• E se Dilma, lá no início do primeiro mandato, prosseguisse na faxina? E se o PT tivesse rompido com ela, antes de o PMDB fazê- lo?
- O Globo
Quando começaram a falar que a ministra Dilma Roussef poderia ser a escolhida do então presidente Lula para suceder-lhe, a procurei para uma primeira conversa, sabendo já da reação negativa dos principais líderes do PT a essa especulação.
Cheio de dedos, para não parecer indelicado, acabei sendo direto:
— Como a senhora pode ser candidata do presidente, se o PT não gosta da senhora?
A resposta, pela franqueza e objetividade, selou uma relação de confiança, que quebro somente agora para tentar explicar o que levou a hoje presidente Dilma à situação em que se encontra.
— E você acha isso ruim? — devolveu-me ela a pergunta.
Saí da conversa convencido de que Lula, já então supostamente vítima das trapalhadas dos seus companheiros petistas, a escolhera justamente porque Dilma não tinha intimidade com o PT e, sendo assim, não deixaria o partido tomar conta do governo dela e fazer o que fizeram com ele.
Dias depois de lançada, Tarso Genro, que nunca disputara uma eleição no Rio Grande do Sul tendo a Dilma do seu lado, deu uma entrevista ao jornal “Zero Hora”, criticando a candidatura da companheira. Dilma queixou- se a Lula, na frente do também ministro Edison Lobão.
— Lula, eu vou cobrar do Tarso — disse a vítima, enfurecida.
— Calma, querida. Não quero que você se exponha com o PT. Deixa que eu resolvo isso.
E resolveu. Deu uma bronca no Tarso, que ele próprio confidenciou a mim:
— Nunca o Lula me tratou dessa maneira. Foi uma baita de uma bronca.
A lição aplicada a Tarso foi didática. A partir daí, mexeu com a Dilma, mexeu com Lula.
E nunca mais ela foi molestada nem teve a sua candidatura contestada por ninguém.
Pulemos o escândalo Erenice e vamos reencontrar agora com a nossa personagem já eleita e empossada, tendo Antonio Palocci como seu braço- direito na chefia da Casa Civil, mandando até mais que ela, ao ponto de dar uma bronca no vice- presidente e ser imediatamente enquadrado por Michel Temer.
Palocci estava tendo a sua segunda chance de se cacifar à Presidência da República. Já tinha perdido a primeira oportunidade no governo Lula, e o destino estava lhe dando mais uma chance. Não resistiu seis meses no cargo e foi devorado pela denúncia de ter multiplicado seu patrimônio.
A partir da queda de Palocci, a cada mês caía um ministro. Foram sete por denúncias de corrupção e um apenas por insubordinação, Nelson Jobim, da Defesa. Como todos esses ministros foram imposições de Lula, livrando-se deles com a ajuda do destino, Dilma via crescer a sua popularidade, assumindo o doce incômodo de ser chamada de faxineira — estava varrendo a corrupção do seu governo. Tal título começou a incomodar o próprio Lula e, principalmente, o PT.
Foi aí que Dilma começou a perder a chance de fazer um governo independente. Vamos dar um salto maior na nossa história e cheguemos bem perto dos dias de hoje. Antes de o PMDB romper com o governo, quem ameaçava fazê-lo era o PT, por causa da política econômica do governo.
Ulysses Guimarães, figura recorrente nos últimos dias da longa sessão do impeachment, já dizia que “com o ‘ se’ você bota Paris numa garrafa”. Mas termino a minha história com um festival de “se”: e “se” Dilma, lá no início do primeiro mandato, prosseguisse na faxina?; e “se” o PT tivesse rompido com ela, antes de o PMDB fazê-lo?
Talvez ela não tivesse chegado aonde chegou.
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