O
desenho de uma política econômica em um ambiente de perda de capital político
do governo é bastante desafiador, por conta do crescente distanciamento entre o
diagnóstico da equipe econômica e as decisões, de fato, aprovadas pelo
presidente. O próprio ministro da Economia, Paulo Guedes, já sinalizou a
diminuição do apoio do presidente Jair Bolsonaro à agenda liberal que, neste
momento, estaria em 65%.
Curiosamente,
esse distanciamento entre decisões de governo e a política econômica ideal
ocorreu simultaneamente à aproximação do governo com o Poder Legislativo,
resultando na eleição de nomes para o comando das Casas legislativas que seriam
mais próximos da atual administração.
O caminho desse distanciamento é razoavelmente simples: a perda de popularidade presidencial aumenta a sensibilidade do governo às demandas particulares de sua base de apoio partidário e entre os agrupamentos econômicos e sociais. Os caminhoneiros representam um grupo especialmente privilegiado na luta por influência nas decisões do governo, por conta do simbolismo da categoria em relação ao presidente e diante de potencial mobilização que, no limite, reforçaria a leitura de falta de governança.
O
programa Gigantes do Asfalto, anunciado pelo governo, é uma tentativa de
desenhar uma política setorial sem retomar o mal-estar que foi causado pelos
sinais de voluntarismo presidencial decorrentes de ameaças de intervenção e de
mudanças no comando de empresas estatais. As demandas da categoria não são
novidade e, em boa medida, são resultado da oferta/demanda de frotas e da
regulação do frete/combustível.
Os
limites para a regulação desses temas são crescentes; não por um acaso, o aceno
aos caminhoneiros deixou de lado mudanças no tocante ao preço do diesel, uma
das principais demandas do grupo. O programa, então, se concentra em linhas de
crédito com participação da Caixa; anúncio de investimentos em infraestrutura e
medidas burocráticas.
Essa
batalha entre a lógica política em um cenário de antecipação de calendário
eleitoral deve ser reforçada ao longo do tempo. O programa retrata a postura do
presidente em relação aos temas do debate público: pouca defesa das reformas
estruturais e acenos para temas com impacto na sua base de apoio tradicional,
tendo em vista a corrida presidencial de 2022. Os efeitos da CPI da Covid e o
risco eleitoral só devem reforçar esse dilema na gestão da política econômica.
*Sócio da Tendências Consultoria e Doutor em Ciência Política (USP)
Nenhum comentário:
Postar um comentário