O Brasil comemorou em 2017 o terceiro ano consecutivo de redução do déficit em conta corrente, que ficou US$ 9,762 bilhões, o patamar mais baixo em dez anos. O superávit da balança comercial de US$ 64 bilhões foi o principal motivo para a melhoria das contas externas, compensando de certa forma os gastos com serviços e remessas ao exterior.
O déficit de serviços passou de US$ 30 bilhões em 2016 para US$ 34 bilhões, puxado pelas despesas com viagens internacionais, que saltaram 56%, de US$ 8,5 bilhões para US$ 13,2 bilhões, estimuladas pela cotação do dólar e por uma tímida recuperação da renda. As despesas com transportes também aumentaram, de US$ 3,7 bilhões para US$ 5 bilhões. A expansão das remessas de lucros e dividendos, de US$ 19,4 bilhões para US$ 21 bilhões, levou o déficit de rendas a crescer de US$ 41,1 bilhões para US$ 42,6 bilhões, apesar de a conta de juros ter diminuído ligeiramente, de US$ 21,9 bilhões para US$ 21,8 bilhões. O setor de serviços, notadamente financeiros, respondeu por 49% das remessas de lucros e dividendos; as indústrias, por 44%, com 11% do setor de bebidas; e a agricultura, pecuária e mineração, por 6,9%.
O quadro deve mudar agora. Com o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) saindo de perto de 1% no ano passado para em torno de 3% neste ano, é natural que as empresas e as pessoas gastem mais na compra e importação de produtos e em viagens internacionais, e aumentem as remessas de lucros e dividendos. O superávit da balança comercial deve diminuir também pressionado pela redução do preço das commodities, que pode recuar em relação aos picos de 2017. Assim, a esperada recuperação da economia neste ano vai cobrar seu preço no balanço das contas externas. O Banco Central (BC) espera que o déficit, que foi equivalente a 0,48% do PIB em 2017, praticamente dobre para US$ 18,4 bilhões, ou 0,9% do PIB. Ainda assim ficará abaixo da marca de 1,31% de 2016. Alguns bancos falam, porém, que pode triplicar, chegando a 1,5% do PIB.
O resultado das contas correntes é um dos mais importantes indicadores de solvência externa de um país. Quando o país gasta mais do que recebe nas transações com os demais, precisa atrair capitais na forma de empréstimos e investimentos para cobrir a diferença, ou se desfazer de ativos no exterior. É consenso entre os economistas que déficits abaixo de 3,5% do PIB são administrados com relativa segurança pelos países. O Brasil chegou a registrar mais do que isso, em 2014, de 4,17% do PIB, com um "rombo" de US$ 90,9 bilhões, um dos maiores déficits em conta corrente do mundo, como resultado da deterioração da balança comercial, enfraquecida pela queda dos preços das commodities. Desconfiados com a política econômica da então presidente Dilma Rousseff, os investimentos estrangeiros ficaram em US$ 62,5 bilhões e não foram suficientes para cobrir o déficit, de modo que o governo teve que se apoiar em fluxos mais voláteis de curto prazo, direcionados para o mercado financeiro.
As reservas internacionais, já naquela época na casa dos US$ 370 bilhões, e o câmbio flutuante garantiam uma certa tranquilidade. Alguns ingredientes dão agora uma dose extra de conforto. As perspectivas para a entrada de capital estrangeiro no país são promissoras. Depois de ter recuado de US$ 78,2 bilhões em 2016 para US$ 70,3 bilhões no ano passado, o investimento direto tem perspectiva de voltar a crescer. Os principais alvos devem continuar na indústria, que absorveu 30,9% do capital externo investido no país, no ano passado; em segundo lugar ficam a agropecuária e a mineração, com 9,7%. Os EUA continuam o maior investidor estrangeiro do país, com 18,4% do total. Em seguida vêm locais que, geralmente, são sedes de multinacionais como Países Baixos, Ilhas Virgens e Luxemburgo. A China, que ganhou visibilidade pelo apetite nas aquisições na área de energia, especialmente em operações de concessões, está em 16º lugar, com 1,1%, e deve aumentar essa fatia.
O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, prevê que os investimentos diretos devem atingir US$ 80 bilhões neste ano, diminuindo a dependência do dinheiro volátil que foca o mercado financeiro. Há um pipeline de privatizações e concessões que contribui para isso. Para atrair esse capital, porém, mesmo com as incertezas eleitorais, é necessária a perspectiva de continuidade do ajuste fiscal.
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