Por Tainara Machado, Sergio Lamucci e Estevão Taiar – Valor Econômico
SÃO PAULO - Perto de completar três anos em recessão, a economia brasileira está demorando mais para se recuperar da atual crise. Os consumidores estão endividados e a taxa de desemprego chegou a 11,8%, com 12 milhões de pessoas desocupadas. As empresas estão em situação financeira delicada, o que dificulta os investimentos. A indústria apresenta quadro de grande ociosidade, o que também a desestimula a investir.
A crise fiscal, que afeta todo o setor público, é a mais grave desde os anos 80, deixando claro que não virá daí o impulso à atividade. As exportações têm participação relativamente pequena no PIB e, além disso, a demanda externa também está fraca. As concessões de infraestrutura, que poderiam movimentar o setor de construção, caminham lentamente e os juros seguem muito altos, embora o Banco Central já tenha começado a reduzi-los.
A recessão, que começou no segundo trimestre de 2014, deve durar pelo menos até 2017, avaliam economistas. O ambiente político conturbado e o aumento da volatilidade nos mercados com a eleição de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos também contribuem negativamente para a retomada da atividade.
Até agosto, a expectativa era que no terceiro trimestre deste ano a atividade voltaria ao terreno positivo, uma vez que houve aumento da confiança dos empresários e dos consumidores após o afastamento definitivo da presidente Dilma Rousseff. O cenário esperado, porém, não se confirmou.
Apesar dos avanços da agenda fiscal no Congresso, economistas e empresários ouvidos pelo Valor dizem que o governo deveria acelerar a tramitação da reforma da Previdência e as concessões de projetos de infraestrutura para ajudar na retomada. Está numa queda mais rápida dos juros, porém, a esperança de um estímulo mais efetivo à recuperação da economia.
Dívidas, juros altos e crise fiscal retardam fim da recessão no país
A recessão da economia brasileira, que começou no segundo trimestre de 2014, ainda deve durar pelo menos até 2017, avaliam economistas. Os motivos que atrapalham o crescimento ainda são muitos: do elevado endividamento do setor privado até crise fiscal nos Estados e no governo federal, juros altos, ambiente político conturbado e aumento da volatilidade nos mercados com a eleição de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos, tudo deve fazer com que o país só volte a ter crescimento no primeiro trimestre do ano que vem.
Até o início de agosto, a expectativa era que já no terceiro trimestre deste ano a atividade voltasse para o terreno positivo, baseada no aumento da confiança, cenário que não se concretizou.
Para economistas e empresários, o governo deveria acelerar a tramitação da reforma da Previdência e as concessões de projetos de infraestrutura para dar um empurrão à retomada, mas está nas mãos do Banco Central o principal estímulo possível para a atividade neste momento: o corte mais rápido da taxa básica de juros.
Para Fernando de Holanda Barbosa, professor da Escola Brasileira de Economia e Finanças da Fundação Getulio Vargas (FGV), cortes de juros maiores são o único instrumento disponível para incentivar o crescimento. O economista diz que a aprovação da PEC do teto do gasto e o encaminhamento da reforma da Previdência no começo de 2017 abririam espaço para que a Selic chegasse à casa dos 10% já no fim do primeiro semestre, "dando início a um círculo virtuoso".
Barbosa defende que, com as expectativas para a inflação de 2017 em 4,9% e a taxa de juros de longo prazo em 5%, a Selic em torno de 10% representaria uma "taxa de juros neutra": nem expansionista, nem contracionista. A Selic está hoje em 14% ao ano.
Ele afirma que a crise de solvência de governo federal e dos Estados impede que o setor público promova uma política fiscal expansionista. Por isso, a política monetária seria o caminho que levaria à retomada da economia. "Não pode baixar os juros na marra, mas o quadro já sinaliza essa possibilidade", diz.
A queda da Selic, segundo ele, faria não só com que as famílias aumentassem o consumo e os empresários investissem mais, mas também com que ambos renegociassem suas dívidas em condições mais favoráveis.
Para Daniel Weeks, economista-chefe da Garde Asset Management, a confiança maior não resultou em crescimento de fato porque além do setor público endividado, o setor privado também está afundado em dívidas. "Ficou mais claro que só a confiança não é suficiente para a retomada, as empresas e famílias precisam de tempo para digerir as dívidas", diz.
Estudo do Centro de Estudos do Instituto Ibmec (Cemec) mostra que metade das empresas avaliadas tinha fluxo de caixa menor do que as despesas financeiras em 2015. Ao longo de 2016, não há sinal de que o cenário melhorou. Segundo reportagem do Valor, de julho a setembro, pela primeira vez em mais de quatro anos, a receita líquida de 278 empresas de capital aberto apresentou queda nominal de 3% na comparação com o mesmo período do ano passado. Em termos reais, é um tombo de quase 10%. O aumento da volatilidade depois da eleição de Trump também fechou, ao menos temporariamente, o mercado para captações externas, adicionando pressão sobre o custo do dinheiro para as empresas.
O cenário crítico de endividamento das companhias brasileiras se reflete no aumento dos pedidos de recuperação judicial ao longo de 2016, que mais do que dobraram em relação ao ano anterior.
"Nesses processos de desalavancagem, é natural que haja uma "ressaca", uma período de crescimento muito baixo", diz Weeks. A boa notícia, afirma, é que, ao contrário dos países desenvolvidos que lidaram com essa situação depois da crise financeira de 2008, o Brasil ainda tem espaço para redução da taxa básica de juros.
Para Ronaldo Souza, coordenador do Grupo de Estudos de Conjuntura do Ipea, a retomada da economia na atual crise deve ser bastante lenta porque faltam gatilhos para o crescimento. O setor externo, lembra ele, tem peso pequeno no PIB, a política fiscal não tende a ser expansionista no futuro visível e a redução de juros pode ajudar, mas não resolve o problema de elevado endividamento do setor privado.
A redução de juros, diz Marcos Lisboa, presidente do Insper, é um "ajuste fino na margem, que não está relacionado com os problemas estruturais do país. Você pode discutir se a política [de juros] poderia ser um pouco mais forte ou não, mas isso é muito pequeno frente ao caos em que vive o país." Para ele, a crise atual continua a ser sobretudo fiscal, com graves problemas não só do governo federal, mas também dos Estados. Ontem, o Rio Grande do Sul foi o segundo Estado a declarar situação de calamidade nas contas públicas.
"O governo está premido pela agenda fiscal, que de fato é urgente, mas seria importante para o país que essa agenda microeconômica não ficasse relegada a um segundo plano."
Entre as mudanças que poderiam ser implantadas, estão "resolver a complexidade tributária do país, retomar uma agenda de abertura da economia, retirar distorções setoriais e de comércio exterior, rever regras de conteúdo nacional e definir com clareza o papel de agências reguladoras e do Executivo".
Renato Soriano, sócio da Rosenberg Partners, avalia que há certa decepção com a falta de ações práticas que contribuam para a melhora do ambiente de negócios. "Tudo ficou muito focado na PEC dos gastos, que é muito importante, mas que não pode ser a única medida", afirma. "Deveria haver uma agenda correndo paralelamente, que ajudasse, por exemplo, a desburocratizar a economia."
Para Weeks, o governo fez um bom começo, com a rápida tramitação da PEC do teto do gasto, já aprovada pela Câmara dos Deputados, mas está decepcionando em relação à reforma da Previdência, que nem sequer foi enviada ao Congresso.
Atacar essa agenda e avançar com os leilões de projetos de infraestrutura para a iniciativa privada, diz, poderiam acelerar a retomada. Mesmo assim, a recuperação da atividade econômica só deve começar no início de 2017 e será lenta. O economista, no entanto, não considera a postura mais conservadora do Banco Central como negativa. Apesar de "tirar" um pouco de crescimento de 2017, a cautela da autoridade monetária deve fazer com que o ciclo de corte de juros seja mais sustentável, dando margem para um 2018 mais positivo, diz ele. Antes, o economista estimava alta de 1,7% e 2% para os próximos dois anos, respectivamente. Agora, parece mais provável um cenário que em o país cresça 1% em 2017 e 2,5% em 2018.
No boletim Focus do Banco Central, a piora das estimativas de crescimento para o ano que vem, que caíram para 1% nesta semana, está sendo acompanhada por um otimismo maior com 2018, para o qual os economistas agora projetam avanço de 2,5%.
Juan Jensen, sócio da 4E Consultoria, porém, avalia que a postura gradualista do Banco Central impõem um alto custo para a atividade, já que a inflação deve desacelerar e o juro real, subir.
No setor produtivo, os principais pleitos têm sido quase sempre um cenário de juros menores e uma agenda forte de desburocratização dos negócios. Meyer Nigri, presidente da Tecnisa, avalia que redução da Selic "tornará viáveis os negócios, não só do setor imobiliário, como dos demais". (Colaboraram Chiara Quintão, Stella Fontes e Lucinda Pinto, de São Paulo)
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