quinta-feira, 10 de março de 2022

Lu Aiko Otta: Menos impostos nos combustíveis, lá e cá

Valor Econômico

Tratada como vilã, tributação no Brasil é menor do que na média dos países da OCDE

Tratada como vilã na novela dos combustíveis, a tributação sobre esses produtos no Brasil é menor do que na média dos países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Aqui se paga 36,8% sobre o preço final da gasolina e 21% no diesel, ante 52,6% e 47,3% na média das principais economias do mundo.

Os dados estão na nota técnica “O Sistema Tributário dos Países da OCDE e as Principais Recomendações da Entidade: Fornecendo Parâmetros para a Reforma Tributária no Brasil”, elaborada por Pedro Humberto Bruno de Carvalho Junior, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Para combustíveis, o trabalho recomenda que não sejam feitos cortes na tributação, dado que essa já é inferior à média. Sugere também que a cobrança seja feita na forma de um valor fixo por litro, e não de um percentual, como é hoje. Assim, num cenário de flutuação de preços, a arrecadação se manteria estável e os repasses seriam amortecidos.

Para tomar emprestada uma expressão usada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, a guerra entre Rússia e Ucrânia caiu “como um meteoro” nesse debate e na ideia de encarecer o uso de combustíveis fósseis para desincentivar o seu uso.

“Os países discutem cortar a tributação sobre combustíveis de forma a amortecer os preços”, comentou Carvalho. Assim, o debate em curso no Brasil não está distante do que ocorre na fronteira de políticas tributárias no mundo.

A diferença, diz o pesquisador, é que na maior parte dos países a decisão cabe apenas ao governo central. Aqui no Brasil, a tributação “esbarra na questão federativa”, pois os combustíveis estão entre as principais bases de arrecadação do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), de competência dos Estados.

O estudo do Ipea vai muito além dos combustíveis. Procura mostrar como outros países tributam e, com isso, dar elementos para as discussões de mudanças nos impostos aqui no Brasil.

Em seu ponto central, a nota mostra que as propostas de emenda à Constituição (PECs) 45 e 110, as principais em discussão no Congresso, têm foco em investimento e desenvolvimento econômico, mas passam ao largo da linha de debate mais moderna, que busca uma reforma tributária inclusiva. “Perde a oportunidade de tornar o sistema mais igualitário”, avalia o autor.

Nos anos 1990, a tendência nas principais economias era contrária a impostos pessoais sobre a riqueza. Nos últimos anos, uma tributação mais intensiva sobre milionários passou a ser considerada em vários países. As recomendações da OCDE passaram a focar em ganhos de capital. A recente criação de um imposto mínimo global sobre grandes corporações é um exemplo dessa nova visão.

Com a pandemia, essa tendência se acentuou, comenta Carvalho. Nos Estados Unidos está em discussão um imposto sobre ganhos de capital não realizados. Rendimentos com ações, por exemplo, poderão ser taxados periodicamente, ainda que o ativo não tenha sido vendido.

No Brasil, a proposta para uma taxação mais forte sobre a renda dos mais ricos não está nas PECs 45 e 110, e sim no Projeto de Lei 2.337/21, em análise no Senado. A distribuição de lucros e dividendos, que hoje é isenta, passaria a ser tributada em 15%.

A experiência mostra que reformas não são aprovadas em ano eleitoral. Guedes tenta desafiar essa lógica. Reuniu-se na última terça-feira com o relator da PEC 110, senador Roberto Rocha (PSDB-MA).

Mas, mesmo no entorno do ministro, não se espera uma definição ainda em 2022. A ideia é seguir com as discussões e chegar a um texto maduro para ser votado no início do próximo ano. É de se duvidar, mas a ideia é repetir a estratégia da reforma da Previdência.

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Coincidência ou não, a ideia de decretar uma nova calamidade por causa da guerra entre Rússia e Ucrânia sobrevoa a Esplanada dos Ministérios. Nessa condição, resumiu um integrante do governo, pode-se fazer o que quiser.

Com o teto de gastos suspenso, seria uma oportunidade para acomodar projetos eleitoreiros engavetados por causa do teto de gastos.

Já vimos recentemente o “meteoro” dos precatórios servir de pretexto para abrir uma folga generosa no teto e abrigar outras despesas de carona. O preço foi a corrosão da credibilidade do arcabouço fiscal. Seria bom não repetir o truque.

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