É assim que, seja ou não Delcídio um novo Pedro Collor, o fato é que suas revelações, suas insinuações e o seu protagonismo na sucessão de escândalos forçam uma comparação inevitável entre a situação do Brasil neste governo e no governo Collor e entre este momento de Dilma e os últimos momentos de Collor.
Tudo pode efetivamente acontecer.
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