Um
arranjo de mão dupla demonstrará o efeito do apoio de Bolsonaro a Russomanno
Que Jair Bolsonaro tem rara
capacidade de transferir votos, não há dúvida. Elegeu três filhos em colégios
eleitorais distintos e um sem-número de desconhecidos coronéis, capitães e
majores, País afora. O outro líder nacional com essa capacidade é Lula,
provisoriamente contido pelas circunstâncias.
A disputa pela Prefeitura de São Paulo tornou-se campo ideal para efeito demonstração deste bolsonarismo por patrocínio. Será um verdadeiro recenseamento, com precisão estatística. Não importa a falta de homogeneidade, cada bolsonarista sabe precisamente o seu tipo.
Alguns
são remanescentes do encantamento pelo já superado discurso de combate à
corrupção; outros por serem apaixonados pelo porte e potência das armas; uns da
direita sectária; outros, terrivelmente militantes religiosos. Todos pela
adesão irrestrita ao seu profeta.
Celso Russomanno (Republicanos),
cansado de insistir em derrotas sucessivas, precedidas por triunfais pole
positions em pesquisas eleitorais, viu no apoio do presidente a chance de dar
uma identidade à sua candidatura. O esquema agradou a Bolsonaro, que havia
liquidado seus grupos organizados em São Paulo de quem se afastou com desdém ao
chegar à Presidência.
Um
arranjo de mão dupla demonstrará o efeito deste apoio. No primeiro, Russomanno
é o beneficiário. Tenta empurrar Bolsonaro, em seu lugar, no ataque ao seu
adversário direto, Bruno Covas (PSDB), ao mesmo
tempo em que força a transformação do presidente em alvo. Nas últimas 48 horas,
Russomanno insistiu mil vezes que a coligação de Covas é a frente paulista
anti-Bolsonaro. O presidente, popular e fortão, segue na frente, e o candidato
a prefeito fica um passo atrás, livre das escaramuças.
Outro
efeito em teste é a inversão da roda da ciranda. Neste, o beneficiário é
Bolsonaro. Russomanno torna-se o símbolo do eleitorado cujo voto foi a ele
transferido e porta-estandarte do bolsonarismo em São Paulo. O eleitorado o
acompanha, mas exige que proteja Bolsonaro e use a máquina a seu serviço.
Russomanno, de patrocinado, passa a patrocinador.
Kassio
com K. Sem ilusões: todos os passos amistosos do presidente Jair Bolsonaro em
direção ao Supremo Tribunal
Federal têm um único e fisiológico objetivo. O de
proteger o primogênito Flávio Bolsonaro.
A
preocupação com este filho é obsessão e determina a relação do presidente com
os tribunais superiores. A indicação de Kassio Marques, negociação conduzida
por 01 para a vaga do decano Celso de Mello, integra este conjunto
de providências objetivas.
Desagradou
a três alas de apoiadores do presidente e satisfez a outras três. Os que
esperneiam são originários do lavajatismo convertidos ao bolsonarismo; são os
líderes evangélicos que já saboreavam a vaga; e os radicais ligados ao
inacreditável Olavo de Carvalho, que ainda teima em
influenciar o governo com gritos e palavrões.
Já
os três grupos que aprovaram a escolha têm outras motivações. O apoio da Ordem
dos Advogados foi corporativista, sem peso político ou ideológico; o Centrão vislumbrou também
proteção aos interesses amplamente conhecidos; e um terceiro grupo gostou
porque se sentiu aliviado. Temia que o escolhido tivesse um perfil de
lobisomem, alguém incompatível com os ritos, linguagem e notável saber
jurídico.
Na
história recente do Supremo cita-se muito o caso de Luiz Fux, o novo presidente. À maneira
carioca, o então surfista juiz minimizou, numa conversa com o então
ministro José Dirceu,
os riscos judiciais a que o mensalão expunha o governo Lula. “Deixa que eu mato
no peito.” Um aceno não cumprido que, por isso mesmo, pertence aos registros da
memória.
Caboclo nordestino, o mínimo que os aliados do governo esperam do piauiense Kassio Marques é que, se prometeu alguma coisa, cumpra.
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