quinta-feira, 30 de junho de 2016

BC observa política fiscal e câmbio para mover os juros - Editoria / Valor Econômico

O Banco Central vai manter a taxa de juros em 14,25% até que haja sinais inequívocos de que a inflação chegará ao centro da meta no ano que vem. Os números contidos no Relatório trimestral de inflação indicam que, nos cálculos do BC, ela chegará a 4,7% no último trimestre de 2017, para cair até abaixo do centro, a 4,4%, no primeiro trimestre de 2018, se a Selic for mantida e a taxa de câmbio ficar em R$ 3,45 por dólar. As novas projeções, por si só, afastaram a hipótese de adoção de uma meta ajustada que, de alguma forma, abrisse espaço para baixar juros no curto prazo.

O novo presidente do BC, Ilan Goldfajn, foi direto e claro em sua exposição durante a divulgação do relatório. O BC perseguirá o centro da meta de 4,5%, sem ressalvas. Dadas as condições da evolução dos preços, com altas motivadas pelos alimentos, o BC não vê condições para baixar a guarda. Ou, em suas palavras, "o cenário central não permite trabalhar com a hipótese de flexibilização das condições monetárias". Diante da mensagem clara, o mercado se alinhou logo, transferindo suas expectativas de queda da Selic para o último trimestre do ano, derrubando as taxas longas e elevando as de curto prazo.


Para a consecução de seu objetivo, o BC colocou como um fator vital, várias vezes repetido, a estabilização e, depois, a redução do endividamento público. "Há avanços no combate à inflação, mas sua continuidade depende de ajustes - principalmente fiscais - na economia brasileira", aponta o documento. O BC nele considera um déficit primário de 2,6% do PIB este ano e está no escuro em relação ao alvo da equipe da Fazenda em 2017. Reverter a situação fiscal contribuirá para uma mudança de expectativas que reforçará o ajuste econômico e permitirá a retomada do crescimento em bases sólidas.

Mas há incertezas na rota fiscal. Até agora, o déficit previsto do governo central, de R$ 170,5 bilhões, quase o dobro do projetado pela equipe da presidente afastada Dilma Rousseff, tem sancionado aumentos de despesas - já previstas, segundo a equipe econômica. Nessa lista entraram os reajustes generalizados aos servidores (custo de R$ 67,5 bilhões) e, agora, presumivelmente, o reajuste de 12,5% nos benefícios do Bolsa Família, maior do que os 9% anunciados por Dilma.

A Fazenda promete fixar uma meta de superávit primário, que poderá dirigir os esforços para maior contenção de despesas. O esforço fiscal para o ano não é forte, o que, pode se supor, é parte de uma estratégia política para impedir dissabores ao presidente interino Michel Temer até que seja aprovado, ou não, o impeachment de Dilma Rousseff. Como o nível de gastos parte de uma base recorde (19,5% do PIB) e passará, se o Congresso aprovar, a ser corrigido apenas pela inflação, as despesas crescerão em 2017 acima da inflação corrente do ano. Tudo dependerá do desempenho da receita e da meta, já que o gasto é dado.

Para que o BC se sinta confortável para baixar os juros, em seus próprios termos, não há tempo hábil, pela forma de ajuste escolhida, para uma inequívoca mudança de rumo fiscal. O BC conta possivelmente mais com um sinal da direção para afrouxar a política monetária e esse sinal é provável, mas não absolutamente certo.

Não está dito nem é explícito como política, mas a aceitação da apreciação cambial pode ajudar a pôr a inflação nos trilhos, como na gestão de Henrique Meirelles. No ano, o real é uma das moedas que mais se valorizaram no mundo e ontem fechou a R$ 3,24 (ptax). Mesmo assim, a desmontagem dos swaps cambiais foi interrompida e não houve qualquer atuação do BC para suavizar oscilações do câmbio.

Para o estrito combate à inflação, a apreciação ajuda, ainda mais enquanto do lado fiscal há apenas promessas. Mas há efeitos colaterais, como a reversão do único impulso positivo até agora para o crescimento, vindo do setor externo. A tendência atual é por mais apreciação, como efeito do adiamento da alta dos juros nos EUA, da alta taxa doméstica, dos grandes saldos comerciais (US$ 41,7 bilhões em doze meses até maio), da decorrente e rápida redução do déficit em transações correntes (projeção de 1,5% do PIB para o ano), da provável onda de afrouxamento monetário adicional na Europa e Japão e da manutenção dos bons fluxos de investimento direto. Em relação a uma cesta de moedas, o real se valorizou 17% no ano. Não está claro como o Banco Central agirá no câmbio, mas a inação também faz sentido.

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