• Acusado de retaliação, presidente da Casa diz que não quis atingir MP
Cristiane Jungblut e Maria Lima - O Globo
-BRASÍLIA- Na véspera do julgamento em que pode se tornar réu no Supremo Tribunal Federal, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), patrocinou ontem uma tentativa de votar às pressas o pacote anticorrupção aprovado na madrugada pela Câmara. Renan saiu derrotado. O plenário do Senado rejeitou o pedido de urgência para a votação do pacote por 44 votos a 14, além de uma abstenção. Nos bastidores, Renan articulou com os senadores Fernando Collor (PTCAL), João Alberto (PMDB-MA), Omar Aziz (PSD-AM) e Hélio José (PMDB-DF) para apresentação do requerimento de urgência para o projeto e inclusão imediata na pauta de ontem mesmo.
A manobra revoltou a maioria dos senadores, principalmente o líder do DEM, Ronaldo Caiado (GO), que cobrava os nomes dos autores do requerimento. Segundo senadores, Renan articulou votos a favor da medida junto a PMDB, PP, PSD, PTC e PT, mas alguns deixaram até de votar diante da reação em plenário. Omar Aziz foi um deles. No PT, o líder Humberto Costa (PE) e o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), líder da minoria, votaram com Renan. Na prática, 14 senadores votaram a favor do requerimento de urgência para o pacote, dos seguintes partidos: PP, PT, PMDB, PSB, PDT e PR.
— Renan colheu o que plantou: uma derrota horrorosa e uma demonstração de desespero. Foi estarrecedor imaginar a ousadia de votar uma matéria como essa em regime de urgência. É difícil até de qualificar o gesto de Renan: surreal, inimaginável, uma iniciativa sem pé nem cabeça — disse o senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES).
Caiado e a maioria dos senadores, inclusive o líder do governo, Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), alertaram que a aprovação do requerimento à força colocaria fogo nas ruas.
— A urgência dessa matéria no Senado não pode ser vista pela sociedade como uma vendeta, uma vingança. O momento não é para acirramos os ânimos. Isso pode colocar em risco a governabilidade — disse Caiado.
Os senadores acusaram Renan de aplicar o mesmo “golpe” dado na votação do requerimento de urgência do projeto de abuso de autoridade, em que não foi explicado ao Senado a matéria. Ontem, Renan anunciou a votação citando apenas o número do projeto e parte do Código Penal que seria alterado.
— Mas qual é a matéria? — questionou Aloysio Nunes.
— Eu acabei de ler — respondeu Renan, ainda sem explicar qual era o assunto.
Só depois da pressão dos senadores é que Renan disse que se tratava do pacote anticorrupção. Alguns afirmam, nos bastidores, que Renan quis demonstrar força diante das ameaças dos procuradores de abandonar a Lava-Jato. O senador João Alberto (PMDB-MA), braço-direito de Renan e presidente da Comissão de Ética, estava aos berros ao telefone:
— Os senadores não podem se agachar a eles!
Mais tarde, Renan garantiu que a tentativa de votar o requerimento de urgência não foi retaliação às críticas do MP:
— Absolutamente. Eu sei que as tentativas de interferir no Legislativo são muitas. Achei muito bom que o Senado decidiu que esta não é uma matéria urgente e não será votada agora.
A denúncia contra Renan que vai a julgamento hoje no plenário do Supremo é relativa ao processo apura se a empreiteira Mendes Júnior pagou pensão alimentícia à jornalista Mônica Veloso, com quem o senador tem uma filha. Renan responde a outros onze processos no STF, sendo oito da Lava-Jato.
Mesmo que a denúncia seja aceita e Renan seja transformado em réu, é grande a probabilidade de haver prescrição dos crimes — peculato, falsidade ideológica de documento público e falsidade ideológica de documento particular — quando a ação penal for concluída. Nesse caso, mesmo se for condenado, o parlamentar não poderia ser punido, devido à lentidão com que foi conduzido o processo.
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