O debate sobre a
política de concessão de serviços públicos ao setor privado trazem desafio para
Dilma
As discussões dentro
do governo sobre a política de concessão de serviços públicos ao setor privado
revelam um labirinto no qual está presa a presidente Dilma Rousseff. Toda essa
questão lembra-me muito um dos mais interessantes livros que já li sobre os
dilemas que enfrentam, de tempos em tempos, muitos líderes políticos. Gabriel
García Márquez explora esse tema com maestria e profundidade no livro "O
General em Seu Labirinto", que apresenta uma versão romanceada da parte
final da vida de Simón Bolívar.
O labirinto da
presidente Dilma, nesta segunda década do século 21, é claramente diverso do
que enfrentava -na visão de García Márquez- Bolívar. Mas tem todas as
características de um labirinto, com seus caminhos falsos e um único
verdadeiro, que liberta o prisioneiro. E como vejo esse labirinto -e como
encontrar sua saída- tomando por base minha experiência no comando das
privatizações no primeiro mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso?
A linha de lã de
carneiro que poderá permitir à presidente -como na versão grega dessa história-
encontrar a saída do labirinto precisa ser forte e tecida com arte e
eficiência. Um primeiro fio da linha imaginária deve ser, necessariamente, o da
convicção de que um programa de concessões de serviços públicos pode levar ao
aumento dos investimentos privados na infraestrutura econômica.
Fortalecem essa
convicção os resultados que o país acumulou ao longo dos últimos 20 anos, em
várias experiências, como são os casos do setor de rodovias no Estado de São
Paulo, das ferrovias federais e, principalmente, das telecomunicações.
Se essa convicção for
alcançada, ficará mais fácil à presidente enfrentar a questão política, representada
pela oposição histórica de seu antigo partido (PDT) e do PT às privatizações do
governo Fernando Henrique. Os interesses da sociedade devem prevalecer sobre as
posições políticas e as partidárias, como Dilma Rousseff mostrou em várias de
suas decisões como presidente do país.
Mas esse mesmo fio
precisa trazer também a força da verdade dos fatos, e não apenas a das
convicções ideológicas. E, no caso das concessões ao setor privado, é preciso
dizer que as concessionárias privadas não podem ter a liberdade absoluta na
condução de seus planos de negócios. Como concessionárias de serviços públicos,
devem obedecer a certos limites para garantir a qualidade dos serviços e o
acesso universal a eles por parte dos cidadãos, como acontece no Brasil de hoje
no caso dos serviços de telecomunicações.
Outra restrição que
deve constar de forma clara nos contratos de concessão é a tentativa de impor
ao mercado condições que derivam da natureza de monopólio natural de certas
concessões.
Em contrapartida, o
fio salvador precisa trazer também o respeito ao direito das empresas privadas
de buscar a maximização de seus lucros dentro dos limites estabelecidos nos
contratos de concessão relativos à qualidade dos serviços, à sua universalização
possível e à prática de atitudes monopolistas. Na legislação brasileira, esses
direitos estão protegidos pelo conceito de equilíbrio financeiro dos contratos
de concessão.
Por essa cláusula, os
concessionários de serviços públicos não podem ser obrigados a operar com
prejuízo, principalmente em razão de mudanças externas na condução de seus
negócios. Não por outra razão, nas concessões das rodovias federais realizadas
no governo Lula, os investimentos realizados até agora não foram os previstos
originalmente. A melhor forma de respeitar esse direito é aceitar que os
concessionários busquem nos leilões taxas de retorno compatíveis com os riscos
associados e as condições de mercado.
Creio que, seguindo
esses objetivos parciais, o governo possa criar as condições necessárias para o
sucesso de um amplo e moderno programa de concessões de serviços públicos, a
ser implantado nos próximos anos. Os instrumentos contratuais e modelagens dos
leilões para isso estão disponíveis nas experiências exitosas que o Brasil acumulou
nos últimos anos.
Luiz Carlos Mendonça
de Barros, 69, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos.
Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique
Cardoso).
FONTE: FOLHA DE S.
PAULO
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