Valor Econômico
A direita vê espaço para mais avanços nas
eleições de 2022
Com um retrato na parede de Plínio Salgado
usando camisa verde e sigma no braço, o jovem presidente da Frente Integralista
Brasileira acende um cigarro atrás do outro enquanto explica pacientemente por
que está otimista com a chance de ter pelo menos um representante do movimento
na Câmara dos Deputados a partir de 2023.
“Nós vemos um campo fecundo nas próximas
eleições. As pessoas já passaram pela fase da revolta, de tirar a esquerda que
estava bagunçando com o país, de colocar um tampão para impedir a sangria.
Agora tem que curar a doença. Precisa fazer o remédio, que é mais complexo.
Deus, pátria e família? Sim, mas até o Alexandre Frota usou isso na última
campanha. Agora o povo brasileiro está à procura do conteúdo e da doutrina por
trás dessa frase. A solução está no integralismo”, afirma o filósofo Moisés
José Lima, recém-filiado ao PTB, dando como certas candidaturas do movimento em
São Paulo e no Distrito Federal - talvez outros Estados também.
O raciocínio do integralista Moisés aparece, com ajustes, em conversas com vários expoentes do conservadorismo e alimenta a expectativa da direita de ter uma bancada mais, digamos, “raiz” na próxima legislatura.
Eles avaliam, praticamente de forma
consensual, que houve muitos conservadores “nutella” surfando na onda
bolsonarista, em 2018, sem comprometimento com a causa. Que bastava atacar a
esquerda e defender algumas bandeiras para conquistar votos de um eleitorado
ainda confuso e sem tantas opções de oferta no terreno antiliberal. Que esse
discurso confuso teria gerado a ascensão de Frotas, Joices, Zambellis,
Comandantes Isso e Generais Aquilo. Agora os ultraconservadores acreditam que
boa parcela do eleitorado perdeu o constrangimento em abraçar com mais força
causas como o combate ao aborto, à descriminalização das drogas, à educação
sexual nas escolas e às pautas identitárias, a defesa do homeschooling, o porte
de arma.
Um deputado paulista que pode ser chamado
de direita raiz e pede para não ter o nome citado, na tentativa de evitar mal
estar com colegas, opina: “Teve muito oportunista pegando carona na onda de
2018. O próprio Bolsonaro soube aproveitar uma eletricidade que já estava no
ar, à procura de um para-raio. Provavelmente os conservadores vão continuar com
Bolsonaro para presidente, mesmo com algumas decepções, mas agora é ele quem
precisará da gente - não a gente dele”.
Deem-se os sinceros parabéns ao deputado
pela autoconfiança na capacidade de conquistar votos, mas ele tem razão em um
ponto: os ultraconservadores não querem ser identificados apenas como
bolsonaristas.
“De jeito nenhum isso resume o nosso
movimento”, ressalta o presidente da Frente Integralista Brasileira. “Bolsonaro
era e continua sendo insuficiente para oferecer as respostas que o Brasil
precisa. Reconhecemos que ele teve sua utilidade para barrar o plano
maquiavélico que vinha se desenvolvendo no país, mas não basta”, diz Moisés.
Assim como os camisas-verdes querem voltar
ao Parlamento, com o diagnóstico de que falta oferta para atender à demanda por
ultraconservadores, uma série de nomes da direita - ligados ou não ao
bolsonarismo - pretende estar nas urnas.
O ex-ministro Abraham Weintraub fala
abertamente, em suas lives, sobre a perspectiva de concorrer ao governo de São
Paulo. O blogueiro Oswaldo Eustáquio cogita sair ao Senado pelo Paraná. Amigos
do ex- chanceler Ernesto Araújo acham que ele disputará uma vaga na Câmara pelo
Distrito Federal ou pelo Rio Grande do Sul. Sérgio Camargo, da Fundação
Palmares, e Damares Alves são bastante citados como opções legislativas.
A direita, extrema ou não, vai de Bolsonaro
contra Lula em 2022 - mas não sem críticas. O acordo com o centrão, os casos de
corrupção, a má condução da pandemia, a interferência dos filhos no dia a dia
do governo fazem até ex-colaboradores apostarem em um discurso de depuração do
conservadorismo.
“Um governo popular, audaz e visionário
foi-se transformando numa administração tecnocrática sem alma nem ideal.
Penhoraram o coração do povo ao sistema. O projeto de construir uma grande
nação minguou no projeto de construir uma base parlamentar”, tuitou Ernesto
Araújo (822 mil seguidores) em maio. Ao que colegas diplomatas imediatamente
comentaram: “Ele escreveu com um olho no celular e outro na campanha”.
Nos Estados Unidos, a esquerda e os
centristas reclamavam de George W. Bush - até que vieram o Tea Party e a
altright. Lamentavam a vitória de Donald Trump - e então apareceram QAnon,
Proud Boys, Oath Keepers, Three Percenters, Boogaloo. Por aqui, o
ultraconservadorismo ainda tem algumas casinhas para avançar no tabuleiro da
direita.
***********
Também a esquerda, otimista com Lula mais
de 15 pontos à frente de Bolsonaro, traça nova estratégia para ganhar espaço na
Câmara e dar o mínimo de sustentação a um eventual governo do petista.
A leitura geral é de que vai ser preciso
livrar-se da “maldição dos 130 deputados”. Esse tem sido o tamanho, com alguma
variação para cima ou para baixo, da bancada mais raiz no campo progressista ao
longo das últimas eleições. Ninguém se ilude sobre a inevitabilidade de
alianças táticas com o centrão para aprovar projetos de lei ou emendas
constitucionais, como a revogação do teto de gastos.
Mas a esquerda - PT, PC do B, PSol, PDT,
PSB - considera ideal alcançar um número próximo, pelo menos, dos 171 votos que
são necessários para blindagem contra pedidos de impeachment.
Ex-governadores e outros nomes populares no
petismo estão sendo procurados para concorrer à Câmara em 2022. A lista inclui
Fernando Pimentel (MG), Tarso Genro (RS) e Eduardo Suplicy (SP). Guilherme
Boulos (Psol), tido como bom puxador de votos, pode buscar mandato como deputado
federal em troca do compromisso de apoio do PT à Prefeitura de São Paulo em
2024.
O xadrez eleitoral desenhado por
interlocutores de Lula teria ainda a ex-presidente Dilma Rousseff disputando
uma vaga na Câmara, por Minas ou pelo Rio Grande do Sul. Drama que atormenta
alguns figurões do partido: quem criará coragem para conversar com ela, que já
ocupou o Palácio do Planalto e continua com sua fama intacta de brava, sobre o
“rebaixamento” a deputada. “Eu já disse que não vou”, disse uma pessoa que fez
parte do ministério de Dilma e teme o humor dela ao receber essa proposta de
candidatura.
Nenhum comentário:
Postar um comentário