Erradicação
da loucura que assola o mundo tem de começar pela eleição dos EUA
Parecia impossível que algum líder mundial fosse superar o festival de loucuras que Jair Bolsonaro protagonizou durante a pandemia do novo coronavírus, subindo em lombo de cavalo, promovendo aglomerações, indo a atos antidemocráticos, mostrando cloroquina para as emas, etc.
Mas
aconteceu. Desde que foi diagnosticado com
covid-19, na semana passada, Donald Trump deixou o pupilo brasileiro
no chinelo em termos de impostura e inadequação não apenas ao cargo que ocupa e
ao qual se agarra com unhas e dentes, mas também aos princípios básicos de
civilidade e convívio público no curso de uma emergência sanitária.
O homem mais poderoso do planeta foi internado na sexta-feira com muitas dúvidas pairando quanto à data exata de seu diagnóstico, se ele promoveu eventos já sabendo que estava doente ou a gravidade do quadro antes e depois de ser hospitalizado.
À
falta de transparência inimaginável para um País que se gaba de ser o berço e o
guardião da democracia ocidental se somou a boçalidade desvairada.
Desesperado
diante do revés da doença quando fazia questão de zombar dela, vender
tratamentos mandrakes e defender e praticar comportamentos sociais
irresponsáveis, Trump quis se mostrar forte.
Para
isso, expôs assessores, seguranças e equipe do hospital a risco de
contaminação. O carro em que ele fez o desfile
patético é blindado inclusive para ataques químicos e
biológicos, o que significa dizer que, se nada entra, tampouco sai. A carga
viral de um presidente doente ficou toda concentrada no interior do carro,
sujeitando os demais ocupantes a riscos.
A
diferença entre os Estados Unidos e
o Brasil é que lá existem menos puxa-sacos e lambe-botas que aqui. E, quando um
presidente se comporta como um moleque, há quem, mesmo entre os que o
circundam, com coragem para dizer em voz alta. Foi o que fez o médico James Phillips, do
hospital Walter
Reed. “Eles podem ficar doentes. Eles podem morrer. Por teatro
político”, atestou.
Lá
como aqui este teatro que se prolonga já cobrou muito em termos de corrosão dos
valores e dos marcos civilizatórios. Que um presidente decida se comportar como
um bufão num debate e a comissão nacional encarregada de organizar tais eventos
não deixe claro que isso não irá se repetir sob hipótese alguma é sinal de que
Trump venceu mais um round e conseguiu enfraquecer mais uma estrutura que
sustenta a democracia norte-americana – que, mesmo com todas as suas lacunas e
falhas, é uma das mais estáveis do mundo.
Por
tudo isso é vital a importância da eleição dos Estados Unidos, para o mundo e
para o Brasil. A era de governantes fanfarrões calhou de coincidir com o maior
flagelo humano, social e econômico que as atuais gerações – sejam as mais
novas, sejam as que estão vendo antecipado seu tempo útil – irão conviver no curso
de suas vidas.
A
presença de figuras como Trump e Bolsonaro em postos de comando agrava
exponencialmente os efeitos desse calvário. Mais de 200 mil mortos lá, quase
150 mil aqui e tanto um quanto outro seguem distraídos e distraindo os seus
governados com factoides midiáticos. Lá a busca vale-tudo por uma reeleição
cada vez mais difícil. Aqui a costura de terreno político com vista ao mesmo
objetivo e para proteger a família presidencial, cada vez mais enredada numa
trama que explicita o uso de dinheiro público de gabinetes para enriquecimento.
Não se sabe o mal que Trump ainda pode fazer, desde propagar o vírus para os que o cercam até colocar em dúvida a transição do poder caso se efetive a derrota que as pesquisas apontam. Mas é fácil analisar a importância que sua eventual saída de cena em novembro representará para começar a trazer de volta a racionalidade perdida à política brasileira. Que assim seja.
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