Folha de S. Paulo
Depois da nova variante, pessoas mais
frágeis voltam a ser vítimas mais frequentes da epidemia
A ômicron seria
uma onda de Covid de sintomas mais "brandos", se dizia. Talvez
ainda se comprove que seja. Mas sabia-se que a proliferação imensa da nova
variante mataria muito simplesmente porque infectaria muitos. Mataria em
particular os mais frágeis, os mais velhos. Pois mata.
Em quatro semanas de janeiro, 38,4% dos
mortos por Covid no estado de São Paulo tinham 89 anos ou mais (770 mortos de
um total de 2.004). Em período equivalente de dezembro, eram 23,3%. Em
novembro, 21%.
Houve também mais mortes "insignificantes", como dizem os bolsonaristas. Em dezembro, nenhuma criança com menos de 5 anos havia morrido por causa da doença. Em janeiro, foram 9. Dessas, 6 eram bebês com menos de 1 ano.
"Ah, todo mundo vai pegar".
"Não tem jeito". Quase mais ninguém aguenta ouvir falar de epidemia;
muita gente de fato vive em tormento psicológico sério por causa de todos os
problemas causados pela doença, do medo à vida mutilada. Seja o que for que se
pense a respeito, a estatística insuportável, mórbida ou o nome que se dê,
recomenda que cuidemos de nossos avós, mães, pais. O massacre quase sempre foi
maior entre eles; piorou. A essa altura da nova onda de desgraça, não resta
muito mais a fazer do que a cortesia mínima em relação à vida: não leve para
junto deles os vírus que você pegou por qualquer motivo que seja, talvez muito
provavelmente trabalhando, mas por vezes também em aglomeração fútil ou também
desmascarada.
O número
diário de mortes no Brasil voltou a 662 por dia,
417 na média móvel de sete dias. Não se via tamanha tristeza desde setembro ou
outubro.
O apagão
de estatísticas sobre a doença não permite muita especulação
responsável sobre o começo e a duração desta onda de mortes —entre o começo de
dezembro e o começo de janeiro, não havia dados confiáveis ou completos. Apenas
uma quinzena depois disso foi possível ter ideia menos imprecisa do que se
passa. Portanto, é razoável dizer que não sabemos quando será o
"pico" deste surto dentro da epidemia e em que velocidade o número de
infecções e mortes vai retroceder.
Especialistas dizem que o número máximo de
casos ocorreria pouco antes da metade de fevereiro. O número de mortes,
portanto, começaria a baixar uma semana depois, por aí. A especulação é baseada
no comportamento da onda em países que passaram pela ômicron antes do Brasil.
Mas não sabemos. Ao que parece, pelos dados
menos inconfiáveis, a epidemia voltou a se agravar pouco antes do Natal, a
julgar pelos dados de internados em UTIs no estado de São Paulo. Explodiu de
vez depois no começo de janeiro, depois da temporada de festas de final de ano.
O número de internados em UTIs de Covid
parece crescer em ritmo menor nos últimos dias. Pode ser que estejamos perto do
"platô" de casos e, a seguir, de mortes. Mas o número de pessoas em
terapia intensiva por causa da doença chegou a 3.400. Na semana anterior ao
Natal, eram cerca de 900. Além do mais, não sabemos quão extenso será esse
platô e quão rápida (ou não) será a descida do pico da morte.
O que era possível fazer contra a ômicron?
Pouco: mais do mesmo e mais rápido. Não se fez. Era preciso ter vacinado mais,
em campanha nacional de emergência. Era preciso ter explicado que, mais
"branda" ou não, a ômicron seria um arrastão, pegaria mais gente e,
pois, mataria mais apenas por isso. Mas as pessoas se cansaram do assunto,
muitas se atormentaram de modo sério, os governos locais não tiveram senso de
urgência renovado e os mandarins da morte bolsonarista reforçaram a campanha
contra a vacina, inclusive de crianças.
Nenhum comentário:
Postar um comentário