A popularidade de Dilma Rousseff vai subindo: chegou a 64% de avaliação
positiva. Praticamente dois em cada três brasileiros acham seu governo bom ou
ótimo. Dilma só perde para Lula no auge. Em um mês, o saldo de aprovação
presidencial ("ótimo + bom" menos "ruim + péssimo") subiu
11 pontos porcentuais: de 48 pontos no Ibope de março para 59 pontos no
Datafolha de abril. Vai ter gente xingando a opinião pública. De novo.
A aceleração da popularidade presidencial sugere que o corte dos juros no
atacado e no varejo foi um gol aos olhos do público. Era previsível. Juros
altos são malvistos pela população. Ao derrubar as taxas do Banco Central e
obrigar os bancos federais a fazerem o mesmo, Dilma ampliou o crédito e
facilitou a vida do consumidor. De quebra, como o Banco do Brasil está
descobrindo, cai a inadimplência.
É um paradoxo aparente: enquanto a economia está em expansão, quanto mais
gente toma empréstimo ou faz crediário, menor o risco de quem empresta o
dinheiro. Os caloteiros se diluem na massa de bons pagadores. Pobres tendem a
pagar suas dívidas mais em dia do que ricos, logo, quanto mais gente tomando
emprestado, melhor para os bancos. Em tese.
Na prática, depende da posição relativa de cada banco no mercado de crédito.
Para não ver sua fatia murchar, os bancos privados precisam correr atrás do
consumidor, mas não é fácil recuperar o terreno perdido. Quem saiu na frente
levou vantagem, capturou a clientela.
No Brasil pré-consumo de massa, os bancos se acostumaram à alta
rentabilidade de poucos empréstimos. Agora, com os juros menores do BB e da
CEF, os bancos precisam compensar a perda de margem de lucro com ganhos de
escala. Nem todos vão conseguir. A gritaria vai piorar.
Nessas horas desponta o discurso de autoridade. Especialistas esgrimem
argumentos técnicos e jargão incompreensíveis ao senso comum. Agouram o
crescimento e alertam para a catástrofe na esquina. Embora o retrospecto não
lhes favoreça, podem ter razão. Ou pode ser que estejam apenas defendendo o
status quo.
Não é incomum. No Brasil como nos EUA, toda vez que as coisas não saem como
quer a minoria, a culpa é da maioria ignorante e manipulada. Nem se imagina a
possibilidade de a opinião pública agir racional e pragmaticamente em prol de
seus próprios e egoísticos interesses.
Por essa versão, o republicano George W. Bush foi um dos presidentes mais
impopulares da história norte-americana simplesmente porque a mídia liberal
manipulou a verdade (e não porque ele foi incompetente).
O democrata John Kerry tomou uma lavada eleitoral do mesmo Bush por causa da
propaganda mentirosa dos republicanos (e não porque ele foi inapto). É
reconfortante. Exime a autocrítica. Dá férias ao superego.
No Brasil, quando Lula perdeu três eleições presidenciais seguidas, foi por
culpa da mídia, que manipulou a massa de manobra que, afinal de contas, deve
ser o eleitorado. Quando o petista ganhou três eleições presidenciais seguidas,
foi culpa do mesmo eleitor manobrável. A minoria muda de lado, suas desculpas
não.
No último meio século, estudo após estudo tem chegado à mesma constatação: o
eleitor é mais esperto do que seu estereótipo nos faz acreditar.
Os eleitores votam de acordo com sua percepção dos méritos e do passado dos
candidatos. O eleitor identifica diferenças nas propostas dos candidatos e vota
nas de que gosta mais. Apesar dos seus limites de tempo e conhecimento, os
eleitores encontram guias para votar de acordo com seus interesses. São
conclusões das ciências sociais, calçadas em pesquisas de opinião.
Se, como diz a ciência, o eleitor não é um cordeiro temperado para digitar
na urna o que lhe mandam, quem ganha com a repetição interminável da ideia de
que ele é manipulável? Os pretensos manipuladores, é claro.
Como escreve o professor emérito da Rutgers University (EUA) Gerald Pomper,
"se o eleitor é um idiota, por comparação os especialistas são espertos;
se o eleitor não tem noção, ele precisa de alguém sabido para lhe indicar o
caminho".
Ou seja, mesmo que o estereótipo do eleitor manobrável seja falso, a sua
propagação abre um rico mercado de "manipulação" para marqueteiros,
politicólogos, consultores, jornalistas e blogueiros. Além de servir de
consolação para a minoria derrotada na batalha da opinião pública.
No limite, quem compra acriticamente a ideia de que o eleitor é um inocente
útil está pronto para comprar também os pretensos serviços de manipulação do
eleitorado. Quem é manipulável, afinal?
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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