Correio Braziliense
Bolsonaro ameaçou privatizar a empresa, um
velho projeto do ministro da Economia, Paulo Guedes, que pode ganhar apoio
popular por causa dos preços dos combustíveis
Entrevistado por uma rádio evangélica do
Recife, ontem, o presidente Jair Bolsonaro deu a sua maior e mais polêmica
cartada para a reeleição até agora: a proposta de privatização da Petrobras.
Dogma imexível da política brasileira, o tema teve um papel decisivo na derrota
do candidato tucano Geraldo Alckmin à Presidência em 2006, pelo então presidente
Luiz Inácio Lula da Silva, cuja reeleição estava em risco por causa do
escândalo do mensalão. Governador de São Paulo e pré-candidato, Alckmin (PS-
DB), em entrevista ao Canal Livre, da Band, dissera ser favorável às
privatizações de estatais brasileiras, desde que o processo fosse amplamente
fiscalizado e embasado por um marco regulatório robusto.
“Inúmeras áreas da Petrobras que não são o core (núcleo do negócio), o centro, objetivo principal, tudo isso pode ser privatizado. E se tivermos um bom marco regulatório, você pode até no futuro privatizar tudo, sem nenhum problema”, disse à época. Alckmin passou o resto da campanha tentando se desdizer, porque o marqueteiro de Lula, João Santana, transformou a questão num divisor de águas da eleição. Não havia o escândalo do “Petrolão”, que viria à tona com a Operação Lava-Jato, e, grande ironia, resultaria nas prisões de João Santana e de Lula.
A Petrobras é o maior símbolo do nosso
modelo nacional desenvolvimentista. Sua criação resultou de uma campanha popular
que representou o auge do nacionalismo na história republicana e contou com
forte apoio dos militares. Um dos presidentes da empresa durante o regime
militar, o general Ernesto Geisel, viria a suceder o general Emílio Médici na
Presidência da República. As origens da Petrobras remontam à segunda metade da
década de 1940. No Congresso formado em 1945, conservador, a maioria procurava
apagar os traços autoritários do Estado Novo e revogar a legislação
nacionalista do período.
No início de 1947, Eurico Dutra designou
uma comissão para rever as leis existentes à luz da nova Constituição e definir
as diretrizes para a exploração do petróleo. O anteprojeto do chamado Estatuto
do Petróleo desagradou dos nacionalistas, que defendiam o monopólio estatal
integral, aos grandes trustes. A reação nacionalista começou no Clube Militar e
ganhou corpo com a criação do Centro de Estudos e Defesa do Petróleo, que
lançou a Campanha do Petróleo, com slogan “O petróleo é nosso”, em 1948,
obtendo forte apoio de trabalhistas e comunistas. Dutra desistiu do Estatuto e
optou pela construção das refinarias estatais de Mataripe (BA) e de Cubatão
(SP), a construção do oleoduto Santos-São Paulo e a aquisição de uma frota
nacional de petroleiros.
Eleito em 1950, Getúlio Vargas voltou ao
poder no ano seguinte. Em dezembro, mandou ao Congresso o projeto de criação da
“Petróleo Brasileiro S.A.”, a Petrobras, empresa de economia mista com controle
majoritário da União. Curiosamente, não estabelecia o monopólio estatal.
Entretanto, outro projeto, apresentado pelo deputado Eusébio Rocha, estabelecia
o rígido monopólio estatal, vedando a participação estrangeira. Duas concessões
foram feitas: as autorizações de funcionamento das refinarias privadas já
existentes e a participação de empresas particulares, inclusive estrangeiras,
na distribuição dos derivados de petróleo. Em 3 de outubro de 1953, depois de
intensa mobilização popular, Vargas sancionou a Lei no 2.004, criando a
Petróleo Brasileiro S. A – Petrobras.
Velho projeto
O tom com que Bolsonaro ameaçou privatizar a Petrobras foi de desabafo, mas
esse é um velho projeto do ministro da Economia, Paulo Guedes, que pode ganhar
apoio popular na atual conjuntura da economia: a alta de preços de combustíveis
alavanca a inflação e a Petrobras não tem recursos para investir na exploração
do pré-sal, ficando de fora dos leilões de poços de petróleo, além de não
conseguir produzir diesel e gasolina suficientes para abastecer o mercado
brasileiro.
“É muito fácil: aumentou a gasolina, culpa
do Bolsonaro. Já tenho vontade de privatizar a Petrobras. Tenho vontade. Vou
ver com a equipe econômica o que a gente pode fazer. O que acontece? Não posso
controlar, melhor direcionar o preço, mas, quando aumenta, a culpa é minha
apesar de ter zerado imposto federal”, disse o presidente da República. A
repercussão das declarações no mercado foi imediata: no Ibovespa, principal
índice da B3 (Bolsa de Valores de São Paulo), as ações da Petrobras chegaram a
ter alta de 1,82% (ordiná- rias) e 1,99% (preferenciais).
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