- Folha de S. Paulo
O lado positivo é que não é preciso
recorrer às armas ou a revoluções populares para derrubar populistas
Dizem que os deuses punem os mortais
atendendo a seus desejos. Não muito tempo atrás, nos anos 90, cientistas
políticos, jornalistas e a opinião ilustrada em geral se queixavam da pouca
diferenciação ideológica entre partidos políticos no Ocidente e pediam um pouco
mais de polarização.
Àquela época, dizia-se, em tom de
“demi-chiste”, que tanto fazia ter um democrata ou um republicano na Casa
Branca, desde que Alan Greenspan seguisse no comando do Fed, o banco central
dos EUA.
O castigo veio a cavalo. A partir da segunda década do século 21, vem-se tornando cada vez mais comum o diagnóstico de que a polarização é o verdadeiro “mal-du-siècle”, sendo responsável pela radicalização política e pelo retrocesso democrático experimentado em vários países. Não são poucos os que ligam o aumento da polarização ao advento das redes sociais e às bolhas de informação que elas criam.
Não discordo dessa análise, mas as coisas
são sempre um pouco mais complicadas do que parecem. Há trabalhos que mostram
que, em vários casos, as populações mais radicalizadas são justamente as que
têm menos acesso à internet, o que torna necessário encontrar explicações mais
sofisticadas para os mecanismos pelos quais a radicalização ocorre.
Um ponto que gostaria de destacar é o
personalismo. Também na contramão dos anos 90, o avanço do autoritarismo hoje é
indissociável de figuras carismáticas, que são idolatradas por parcelas
variáveis da população. Se antes ainda havia as ditaduras mantidas por juntas
ou partidos hoje a regra é a erosão das instituições democráticas promovida por
líderes populistas, do que dão testemunha figuras como Trump, Putin, Orbán,
Netanyahu, Bolsonaro.
O lado positivo é que não é preciso
recorrer às armas ou a revoluções populares para derrubá-los. Como
mostram os casos americano e israelense, eles também podem ser removidos pelo
voto ou por arranjos políticos.
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