A cada nova estocada da Operação Lava-Jato, a presidente Dilma Rousseff fica mais isolada. Depois da prisão do marqueteiro João Santana, responsável pelas campanhas da presidente e um de seus conselheiros políticos, as investigações chegaram perto dos condutos de recursos que abasteceram a corrida eleitoral da reeleição. A situação de sítio e de perda de iniciativa política do Planalto, que já era aguda, tornou-se muito mais grave depois que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o PT dispararam seu arsenal de críticas contra o governo.
As insatisfações de Lula e do PT, assim como a fraqueza da presidente Dilma, desaguaram em nova mudança nos ministérios. Depois de pressionar por uma guinada na política econômica, e obter a saída do ministro Joaquim Levy, a campanha de Lula agora detonou o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, pelos piores motivos. A função de Cardozo não era defender petistas em apuros diante da Justiça nem conter a Polícia Federal, e sim garantir condições para que a PF realize investigações e que o direito de defesa dos acusados seja amplamente assegurado.
A isenção republicana de Cardozo, e também da presidente Dilma, é, além disso, a forma natural de proteger um governo politicamente acuado. Com a montanha de suspeitas e condenações que a Operação Lava-Jato já produziu, qualquer tentativa de interferência na condução do processo no Ministério Público e PF não apenas reduziria a pó a ínfima popularidade da presidente, como a colocaria mais perto do impeachment. O ponto de inflexão para Cardozo foi a aproximação das investigações de Lula, que tem condições e recursos mais que suficientes para se defender publicamente - e tem se defendido mal.
A saída de Cardozo foi feita sob pressão de Lula, que criticou sua inação diante de abusos da PF e do Ministério Público no seu caso. Com a transferência de Cardozo para a Advocacia Geral da União, o ex-presidente avançou mais sobre o governo, onde conta com o núcleo político do Planalto - Jaques Wagner, na Casa Civil e Ricardo Berzoini, na Secretaria de Governo. Wagner trouxe para a Justiça alguém de sua estreita confiança, o ex-chefe do MP na Bahia, Wellington César Lima e Silva. Suas relações com Leandro Daiello, diretor-geral da PF, indicarão se os temores de um "enquadramento" da Lava-Jato com a troca de ministros tem ou não fundamentos.
A Lava-Jato, porém, não é o único fator a elevar muito o nível de tensão entre Lula, o PT e a presidente Dilma Rousseff. Com a imagem progressivamente corroída pela Lava-Jato, Lula, candidato à Presidência em 2018, precisa de uma guinada na economia que deixe para trás os efeitos da desastrosa política econômica do primeiro mandato. A recessão se aprofunda e leva consigo o emprego, em uma trajetória em que o crescimento só aparecerá em 2017 e, mesmo assim, tímido e vacilante. A conta política do governo Dilma, gostem ou não os petistas, será debitada em Lula, o mentor e maior cabo eleitoral da presidente.
A presidente Dilma, porém, após a implosão da economia, parece hoje ter pelo menos alguma noção do que não deve ser feito. Lula incentivou, e o PT produziu no encontro da legenda em comemoração a seus 36 anos, um programa econômico de emergência feito sob medida para acelerar a trajetória do Estado brasileiro rumo à insolvência fiscal e à disparada da inflação. O programa, intitulado "O futuro está na retomada das mudanças", tem seu eixo em torno da "adoção de um plano audacioso de investimentos públicos e expansão dos gastos sociais".
Diante da penúria de recursos, o PT propõe basicamente reduzir os juros, aumentar de todas as maneiras possíveis os impostos sobre as camadas de renda média e alta e usar parte dos recursos das reservas internacionais para a criação de um Fundo Nacional de Desenvolvimento e Emprego.
Em si, o programa é péssimo, e o fato de Lula flertar com ele mostra errado senso de oportunidade, já que em seus dois governos, até perto da eleição de 2010, não fez nada parecido com o que o PT propõe agora - aliás, nem com o que a legenda propunha antes de ele ser eleito pela primeira vez.
O resultado do afastamento de Lula e PT da presidente amplia a desorientação e fraqueza do governo e dá chances ao imponderável. Câmara e Senado, dirigidas por dois políticos envolvidos na Lava-Jato, ameaçam abrir mais uma caixa de Pandora, ao prometerem seguir uma agenda própria de projetos - um sinal seguro de que tudo ainda pode piorar mais.
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