quarta-feira, 7 de outubro de 2020

O que a mídia pensa – Opiniões / Editoriais

O alarme contra a crise fiscal – Opinião | O Estado de S. Paulo

O alarme soa com instabilidade do dólar e dos juros futuros, mas se dissipa na Praça dos Três Poderes.

Um novo desastre fiscal, com as contas públicas em frangalhos e a dívida pública disparada, pode levar o País a uma crise mais funda, alertam grandes bancos, investidores, analistas de mercado e o Fundo Monetário Internacional (FMI). O alarme soa no dia a dia, com o sobe e desce do dólar e a instabilidade dos juros futuros, mas o barulho se dissipa, quase sem efeito, na Praça dos Três Poderes. Nesse estranho enclave no centro do País, alguém se lembra de vez em quando, ou é lembrado, de preceitos meio cabalísticos, como uma estranha regra de ouro e um inoportuno teto de gastos.

Relatórios do Deutsche Bank, do Itaú Unibanco e do Bradesco, citados em reportagem do Estado, chamam a atenção, mais uma vez, para o desafio de conter a expansão do buraco fiscal e da enorme dívida pública. Mas o presidente Jair Bolsonaro parece ter pouco tempo – quase nenhum – para preocupações desse tipo. Cuidar da reeleição tem sido sua atividade principal, e uma fonte de sustos e inquietações para o mercado e para muitos analistas da economia brasileira.

Discussões sobre como financiar a Renda Cidadã, concebida como grande bandeira eleitoral, têm ocasionado frequentes sobressaltos. Brigas entre ministros por causa da gestão do dinheiro público também inquietam investidores e analistas. Além disso, o mercado reage mal quando se fala de investimentos eleitoreiros, obviamente imaginados como pretextos para viagens presidenciais. Não se trata, é claro, de planos de obras estratégicas para o desenvolvimento, até porque esses conceitos são estranhos ao mundo bolsonariano.

Dólar mais caro, aumento de custos e expectativa de juros mais altos no médio e no longo prazos são alguns dos efeitos dessa inquietação. O Banco Central (BC) tem chamado a atenção, em seus comunicados, para o risco de juros em alta se o mercado perder confiança na gestão das contas públicas.

O presidente do BC, Roberto Campos Neto, tem feito muito mais que divulgar as notas da instituição. Tem mostrado, em reuniões do Executivo,

a importância de um claro compromisso com a responsabilidade fiscal. Reuniu-se com Bolsonaro duas vezes, desde o fim de setembro, para alertá-lo sobre os temores do mercado. As incertezas sobre a gestão das finanças públicas são mencionadas, embora de forma suavemente diplomática, em relatório divulgado pelo FMI depois da recente visita ao Brasil de uma equipe técnica. Nesse tipo de visita, realizado anualmente, funcionários do Fundo coletam informações do governo e de outras fontes para a elaboração de um relatório sobre as condições perspectivas do país. A maior parte dos países membros participa desse ritual e autoriza a divulgação dos dados e das avaliações.

“Com a dívida pública ascendendo a 100% do PIB, preservar o teto constitucional de gastos como âncora fiscal é fundamental”, assinala o comunicado, “para apoiar a confiança do mercado e manter contido o prêmio de risco soberano.” Soberano, nesse caso, é o risco associado à dívida pública.

Essa dívida, de R$ 6,39 trilhões em agosto, já bateu em 88,8% do Produto Interno Bruto (PIB) e no fim do ano encostará em 100%, segundo as projeções correntes. Na média, o endividamento público nas economias emergentes deve ficar, neste ano, próximo de 60% do PIB, provavelmente pouco acima.

O maior endividamento é inevitável num ano de pandemia devastadora e enormes perdas econômicas. O FMI ajudou dezenas de governos a enfrentar os gastos com saúde e com apoio a empresas e famílias. Mas, passada a fase mais crítica, é preciso consertar os fundamentos da economia e criar condições para uma retomada segura.

No caso do Brasil, essa próxima etapa deve incluir, segundo a equipe do FMI, reformas para desengessar o Orçamento, proporcionar eficiência ao governo e tornar a tributação mais progressiva e mais favorável à alocação racional de recursos. Alguns desses pontos podem aparecer na retórica oficial, mas, no dia a dia, nem o mero compromisso com a responsabilidade fiscal está claro. O sobe e desce do mercado é um retrato das incertezas.

Os riscos de uma guerra fria – Opinião | O Estado de S. Paulo

Há condições para que negociação diplomática bem costurada mantenha a temperatura baixa

Os EUA e a China estão no curso de uma nova guerra fria? A questão que tem inquietado o mundo foi levantada em um seminário da Fundação FHC com o cientista político chinês Lanxin Xiang, uma voz privilegiada para trazer luzes ao problema: Xiang é PH.D. pela Universidade Johns Hopkins e diretor do Centro de Pesquisa sobre a nova Rota da Seda, em Xangai.

“O conceito de uma nova guerra fria talvez esteja desatualizado”, advertiu Xiang. “As coisas mudaram tão rápido nos últimos meses que começo a me preocupar não se entraremos em uma guerra fria, mas numa quente.”

Diferentemente da União Soviética, a China não tem interesse numa disputa militar com os EUA em escala global. No entanto, a assertividade do regime de Xi Jinping pode criar zonas de atrito na Ásia. A velocidade do crescimento econômico levou o Partido Comunista a abandonar a diretriz de “baixa voltagem” que guiara as relações internacionais chinesas por décadas. Em 2017, Xi Jinping asseverou: “A China se ergueu, ficou rica, forte e está se movendo para o centro do palco”. Mas, como nota Xiang, talvez esteja se movendo rápido demais, com demasiada agressividade. Ao mesmo tempo, domesticamente, as restrições aos direitos das minorias e à liberdade de expressão também recrudesceram.

Uma das apreensões é com o efeito que as eleições americanas podem ter numa redefinição de um alvo externo. Donald Trump, sabidamente ambíguo em relação a questões ideológicas, está sempre disposto a relativizá-las em nome de bons negócios, mas os chamados “falcões” em seu governo podem ver nas eleições uma oportunidade para desencadear uma postura mais agressiva.

Em resumo, segundo Xiang, a volatilidade da situação atual deriva, por parte dos EUA, de uma maior pressão, tanto de democratas como de republicanos, em relação aos desmandos do regime comunista, mas sem uma estratégia clara que permita estabelecer compromissos. Por outro lado, ele manifestou a expectativa de que no pós-pandemia a China se mostre capaz de mais transparência e de preterir interesses imediatos em nome de valores universais, por exemplo, não politizando a distribuição das vacinas.

Tal expectativa pode se mostrar otimista. Ainda assim, um diferencial importante em relação à guerra fria é que a disputa não é por predominância militar, mas tecnológica. Como em toda disputa, há tensão. Mas, como apontou o embaixador Luiz Augusto de Castro Alves, as duas estruturas estão tão entrelaçadas na cadeia de produção e finanças, que EUA e China “são como um casal que se separou, mas que coabita na mesma casa, porque não tem condições de manter duas casas separadas”.

O caso de Taiwan é exemplar, porque mostra in nuce como as relações entre o Ocidente e a China podem progredir rumo a compromissos realistas ou degenerar em um conflito armado.

Não há expectativa de que a China renuncie à ideia de Taiwan como uma parte “sagrada” de seu território. Por outro lado, Taiwan é há três décadas uma democracia vibrante com mais de 24 milhões de habitantes. Um reconhecimento completo da independência de Taiwan seria contraproducente. “Não tenho dúvidas”, disse Xiang, “se Taiwan declarasse independência, a China a invadiria em menos de 24 horas.” É um risco que seus aliados democráticos não podem correr. Ao mesmo tempo, eles precisam ser capazes de promover mais interações com Taiwan e estimulá-la a participar de organizações internacionais. Sobretudo, essa ação precisa ser coordenada, de maneira que uma tentativa de retaliação por parte da China leve ao isolamento do país continental. A situação é similar à de outros países asiáticos, assim como à das minorias na China, ameaçados pela agressividade do Partido Comunista.

Em outras palavras, num futuro próximo não é possível afastar o espectro de uma guerra fria entre os EUA (e o Ocidente) e a China. Mas a presença de interesses econômicos comuns e a ausência de uma zona de conflito militar direto oferecem ao menos boas condições para que negociações diplomáticas bem costuradas mantenham a temperatura baixa.

Sabatina para valer – Opinião | Folha de S. Paulo

Indicado ao Supremo, fora do figurino extremista, precisa passar por escrutínio

A escolha, a ser avaliada pelo Senado, do desembargador Kassio Nunes Marques para o Supremo Tribunal Federal constitui mais um passo no distanciamento do presidente da República da plataforma extremista com que se elegeu e tentou governar por mais de um ano.

Em contraste com nomes de radicais religiosos e outras figuras excêntricas que eram aventadas na base mais fiel a Jair Bolsonaro, a trajetória do juiz federal parece próxima da usual para o establishment da governança jurídica.

Conselheiro, no Piauí e nacional, da Ordem dos Advogados do Brasil e apadrinhado por oligarcas influentes, Kassio Nunes foi nomeado na cota da advocacia pela então presidente Dilma Rousseff (PT) para o Tribunal Regional da 1ª Região.

A alçada da corte abrange o Amapá, estado representado pelo atual presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM), um dos avalistas da indicação ao STF. Juntaram-se à pajelança em torno do nome do candidato os ministros do Supremo Gilmar Mendes e Dias Toffoli.

Nada novo sob o sol. Funcionaram os estímulos à moderação que estão na sintaxe do pacto constitucional de 1988, mesclados à prática pré-moderna —a “cordialidade”, na acepção crítica de Sérgio Buarque de Holanda— dos encontros informais entre autoridades que têm o dever legal de fiscalizar e mandatários por elas fiscalizados.

A entrada de um novo magistrado na principal corte do país, no entanto, tem consequências que vão muito além das circunstâncias políticas do momento da nomeação. Aos 48 anos, Kassio Nunes poderá atuar no STF até 2047, atravessando sete mandatos presidenciais.

O poder de que disporá, mesmo num colegiado de 11 integrantes, não é nada trivial, como tem sido demonstrado à exaustão nos últimos anos. Por isso é essencial que os senadores utilizem com diligência e profundidade a prerrogativa de sabatinar o nome proposto pelo Planalto para que não reste dúvida sobre suas condições de arcar com tamanha responsabilidade.

A Carta exige, além da idade mínima de 35 anos, notável saber jurídico e reputação ilibada dos nomeados ao STF. Os cidadãos, e os próprios senadores, estão bastante desinformados a respeito desses dois aspectos no caso de Nunes.

Além disso, é necessário ouvir do candidato à vaga de guardião das liberdades constitucionais compromissos inarredáveis com a democracia representativa, o Estado de Direito, a proteção das minorias e o desenvolvimento sustentável.

Que a sabatina do próximo dia 21 não repita deprimentes cerimônias de bajulação do passado.

Concorrência à vista – Opinião | Folha de S. Paulo

Apesar de pressa e intervencionismo do BC, sistema Pix é iniciativa bem-vinda

Num país de baixa concorrência no setor financeiro, a inauguração de um novo ambiente de pagamentos desenvolvido pelo Banco Central tende a abrir espaço para profundas mudanças em breve.

O sistema, chamado Pix, busca viabilizar pagamentos instantâneos, a qualquer hora e de forma segura, moderna e barata. Por meio do cadastro de uma chave individual, que começou a ser realizado nesta semana, qualquer pessoa poderá realizar transações a partir de 13 de novembro.

O Pix será gratuito para operações entre pessoas físicas, mas mesmo no caso das empresas e das próprias instituições financeiras o custo será muito mais baixo do que o atual. Vários procedimentos devem se tornar obsoletos; novos serviços poderão ser criados.

Em lugar de pouquíssimos bancos aptos a realizar transações atualmente, o Banco Central já cadastrou quase 700 participantes no novo sistema —número que, espera-se, crescerá continuamente.

Bancos, fintechs, concessionárias de serviços públicos, varejistas e outros poderão criar suas modalidades de serviços a partir dos pagamentos, ampliando as opções disponíveis para o consumidor.

Pessoas de menor renda hoje sem conta bancária e acesso a outros serviços —basta lembrar que mais de 30 milhões precisaram abrir contas para receber o auxílio emergencial— terão a chance de ingressar no sistema financeiro.

Há dificuldades na mudança, por certo. O Banco Central conduziu o processo com pressa, e houve instabilidade nos sistemas dos bancos no primeiro dia de cadastramento. Tamanha transformação precisa ser conduzida sem açodamento diante do risco de fraudes e erros.

O BC, ademais, deve se limitar ao papel de regulador do mercado, resistindo à tentação de intervir em todas as etapas da criação do Pix. Daqui para frente, tendo criado a infraestrutura, a autoridade monetária deve dar espaço para que o setor privado consiga inovar.

A China é exemplo do impacto da tecnologia nos meios de pagamento, pois praticamente pulou a etapa dos cartões de débito e crédito e rumou aos códigos eletrônicos.

O próximo passo deve ser o chamado open banking, em que os bancos perdem a condição de manter sua plataforma fechada —e o cliente determina como quer usar suas informações bancárias e por onde comprará outros serviços.

Após décadas priorizando a solidez do setor, o que legou um mercado concentrado em cinco grandes instituições, o BC agora busca inovação e novos participantes. A nova orientação é bem-vinda.

Soam os alarmes para a deterioração da dívida pública – Opinião | O Globo

Apenas clareza sobre os rumos políticos e orçamentários pode aliviar a pressão sobre o endividamento

O jantar de pacificação entre Paulo Guedes e Rodrigo Maia foi aplaudido pelo mercado: a Bolsa subiu, dólar e juros futuros caíram. Só esse episódio já demonstra, mais que qualquer explicação técnica, a importância do quadro político para o resgate da economia brasileira. Diante de uma pandemia que deverá, até o final do ano, elevar o endividamento público a 95% do PIB, os credores precisam — por acaciano que pareça — crer. Precisam ter confiança em que receberão de volta o dinheiro que emprestarem ao governo.

Para contar com credibilidade, o governo só pode prometer o que cabe no Orçamento, do contrário o mercado exigirá juros maiores e prazos curtos para financiar a dívida. É justamente o que tem acontecido nos últimos meses, enquanto persistem a indefinição sobre o Renda Cidadã, para o qual não há dinheiro no Orçamento, e as ameaças de ruptura do teto de gastos, única regra que ainda impõe controle fiscal.

Desde o início do ano, o endividamento do Estado piorou não apenas em tamanho, mas também em qualidade. Entre março e agosto, o prazo médio de vencimento da dívida emitida pelo Tesouro caiu de 5,5 para 2,4 anos. No último ano, os vencimentos em 12 meses quase dobraram, de R$ 533 bilhões para R$ 1,023 trilhão, e beiram um quarto de toda a dívida. Apenas a clareza sobre os rumos políticos pode aliviar a pressão.

Os desentendimentos, as incertezas e balões de ensaio contribuem para antecipar uma crise que se acreditava ser possível adiar. Os alertas nas telas dos operadores do mercado não se resumem aos juros futuros e ao encolhimento dos prazos de vencimento. O dólar também sobe quando os estrangeiros vendem seus papéis do governo.

Em decorrência, as condições se tornam propícias à alta da inflação. Numa situação de maior equilíbrio, o incremento das exportações — como minério de ferro e commodities agrícolas — contribuiria para valorizar a moeda e deter a pressão inflacionária do câmbio. Nas circunstâncias atuais, a fuga de capital tem compensado essa melhora nos termos de troca do Brasil com o exterior. O real permanece mais fraco, na posição mais depreciada desde 1998.

É visível a formação da tempestade no horizonte. A persistirem a incerteza política e os riscos que pairam sobre o teto de gastos, o Banco Central se verá obrigado a elevar os juros básicos de 2%, para facilitar a emissão dos papéis do Tesouro. Mas talvez nem isso seja suficiente para deter a inflação, que já se manifesta em preços de alimentos e insumos ao setor produtivo. Recobrar a saúde fiscal é fundamental para desarmar a armadilha inflacionária.

A barafunda criada por um presidente que quer a todo custo sua arma eleitoral populista terá consequências drásticas se o BC tiver de elevar os juros com 13 milhões em busca de emprego, enquanto a economia mal ensaia uma recuperação. Bolsonaro se engana se acha que vale pagar qualquer preço para vencer em 2022. Nenhum candidato à reeleição sobrevive a uma crise com inflação subindo, desemprego em alta e sem perspectiva de crescimento.

Rio não pode perder a segunda chance concedida pelo petróleo – Opinião | O Globo

O pré-sal dá ao estado uma outra oportunidade de evitar os erros cometidos com a Bacia de Campos

Símbolo de riqueza e poder, o petróleo também traz riscos. O Rio de Janeiro, premiado na loteria geológica com a Bacia de Campos, recebeu bilhões a título de royalties, distribuídos entre suas cidades. O que se viu foram, em geral, gastos em obras desnecessárias ou despesas de custeio, enquanto áreas vitais, como educação ou saneamento, ficaram à míngua.

Já há algum tempo a produção da Bacia de Campos, que também beneficia o Espírito Santo, entrou em declínio. Eis que o Brasil foi novamente premiado pela geologia, com a descoberta de óleo e gás em camadas do pré-sal, ainda mais ricas e produtivas. Além do Rio, São Paulo e Santa Catarina também passaram a receber royalties e participações especiais — pagamentos adicionais dos poços de alta produção.

Tirar a sorte grande pela segunda vez é uma chance que não pode ser desperdiçada. Reportagem do GLOBO trouxe indicações de que as prefeituras fluminenses parecem ter aprendido algo na farra populista com o dinheiro de Campos. Maricá, na Região Metropolitana, mesmo sendo a cidade que mais recebe royalties no país — R$ 1,3 bilhão no ano passado e R$ 1,5 bilhão neste ano —, enfrenta com dificuldades o crescimento da demanda por ensino, provocado pelo aumento da população. Mas a prefeitura paga condução para estudantes cursarem faculdade fora do município e distribui bolsas em instituições privadas. Saquarema, na mesma região, também investe em reformas e construção de escolas.

Falta definir e executar projetos que ponham em marcha o círculo virtuoso da criação de emprego e renda. Qualificar a população é estratégico. Mas não basta. Experiências de outras prefeituras devem servir de exemplo. Em São Paulo, Ilha Bela, que também recebe royalties, criou em 2018 um fundo para reter parte do dinheiro numa espécie de poupança para o futuro de inspiração norueguesa. Merece ser imitada.

O dinheiro dos royalties do petróleo pode dar ao Rio uma chance preciosa — talvez a última — de se aprumar. Com o pré-sal, a tendência de crescimento é firme. O total recebido deverá crescer dos R$ 21,5 bilhões estimados para este ano a R$ 30 bilhões em 2024, ou 30%, na estimativa da Agência Nacional do Petróleo (ANP).

Tudo também dependerá do julgamento marcado para dezembro de um processo no Supremo, suspenso por liminar, que redistribui radicalmente os royalties dos estados produtores. Caso haja entendimento em torno de um acordo proposto pelo Espírito Santo, que cede parte do dinheiro ao resto da Federação, poderá haver queda menor nas receitas previstas. Mas elas virão. No caso do Rio, se houver competência, honestidade e governança, o estado precisa aproveitar a segunda onda do petróleo. Difícil haver outra.

Comércio global reage e Brasil depende cada vez mais da China – Opinião | Valor Econômico

As vendas para a China aumentaram 14% até setembro e subiram para 34,1% do total

O ritmo do comércio mundial acompanha o da recuperação global - ambos foram melhores do que as péssimas expectativas iniciais, mas seus futuros estão cercados de incertezas. A Organização Mundial do Comércio reviu seus números e espera agora que as trocas mundiais cairão 9,2% este ano, e crescerão 7,2% em 2021. O Fundo Monetário Internacional vai rever ligeiramente para cima sua estimativa de retração global de -4,9%. A diretora gerente do Fundo, Kristalina Giorgieva, comparou a retomada a uma “grande escalada”, sujeita a tropeços, e o mais evidente dos obstáculos apontados nos cenários das duas organizações multilaterais é a ressurgência da covid-19 - já verificada na França, Espanha, Reino Unido - além da persistência do alto contágio nos EUA.

A OMC indicou que se a queda do comércio não foi tão pronunciada agora, sua retomada tampouco o será em 2021. Os 7,2% de aumento para o ano que vem são bem mais fracos que os 12,9% inicialmente projetados. De qualquer forma, os indicadores antecedentes usados pela organização para enxergar as tendências são animadores. As novas encomendas de exportação, extraídas dos índices de gerentes de compras (PMI), mostram que as encomendas da indústria voltaram em agosto ao nível de janeiro, quando a covid-19 se espalhava pela China. No caso de serviços, estava perto de fazê-lo.

A guerra comercial dos Estados Unidos contra a China só piorou o cenário turbulento desenhado pela pandemia. Nela, não há como os EUA se considerarem vitoriosos. As exportações despencaram mais na América do Norte do que em qualquer outra região (-14,7%). Proposital ou casual, os números do comércio mundial foram divulgados ontem por Yi Xiaozhun, ex-embaixador da China na OMC e diretor da organização. Quase que ao mesmo tempo, foram divulgadas as estatísticas do comércio exterior americano que apontavam que o país teve déficit comercial de US$ 67,1 bilhões em agosto, o maior dos últimos 14 anos.

“Tornar a América grande de novo”, slogan de Trump sob o qual impôs uma série de tarifas protecionistas, vai demorar mais algum tempo. No ano, o déficit aumentou 5,7% em relação a 2019. Em doze meses, ele saltou de ao redor de US$ 500 bilhões para US$ 550 bilhões na atual administração. O retrato mensal é também o de um fracasso de uma das principais bandeiras eleitorais de Trump. O país teve um rombo comercial de US$ 26,5 bilhões com a China, de US$ 15,7 bilhões com a União Europeia e de US$ 12,5 bilhões com o México, três dos seus maiores parceiros com os quais brigou e restringiu importações nos últimos anos.

As exportações brasileiras se comportaram como a OMC havia previsto para a região, com declínio de 7,7% até setembro (para o ano, o número da OMC é o mesmo). As importações, porém, estão caindo mais do que os 13,5% estimados para a América do Sul e Central: -14,4%. A corrente de comércio diminuiu 16,4%.

A razoável performance brasileira tem dois motivos: China e alimentos. As vendas para a China aumentaram 14% até setembro e subiram para 34,1% do total. O consumo e exportação de alimentos foram os setores menos atingidos pela pandemia globalmente. No fatídico segundo trimestre, o pior da economia mundial, houve um recuo de 5% - no caso das compras chinesas, elas não caíram. Soja, minério de ferro, petróleo e carnes somaram 83% das exportações do Brasil.

Entre os dez maiores mercados para o Brasil, porém, só houve aumento de vendas para Espanha e Canadá. As importações argentinas definham ano a ano e em 2020 recuam 22,4%, compondo a menor participação da década (3,79%). A crise argentina não encontrará uma solução no curto prazo e as medidas do governo peronista de Alberto Fernández para lograr deter a perda de divisas tendem a prejudicar os exportadores brasileiros. As licenças não automáticas de importação, expediente tradicional dos governos Kirchner, voltaram com tudo. A restrição do montante de dólares para as empresas argentinas pagarem dívidas piorou o que já era ruim nas relações comerciais bilaterais. Compras dos Estados Unidos (-31,5%), Alemanha, Países |Baixos e Holanda tiveram quedas muito expressivas.

O choque econômico da pandemia no país, ao reduzir mais as importações, elevou o saldo comercial, que deve fechar o ano em US$ 45 bilhões e crescer para US$ 52,7 bilhões em 2021, resultados importantes para evitar uma desvalorização ainda maior do dólar diante da saída de capitais pela conta financeira.

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