Valor Econômico
O custo será mais doloroso se a região
demorar a construir uma base mais sólida capaz de elevar a produtividade e
promover inclusão e sustentabilidade
A América Latina necessita realmente reconfigurar sua composição econômica para responder aos desafios atuais. É a mensagem, nada nova, mas revigorada, agora num cenário global mais turbulento, feita pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Em novo relatório sobre as perspectivas econômicas da região, na qual o Brasil tem forte peso, a constatação é de que o crescimento econômico está desacelerando na América Latina, em linha com a economia global. A expansão do Produto Interno Bruto (PIB) per capita estabilizou-se próximo ao seu crescimento potencial. A inflação persistente, as vulnerabilidades fiscais, as tensões geopolíticas e as perturbações relacionadas ao clima continuam a representar riscos, variando conforme as diferentes estruturas econômicas, composições das exportações e capacidades institucionais.
O levantamento aponta alta volatilidade nos
fluxos financeiros externos para a região. Os investimentos em carteira
diminuíram na última década, e o investimento estrangeiro direto (IED) estagnou
em meio à incerteza sobre a dinâmica do comércio global, embora os níveis
permaneçam relativamente altos em comparação com outras regiões.
Sem surpresa, ao apontar os desafios
econômicos da região, a OCDE dá ênfase na produtividade persistentemente baixa,
que limita a competitividade e a resiliência, gera crescimento insuficiente e
uma fraca convergência com as economias desenvolvidas. A produtividade do
trabalho na América Latina cresceu apenas 0,9% ao ano entre 1991 e 2024, em
comparação com 1,2% nos países da OCDE. Os ganhos nessa área têm sido
particularmente fracos no setor de serviços, agravados pelo emprego informal e
por práticas insustentáveis.
No caso do Brasil, em 2024 a produtividade do
trabalhador era equivalente a apenas cerca de um terço daquela observada nos
países da OCDE (que reúne desde EUA, Alemanha e Japão até Coreia do Sul, México
e Colômbia). A produtividade brasileira é menor que a de países como Argentina,
Chile, Colômbia, Costa Rica, México e Uruguai. Produtividade reflete não apenas
carga horária, mas também fatores como escolaridade e tecnologia. Se o ritmo de
seu crescimento não acelerar, o padrão de vida continuará abaixo do esperado.
Em 2023, nada menos que 55,1% dos
trabalhadores na América Latina e no Caribe estavam empregados informalmente,
reduzindo o espaço fiscal e enfraquecendo a proteção social. Apenas 2,1% dos
empregos estão em setores de média e alta tecnologia, em comparação com 7,7%
nos países da OCDE, o que restringe a capacidade de inovação.
Nesse cenário, os países da América Latina destinam,
em média, somente 0,5% do PIB para políticas de desenvolvimento da produção
(PDP), visando aumentar a produtividade e promover a transformação estrutural e
a diversificação econômica. Em comparação, na OCDE a taxa é de 3%.
Ao mesmo tempo, a renúncia de receita pelos
governos - por meio de isenções, deduções, reduções de alíquotas, créditos
presumidos e outros mecanismos - absorve recursos consideráveis e representa 4%
do PIB da região; desses, 0,9% é incentivo fiscal voltados especificamente para
empresas. No Brasil, esse gasto fiscal chegou a 4,8% e 1,1% do PIB,
respectivamente, em 2023. O IBGE calculou que o PIB do Brasil totalizou R$ 10,9
trilhões naquele ano, e, portanto, a renúncia fiscal foi de R$ 523,2 bilhões. O
relatório vê poucos indícios de que certos incentivos desempenhem um papel
decisivo nas decisões de localização de investimentos na região, que muitas
vezes teriam ocorrido de qualquer forma.
A OCDE conclui que os gastos públicos na
América Latina são distorcidos, com 80,7% destinados às necessidades correntes,
em vez de investimentos de capital. Há diferentes estratégias de PDP na região,
mas a falta de coordenação e os orçamentos insuficientes prejudicam a
implementação. Nos 33 países da região, 197 entidades ministeriais estão envolvidas
nas PDP, com dois terços dos países envolvendo cinco ou seis ministérios
diferentes.
Num contexto de espaço fiscal limitado, os
governos são aconselhados a efetivamente alinhar políticas horizontais que
moldam toda a economia - como pesquisa e desenvolvimento (P&D), compras
públicas, incentivos fiscais e apoio ao empreendedorismo - com políticas
verticais voltadas para setores estratégicos como energia renovável,
agricultura sustentável, indústrias digitais e economia do cuidado.
A receita não é original: os governos
precisam efetivamente envolver mais os atores públicos, privados e
internacionais; identificar novas fontes de financiamento; projetar
instrumentos inovadores; canalizar investimentos de qualidade e apoiar setores
prioritários.
O custo será mais doloroso se a região
demorar a construir uma base mais sólida capaz de elevar a produtividade e
promover inclusão e sustentabilidade. Quanto mais tarde isso ocorrer, maior
será o preço a pagar.

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