O acordo firmado anteontem entre o presidente Michel Temer e os governadores dos Estados – para a suspensão por seis meses e, depois, descontos até o final de 2017, do pagamento da vultosa dívida destes com a União – teve a contrapartida do apoio a uma peça-chave das mudanças fiscais propostas pela nova equipe econômica do Palácio do Planalto: a PEC da limitação constitucional dos gastos públicos federais, dos estados e municípios. Além de demonstrar a capacidade de Temer de juntar todos os governadores em torno do enfrentamento da explosiva crise dessa dívida, que se arrastava há anos e já fora transferida para o STF (o que agora está suspenso). As concessões feitas terão um alto custo para o Tesouro Nacional. Mas o acordo abre caminho para a aprovação da PEC do Teto, após a confirmação pelo Senado da recriação ampliada da DRU (já aprovada na Câmara), e reforça as perspectivas favoráveis ao envio ao Congresso de outras reformas relevantes, como a da Previdência e a da terceirização das relações de trabalho. E para a viabilidade de iniciativas importantes à retomada de investimentos, como a do relançamento, em bases realistas, de concessões nas áreas da infraestrutura. Bem como, antes disso, para a conversão de interino em permanente do chefe do novo governo.
Passos concretos para tais reformas, porém, só serão dados depois da decisão final do Senado sobre o impedimento da presidente afastada. Decisão também favorecida pelo salto de governabilidade do país representado pelo acordo sobre a dívida. Que debilitou ainda mais as tentativas de protelação a qualquer custo, dos trabalhos da Comissão de Impeachment. Num contexto em que o processo de conversão de Temer de presidente interino em permanente resistiu bem à denúncia do envolvimento do seu nome com o petrolão (na delação do ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado), tendo peso bem menor do que aquelas (como a de Marcelo Odebrecht) que vão atingindo diretamente Dilma com o uso – aqui e no exterior – de vultosas propinas no financiamento de suas duas campanhas presidenciais.
Os partidos e as eleições de 2016 e 2018
A multiplicidade de siglas partidárias (35 registradas) constitui um dos ingredientes bem negativos das campanhas para o pleito municipal de outubro próximo. Mas dificilmente resistirá às mudanças do sistema partidário a se imporem até as eleições nacional e estaduais de 2018. Por causa das evidencias crescentes do papel fisiológico da grande maioria delas. Agravado pelo de forte fator de queda dos padrões de governabilidade nas três esferas do poder público que representa. O caminho provável para o enfrentamento do problema será a retomada pelo Congresso Nacional da cláusula de barreira, após revisão de postura contrária pelo STF. Esta constitui uma mudança, urgente e viável, desse sistema. O qual, embora atingido amplamente pelas investigações da operação Lava-Jato e paralelas, é peça relevante das instituições democráticas e terá de recompor-se em torno de partidos dotados de representatividade, com a troca de lideranças envolvidas em denúncias de tais investigações que sejam confirmadas nos respectivos julgamentos. E não sendo substituídos por legendas criadas artificialmente e por candidatos travestidos de “salvadores da pátria”.
Outra mudança, neste caso restabelecimento de regra anterior, poderá resultar da inviabilidade que o pleito municipal deve demonstrar do financiamento das campanhas exclusivamente por pessoas físicas, adotado sob o impacto da Lava-Jato. Que, se aplicado para valer, começará inviabilizando as campanhas de concorrentes dos candidatos das máquinas estatais. E que, com a aplicação “pragmática” que vai ter, certamente generalizará a busca, por estes e por seus adversários, de recursos para campanhas por meio de “Caixa 2”. Na contramão do propósito explicitado pelo Judiciário de moralizar as disputas eleitorais. Com o objetivo ético pretendido sendo anulado pela combinação da persistência dos candidatos governistas do uso das máquinas administrativas com uma escala bem maior do uso do “Caixa 2” por vários candidatos. A alternativa – realista e própria de um país de economia de mercado, e democraticamente correta – não é a da experiência ilusória que será feita no pleito municipal à frente, nem a da proposta do PT para a implantação permanente do financiamento público exclusivo. Que elevará ainda mais as despesas do financiamento estatal dos partidos. Mas a de retomada do financiamento também por pessoas jurídicas com regras e limitações precisas e completa transparência para o conjunto da sociedade. Regras definidas sob os efeitos da Lava-Jato no desmonte da “corrupção sistêmica” institucionalizada pelos governos lulopetistas. E que bloqueiem também as não ou menos sistêmicas relações promíscuas entre os interesses privados, os partidos e os governos dos três níveis da federação.
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Jarbas de Holanda é jornalista
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