Valor Econômico
Parlamentarismo branco de Brasília é quem
move troca na Petrobras
O almirante Eduardo Bacellar Leal Ferreira
chegou à presidência do Conselho de Administração da Petrobras junto com o
governo Jair Bolsonaro. O estatuto prevê que seu mandato, de até dois anos,
poderia ser renovado três vezes consecutivas.
O almirante poderia, portanto, atravessar o
próximo mandato presidencial inteiro, mas deixará o cargo sem que apresente
óbices a seu exercício.
Se aprovado pela mesma assembleia, o
engenheiro Rodolfo Landim poderá, no limite, manter o cargo até 2030,
atravessando os dois próximos mandatos presidenciais.
A escalada dos combustíveis é tão danosa que
a troca é associada ao impulso do presidente em meter a mão na política de
preços da estatal.
Cálculos independentes já apontam defasagem no preço determinado pela política de paridade internacional, de 25% a 30%. A vontade do presidente já tem sido, de alguma forma, contemplada. Para atendê-lo mais ainda seria preciso enfrentar o câmbio, os projetos de lei que tramitam no Congresso, além do superveniente Vladimir Putin.
O conselho para cuja presidência Landim foi
indicado supervisiona a política de preços, mas quem a gere é a direção da
empresa. O general Joaquim da Silva e Luna é seu titular desde fevereiro de
2021, quando substituiu Roberto Castello Branco, executivo indicado pelo
ministro Paulo Guedes.
Ao longo dos 13 meses de coabitação entre
Leal Ferreira e Silva e Luna, almirante e general convergiram. São oficiais que
continuaram a se desincumbir de suas funções, como em postos pregressos, o
comando da Marinha, no caso do almirante, e o Ministério da Defesa e a
presidência de Itaipu, no caso do general. Ambos com pouco domínio sobre a
indústria do petróleo mas obedientes às regras estabelecidas e à preservação de
seus currículos.
São duas as principais regras de que
cuidam, as políticas da empresa, entre as quais a de preços, e aquelas da
governança estabelecidas depois da Lava-Jato. Se os combustíveis estão a exigir
flexibilidade no mundo inteiro, pela pandemia e, agora, pela guerra, sobre a
governança não há fatos da conjuntura a impor mudanças.
Nas três vezes em que Silva e Luna foi
convocado ao Congresso em 2021 ficou clara a escalada da investida sobre sua
gestão. Mais do que a política de preços, foi o abastecimento das termelétricas
pela Petrobras que municiou as audiências públicas.
Por ali desfilaram os defensores das
termelétricas. De Uruguaiana a Manaus, passaram pelas dificuldades de empresas
em todo o país. Na titularidade das termelétricas cujas agruras foram ali
compartilhadas, estão tradicionais empresários do setor, como Carlos Suarez, o
S da OAS, ou grupos como o JBS, de Wesley e Joesley Batista, e Eneva, que tem
no BTG de André Esteves, seu principal acionista.
Essas agruras se acumulam desde que as
termelétricas, planejadas para serem abastecidas por gás abundante e barato,
viraram mico - pelo preço e pelas exigências ambientais que movem energias
alternativas para as quais o Brasil é vocacionado.
Esses micos têm sido empurrados à Petrobras
por todas as gestões do PSDB ao PT, passando - e como - pelo MDB de Michel
Temer. Com a Petrobras sob a rédea do departamento de justiça americano, as
termelétricas buscaram o velho abrigo da Eletrobras na MP que resultou na
privatização do interesse público e socialização de prejuízos privados.
Aos R$ 84 bilhões que foram empurrados
goela abaixo do consumidor de energia pela contratação obrigatória de
termelétricas em lugares onde não há gás para abastecê-las, planejava-se um
acréscimo de R$ 33 bilhões. Este era o valor calculado para a construção de
gasodutos que deixaria de ser custeado pelas empresas para onerar o
contribuinte.
De um único parlamentar, Elmar Nascimento
(União Brasil -BA), Silva e Luna ouviu 14 perguntas. Depois de comandar a
Comissão Mista que elaborou o Orçamento de 2021, o parlamentar recebeu a
relatoria da MP da Eletrobras, prestígio que só aliados incondicionais do
presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do ministro da Casa Civil, Ciro
Nogueira, podem almejar.
Tal foi o empenho parlamentar na reparação
das agruras do setor, que os vigias da moralidade pública acordaram do sono
eterno e resolveram barrar o brinde adicional embutido em outra MP.
Foi sob este clima que o Congresso encerrou
os trabalhos em 2021. Sem ter como tirar mais da Eletrobras ou do consumidor de
energia, restava buscar uma alternativa na boa e velha Petrobras. Seria preciso
achar um jeito de compensar os acionistas minoritários e penhorar o
majoritário. A trilha sonora já estava pronta - “Começaria tudo outra vez”, de
Gonzaguinha.
Os trabalhos mal haviam sido retomados este
ano no Congresso quando veio a notícia de que Rodolfo Landim havia sido
indicado para presidir o Conselho de Administração da Petrobras. Engenheiro da
estatal por 26 anos, Landim, se aprovado pelos acionistas, chegará ao conselho
na condição de único, no colegiado, a entender, de fato, do negócio de petróleo
e gás.
Desde o governo Fernando Henrique Cardoso,
foi gerente-executivo da unidade de gás natural, presidente da Gaspetro,
integrante do Conselho de Administração da TGB, que transporta gás da Bolívia
para o Brasil e, finalmente, no governo Dilma Rousseff, chegaria à presidência
da BR Distribuidora.
Foi a mesma época em que outros gerentes da
empresa ganhariam o estrelato, como Nestor Cerveró e Paulo Roberto Costa.
Landim enfrentou, ainda, os lobbies sindicais da estatal.
A experiência acumulada no setor o levou
para o grupo de Eike Batista, titular de termelétricas, entre as quais a
Termoceará, um dos micos empurrados para a Petrobras, e a Eneva, hoje com o
BTG.
Landim move processo contra Eike e é alvo
de ação penal por suposta gestão fraudulenta envolvendo recursos do fundo de
pensão da Petrobras por parte de sua gestora de investimentos.
Ninguém duvida de que o cartola do Flamengo
tem competência técnica para submeter a atual direção da Petrobras a permanente
escrutínio. O estatuto confere este poder ao conselho. Tampouco se duvida que,
se Bolsonaro perder a reeleição, o sucessor pressionará pela troca de Silva e
Luna. Já Landim conhece tudo e a todos.
Sua indicação, a 10 meses do fim do
governo, é o gesto até aqui mais ousado do parlamentarismo branco. Ainda que à
sua revelia, há uma aposta de seus padrinhos. A de que mesmo que não seja
preciso, nem desejável, daria para começar tudo outra vez.
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