sexta-feira, 4 de março de 2022

Bruno Boghossian - A guerra de Putin

Folha de S. Paulo

Presidente molda futuro político a partir das repercussões internas da invasão da Ucrânia

A popularidade de Vladimir Putin disparou depois que a Rússia bombardeou a Tchetchênia, em 1999. Os números do então primeiro-ministro passaram dos 80% e abriram caminho para sua eleição à presidência, no ano seguinte. A guerra contra a Geórgia, em 2008, e a invasão da Crimeia, em 2014, também lhe renderam um belo bônus de aprovação.

Conflitos armados são oportunidades para alguns políticos. Em certos casos, os embates despertam na população um sentimento coletivo de união, que acaba se traduzindo em apoio aos governantes. Mesmo quando os disparos ocorrem no exterior, um outro tipo de luta se desenrola dentro das fronteiras.

Putin também guerreia em solo russo. Nesta quinta (3), o presidente foi à TV para um longo pronunciamento voltado aos cidadãos do país. Numa típica manobra de propaganda, ele descreveu o conflito como uma operação bem-sucedida, chamou seus soldados de heróis e justificou a invasão da Ucrânia a partir de supostas ameaças à Rússia representadas por neonazistas e bombas nucleares do Ocidente.

O governo tenta controlar o humor da população com conhecidos métodos de manipulação de informações. Proibiu o uso da palavra "guerra" na mídia e apertou o cerco a manifestantes contrários à invasão (estima-se que mais de 7 mil pessoas tenham sido detidas em protestos).

Apesar da campanha, os efeitos políticos da guerra são mais incertos do que os dividendos que Putin colheu em ofensivas militares anteriores. O maior risco para ele, até aqui, são os efeitos das sanções impostas ao país. Os ganhos de popularidade obtidos por governantes russos nas últimas décadas só se sustentaram quando a economia ia bem.

O presidente russo já era muito popular antes da invasão: sua taxa de aprovação era de 71% em fevereiro, segundo o instituto independente Centro Levada. Ainda que esteja progressivamente isolado na cena internacional, Putin deve moldar seu futuro político a partir das repercussões internas da guerra.

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