Folha de S. Paulo
Há problema na forma como o processo para
sua aprovação ao STF vem sendo protelado
Não acho que André
Mendonça deva assumir a cadeira vaga no STF. A meu ver, sua indicação
viola o princípio da laicidade do Estado. O próprio presidente Jair Bolsonaro
propagandeia que escolheu o ex-ministro da Justiça e pastor presbiteriano
porque ele é "terrivelmente evangélico". A Carta, porém, não elenca a
religiosidade entre os critérios para elevar alguém ao Supremo. Ao contrário, a
Constituição, em seu artigo 19, estabelece uma separação forte entre poder
público e igrejas.
Também acho complicado colocar no STF um indivíduo que se mostrou tão subserviente ao presidente quanto Mendonça. Não me parece que, uma vez no cargo, ele saberia conduzir-se com a independência que se espera de um ministro do Supremo.
Numa nota mais pessoal, devo admitir que
não consigo disfarçar um sorriso de satisfação cada vez que leio uma reportagem
relatando as dificuldades do candidato para ser sabatinado e ter seu nome
referendado pelo Senado.
Isso dito, vejo um problema na forma como o
processo de aprovação vem sendo protelado. É um problema de desenho
institucional. Em órgãos colegiados, como o são o Senado, a Câmara e o STF,
nenhum membro individual deveria ter o poder de, sozinho, impedir uma
deliberação.
Se o senador Davi Alcolumbre, na condição
de presidente da Comissão de Constituição e Justiça, não quer agendar a
sabatina, não deve ser forçado a fazê-lo, mas é preciso que exista, nas leis e
regimentos, um caminho alternativo pelo qual a maioria ou mesmo uma pluralidade
de senadores possa, se achar que é o caso, reverter o bloqueio. Sem isso, a
colegialidade escorre pelo ralo. Vale observar que raciocínio análogo se aplica
aos pedidos de impeachment represados por Arthur Lira e aos processos judiciais
que permanecem às vezes por anos sob vistas de ministros do STF.
Na democracia, a primeira coisa que
precisamos aceitar é que nossos desejos nem sempre se realizam.
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