Nota oficial da direção sobre o caso afirma que Supremo instalou um clima de
"insegurança jurídica" com condenações "sem provas"
Fernando Gallo
A Comissão Executiva Nacional do PT divulgou ontem nota com a posição
oficial do partido sobre o julgamento do mensalão na qual faz diversos ataques
ao Supremo Tribunal Federal. A direção petista afirma no documento que os
ministros da Corte fizeram política ao julgar o caso. Também diz que a Corte
"desrespeitou garantias constitucionais" para "tentar
criminalizar o PT".
Boa parte do conteúdo da nota divulgada ontem já vinha sendo apresentada em
declarações de dirigentes, principalmente via presidente do PT, Rui Falcão. O
documento de ontem acabou por consolidar as manifestações.
Na nota, o partido acusou o STF de dar "estatuto legal a uma teoria
nascida na Alemanha nazista, em 1939, atualizada em 1963 em plena Guerra Fria e
considerada superada por diversos juristas" para condenar o ex-ministro da
Casa Civil José Dirceu. Foi uma referência à teoria do domínio de fato, segundo
a qual quem ocupa posição de comando pode ser responsabilizado por um crime
mesmo não o tendo executado.
"Trata-se de uma interpretação da lei moldada unicamente para atender a
conveniência de condenar pessoas específicas e, indiretamente, atingir o
partido a que estão vinculadas", afirma a nota da direção nacional do PT.
O partido sustenta que o Supremo "instaurou um clima de insegurança
jurídica" no País e diz que as decisões do tribunal "prenunciam o fim
do garantismo, o rebaixamento do direito de defesa, do avanço da noção de
presunção de culpa em vez de inocência".
Também fustiga os ministros da Corte, acusando-os de agirem sob
"intensa pressão da mídia conservadora". Para a Executiva petista, os
magistrados "confirmaram condenações anunciadas, anteciparam votos à
imprensa, pronunciaram-se fora dos autos e, por fim, imiscuíram-se em áreas
reservadas ao Legislativo e ao Executivo, ferindo assim a independência entre
os poderes".
A nota ataca o STF por dar "valor de prova a indícios" e por não
fazer um julgamento "isento". "Houve flexibilização do uso de
provas, transferência de ônus da prova a réus, presunções, ilações, deduções,
inferências e a transferência de indícios em provas."
O texto divulgado ontem sustenta também que a "partidarização do
Judiciário" ficou "evidente". "O STF fez política ao
definir o calendário convenientemente coincidente com as eleições. Fez política
ao recusar o desmembramento da ação e ao escolher a teoria do domínio do fato
para compensar a escassez de provas".
Ao contrário do defendido anteriormente por parte dos integrantes da sigla,
nenhum desagravo explícito foi feito aos filiados condenados no caso - além de
Dirceu, José Genoino, Delúbio Soares e João Paulo Cunha.
Por entender que o Supremo negou aos então réus "a plenitude do direito
de defesa", ao impedi-los de recorrer a instância diferente, o PT avalia
ser legítimo que eles "recorram a todos os meios jurídicos para se
defenderem". A defesa dos condenados petistas avalia a possibilidade de
recorrer a cortes internacionais justamente alegando a impossibilidade de
recurso no sistema jurídico brasileiro, primeira questão de ordem levantada
logo no início do julgamento.
Lula. Falcão afirmou que mostrou o texto da nota Dirceu e a Genoino e disse
que ambos avaliaram que a nota estava "de bom tamanho". O
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva também tomou conhecimento do documento.
Indagado se via algo de positivo em todo o processo, Falcão afirmou que o
julgamento mostrou que "as instituições estão funcionando legalmente"
e que o processo pôde ser acompanhado na TV por toda a sociedade brasileira.
Embora conclame a militância a "mobilizar-se em defesa do PT e de
nossas bandeiras", na direção do partido o texto é tido como o ponto final
no caso e a questão é considerada "página virada". O PT não deve se
manifestar mais formalmente sobre o caso nem levará a cabo nenhuma outra contestação
do julgamento.
O secretário nacional de Comunicação e membro da Executiva, deputado André
Vargas (PT-PR), sustentou que o PT não se sente julgado como instituição.
"Houve alguns equívocos, mas vamos seguir em frente."
Reação. Na despedida ontem do Supremo, o presidente da Corte, Carlos Ayres
Britto, defendeu a instituição. Disse que o STF julgou o caso "com toda
tecnicalidade e com toda consistência". Britto, que em 1990 foi candidato
a deputado pelo PT - não foi eleito -, minimizou a nota da sigla, alegando que
ela "faz parte da liberdade de opinião e de expressão".
Fonte:
O Estado de S. Paulo
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