Folha de S. Paulo
Tucanos começaram a minar o próprio chão
quando Aécio contestou resultado das urnas
A saída de Geraldo Alckmin do PSDB rumo
ao PSB e
à Vice-Presidência na chapa
de Lula pode ser comparada à missa de sétimo dia de um partido que foi
uma das vigas mestras do sistema político inaugurado com a democracia, nos
longínquos anos 1980. Indistinguível de outras de igual porte, a legenda
continuará à disposição dos que ambicionam fazer da política uma profissão.
Na sua origem, o PSDB foi a agremiação
centrista de construtores da democracia; de reformadores moderados da economia
e das estruturas do Estado; e de inovadores no terreno das políticas sociais.
Sustentou com o PT, embora apenas no plano nacional, competição eleitoral
centrípeta, que tornou possível a estabilização das regras democráticas e
significativo progresso social.
Aproximava-os o compromisso com a
democracia; com a garantia das liberdades; e a busca de maior equidade.
Distanciavam-se na importância atribuída à moderação fiscal; às atribuições do
setor público e dos mercados; e às formas de obter reconhecimento no exterior.
Quando, no poder, o PT conseguiu dominar todo o território do centro à esquerda, o PSDB foi deslizando para a direita, recrutando ali quadros e a maioria do seu eleitorado, ao tempo em que mudavam suas bandeiras e valores. Até 2014 —mas só nas disputas presidenciais— o partido foi o desaguadouro dos votos antipetistas de todos os matizes da direita: ultraliberais ou conservadores; republicanos ou patrimonialistas; democratas ou nostálgicos da ditadura.
Os tucanos começaram a minar seu próprio
chão assim que, no dia seguinte à derrota de 2014, Aécio Neves contestou o
resultado das urnas —pedra de toque do sistema do qual era um dos fiadores.
O partido continuou a fazê-lo ao aceitar,
com malandro entusiasmo, a apropriação da Lava Jato contra seu principal
adversário e ao embarcar alegremente na operação —para sempre sujeita a
controvérsias— de destituir Dilma Rousseff, dando sustentação ao professor
Michel Temer —um substituto com legitimidade contestada e apoio popular zero. A
sigla morreu em 2018, quando seus eleitores tradicionais migraram em massa para
Jair Bolsonaro, uns a contragosto, outros exultantes por encontrar, enfim, o
chefe de suas afinidades.
O PSDB foi a principal vítima da crise
política que ajudou a dar à luz e a nutrir, abrindo as portas para o que há de
mais primitivo e cruel no país. Deixou órfãos —e a reboque dos ultras—
políticos e eleitores que poderiam dar sustentação a uma direita civilizada
como as democracias sempre comportam. Mas que nenhum dos candidatos da chamada
terceira via parece, por ora, ser capaz de agregar.
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