Disputa pelo Eliseu. Apuração revela ainda crescimento recorde da extrema
direita, que dá a Marine Le Pen condição de se converter no fiel da balança
para o segundo turno do dia 6; discursos de candidatos finalistas são
endereçados a eleitores radicais
Andrei Netto
PARIS - Numa eleição marcada pela alta mobilização popular e pela ascensão
surpreendente da extrema direita, o candidato do Partido Socialista (PS),
François Hollande, confirmou a expectativa e venceu o primeiro turno das
eleições à presidência da França com 28,63% dos votos - totalizadas 99,9% das
urnas.
Com 27,08% da preferência, Nicolas Sarkozy tornou-se o primeiro chefe de
Estado da história do país a chegar em segundo lugar nesta etapa do pleito e
agora depende dos votos da candidata radical Marine Le Pen, da Frente Nacional
(FN), para tentar conquistar a reeleição.
O resultado oficial ainda dependia dos votos do exterior, mas os índices
apontados pelo Ministério do Interior já estavam virtualmente definidos. Os
dados revelaram o crescimento recorde da extrema direita, que reuniu 18,01% dos
votos, a maior votação da FN desde sua criação, em 1972. As urnas também
indicaram um bom desempenho da extrema esquerda, embora inferior ao esperado
pelas pesquisas da última semana. Jean-Luc Mélenchon, candidato da coligação
Frente de Esquerda, que inclui o Partido Comunista (PCF), reuniu 11,13% dos
votos, registrando o melhor desempenho de um partido radical de esquerda desde
1981. Já o centrista François Bayrou, do Movimento Democrático (Modem), foi a
decepção, com 9,11%, em quinto lugar.
A vitória de Hollande sobre Sarkozy já era celebrada na sede do PS no fim da
tarde, quando o Estado conversou com militantes e líderes políticos. Os
discursos se dividiam, entretanto, entre a satisfação pela vitória parcial e a
preocupação com o crescimento de Marine, o que deverá obrigar os socialistas a
reorientar a campanha nas próximas duas semanas, levando em conta os temas do
eleitorado extremista.
Em seu primeiro discurso, em Tulle, cidade do sudeste da França, Hollande
criticou seu principal oponente e acenou a quem votou na extrema direita.
"O primeiro turno representa uma sanção ao mandato que chega ao fim",
disse o socialista, em referência a Sarkozy. "Nunca, nem em 2002, a Frente
Nacional havia atingido um nível tão elevado. É um novo sinal que convoca a
mudanças na república."
Minutos depois, Sarkozy falou à sua militância, reunida em um teatro de
Paris - que explodiu em vibração quando o escore da Frente Nacional apareceu
nos telões, esperando contar com essa reserva de votos. Ciente de que depende
do apoio da extrema direita para se reeleger, o chefe de Estado fez uma primeira
ofensiva sobre esse eleitorado.
"Os franceses expressaram um voto de crise, testemunhando suas
inquietudes, seus sofrimentos e suas angústias frente a este novo mundo que
está se desenhando", analisou o presidente, usando a seguir todas as
bandeiras da direita radical: "Estas angústias, estes sofrimentos, eu os
conheço, eu os compreendo. Elas dizem respeito a nossas fronteiras, à luta
contra a transferência de empresas para o exterior, ao controle da imigração, à
valorização do trabalho e à segurança". Sarkozy ainda desafiou seu
oponente a aceitar a realização de três debates de TV, na expectativa de bater
o socialista na frente das câmeras e reverter a desvantagem.
Convertida em fiel da balança, Marine Le Pen mostrou-se emocionada com o
resultado de sua primeira campanha, na qual superou o melhor porcentual obtido
por seu pai, Jean-Marie Le Pen, em 2002. Em seu discurso, ela já ensaiou o
lançamento de sua candidatura à presidência em 2017 e tentou buscar apoios na
esquerda radical. "É apenas o início de nosso combate. É o começo de uma
grande reunião de patriotas de direita e de esquerda, de apaixonados pela
França e defensores de sua identidade", disparou a extremista, sem
manifestar apoio a nenhum dos dois lados ainda na disputa. "Frente a um
presidente em fim de mandato, líder de um partido consideravelmente
enfraquecido, nós agora somos a única e verdadeira oposição à esquerda
ultraliberal, laxista e libertária."
A candidata prometeu se manifestar no dia 1.º sobre quem apoiará no segundo
turno do dia 6, quando pretende realizar uma passeata pelas ruas do país em
homenagem ao Dia do Trabalho.
Bayrou, por seu lado, afirmou que vai discutir com os dois finalistas ao
longo da semana para então revelar a quem apoiará. Já Mélenchon e a candidata
do Partido Verde (Europe Ecologie-PV), a jurista Eva Joly, abriram voto em
favor do socialista "para bater" o atual presidente.
De acordo com o cientista político Philippe Chriqui, especialista em opinião
pública, o primeiro turno da eleição foi um referendo pró ou contra Sarkozy,
que tem a aprovação de apenas 36%. Ele foi rejeitado tanto pela esquerda, que
somou 44% dos votos, quanto por um segmento da direita, que preferiu o FN. Para
o especialista, o 2.º turno se anuncia difícil para o presidente. "Diante
de tal rejeição, Sarkozy tem poucas chances. O objetivo para ele será sobretudo
o de não sair humilhado da eleição."
Ainda ontem, as primeiras pesquisas de intenção de voto para o segundo turno
confirmaram a expectativa de vitória socialista. Para o instituto Ifop, Hollande
deve se tornar presidente da república com 54,5% dos votos, contra 45,5% de
Sarkozy.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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