Nascido em
Itabuna, na Bahia, em 1943, morreu nesta manhã de 20 de setembro, no Rio de
Janeiro, o filósofo e cientista político Carlos Nelson Coutinho. Professor
emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde lecionava na Escola de
Serviço Social, Carlos Nelson deixa um legado amplo na área da produção
cultural e também na área política.
Militante do
PCB por muitos anos, desde a juventude, Carlos Nelson escreveu mais de uma
dezena de livros, a começar por Literatura
e humanismo, lançado no final dos anos 1960 pela Editora Civilização
Brasileira, de Ênio Silveira. Em Literatura
e humanismo, já estão presentes algumas qualidades que o distinguiriam nos
anos seguintes, como a clareza de pensamento, a escrita elegante e a percepção
refinada de autores fundamentais, como atesta o ensaio sobre Graciliano Ramos.
Também neste livro inaugural está presente a influência decisiva do filósofo
húngaro Georg Lukács, cujas ideias sobre o realismo norteavam as pesquisas do
então jovem crítico brasileiro.
Nos anos
1970, Carlos Nelson conheceu o exílio em Bolonha — terra em que se afirmara por
décadas o seu amado Partido Comunista Italiano, outra das referências
político-intelectuais imprescindíveis para entender o nosso autor — e,
posteriormente, em Paris. Foi membro eminente do “grupo de Armênio Guedes”,
que, dentro do PCB, buscava a renovação do comunismo brasileiro a partir da
questão democrática, vista — a democracia — como a alternativa mais produtiva
aos caminhos e descaminhos da modernização “prussiana” do capitalismo
brasileiro, que havia conhecido um novo impulso a partir da ditadura implantada
em 1964. Neste sentido, Carlos Nelson se notabilizou, já na volta do exílio,
pelo ensaio “A democracia como valor universal”, fortemente inovador na cultura
comunista, exatamente por ter como assumida fonte de inspiração o pensamento
político amadurecido em torno do antigo PCI, muito especialmente Enrico
Berlinguer e Pietro Ingrao.
A partir
deste momento, incorpora-se vigorosamente à reflexão de Carlos Nelson a
presença de Antonio Gramsci: pode-se dizer que, a partir de uma original
interpretação de Lukács e Gramsci — isto é, dos temas da ontologia do ser
social e da política tal como estabelecida nos países de estrutura “ocidental”
—, tenha se estruturado a produção posterior de Carlos Nelson Coutinho, até o
livro mais recente, De Rousseau a
Gramsci. Ensaios de teoria política, publicado em 2011.
Nos últimos
meses, mesmo abalado pela doença, Carlos Nelson dedicava-se a uma história da
filosofia, testemunho da enorme erudição e inquietação intelectual que o
acompanhou por toda a vida. Nos anos 1980, com a crise do PCB e o afastamento
de grande parte dos “eurocomunistas” brasileiros, Carlos Nelson passaria pelo
PSB (expressão do seu interesse pelo socialismo democrático), pelo PT e, a
partir de 2003, pelo PSOL. Estas opções políticas, naturalmente, deixaram marca
na produção teórica do nosso autor, que está destinada a ser tema de estudos e
reflexões por parte de todos aqueles que se preocupam com o destino do
humanismo, da democracia e do socialismo no nosso tempo.
Luiz Sérgio Henriques é o
editor de Gramsci e o Brasil.
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