Por Raymundo Costa e Claudia Safatle - Valor Econômico
BRASÍLIA - A saída do PMDB da coordenação política do governo é o primeiro passo para o fim de uma aliança com o PT que elegeu e reelegeu a presidente Dilma Rousseff nas duas últimas disputas presidenciais. O afastamento do vice-presidente da República, Michel Temer, da articulação política já era esperada, após a votação do ajuste fiscal, mas foi precipitada devido a uma série de intrigas palacianas e acordos acertados e não cumpridos.
O desligamento formal deve ser sacramentado no congresso do PMDB no dia 15 de novembro, não por acaso a data comemorativa da Proclamação da República. Na ocasião, o partido vai anunciar que terá candidato próprio a presidente, o que não ocorre desde 1994. Deve ser apresentado também um programa partidário para "recuperar a confiabilidade, dar previsibilidade e segurança jurídica aos negócios", garantias perdidas no atual governo. O documento está sendo redigido pelo senador Romero Jucá (PMDB-RR).
O PMDB julga que o afastamento gradativo permitirá que o partido já se apresente nas eleições municipais de 2016 independente do PT, muito embora os dois partidos mantenham entendimentos para as eleições de cidades importantes como São Paulo. Os dirigentes pemedebistas preferem não relacionar a saída de Temer a um eventual "impeachment" da presidente Dilma Rousseff, mas os dois assuntos estão interligados.
A presidente Dilma sustenta-se sobre dois pilares: Joaquim Levy, ministro da Fazenda, na economia, e Michel Temer, vice-presidente que assumiu a coordenação política quando a desagregação da base aliada não dava ao governo segurança para aprovar o ajuste fiscal.
Tanto Levy quanto Temer sofrem bombardeio da equipe palaciana e do PT. Por isso ontem Temer mandou dizer que o cristal se quebrou (na semana anterior, ministros palacianos disseram que o cristal trincou quando Temer fez um apelo pela unificação do país).
Desde que assumiu a coordenação política, o PMDB reclama que não consegue dar sequência aos acordos feitos com os partidos aliados devido ao boicote dos ministros do PT. Os acordos não andam por questões de mérito ou administrativas.
O maior problema de todos, no entanto, é a falta de dinheiro, pois o governo está literalmente raspando o tacho para pagar suas contas este ano. Dos R$ 4,6 bilhões de emendas do orçamento impositivo previstas para o exercício, somente R$ 300 milhões foram liberados aos parlamentares. A falta de dinheiro transforma Levy num alvo fixo não só do PT, que nunca lhe estendeu o tapete vermelho, mas de todos os outros partidos da base aliada.
O ministro Eliseu Padilha, que na prática toca a coordenação política do governo, deve voltar a despachar na Secretaria de Aviação Civil, da qual é o titular, em setembro. Algo que já era previsto desde o semestre passado, mas que os pemedebistas fazem questão de frisar para não passar a ideia de que já romperam com o governo Dilma. Na prática, o afastamento do PMDB torna ainda mais difícil a relação entre o Palácio do Planalto e o Congresso.
A denúncia do procurador-gera, ontem, do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, tornou o ambiente político ainda mais complicado. "A Câmara é um território conflagrado", diz um cacique pemedebista. No momento, segundo a avaliação de líderes do PMDB no Congresso, Dilma ainda não está no ponto para cair, mas dificilmente vira o ano como presidente. "Você não tira um governo. O governo apodrece e cai", diz um desses pemedebistas. "Isso ainda não está pronto". Falta inclusive a adesão de outros partidos, como o PSDB, sem a qual não é possível um entendimento para o "impeachment".
"Está na hora de assumirmos o desafio de construir uma Nova República e de nos dedicarmos a gerar esperança nos que querem mudar", disse o ex-ministro Moreira Franco, presidente da Fundação Ulysses Guimarães, encarregada de coordenar a elaboração do programa e dos preparativos para a comemoração dos 50 anos do PMDB, no próximo ano. Segundo Moreira, a Nova República idealizada por Tancredo Neves nunca foi efetivamente implementada. O PMDB também quer se descolar do desgaste eleitoral e moral do PT.
Nenhum comentário:
Postar um comentário