A presidente Dilma Rousseff já deveria ter decidido se quer mesmo consertar a economia nacional e retomar o caminho do crescimento, mas continua agindo como se isso fosse um assunto secundário e nada urgente. Há quase oito meses no exercício do segundo mandato, ainda hesita em adotar de forma clara e consequente uma política de ajuste, evitando assumir o custo da indispensável arrumação das contas públicas. Sua tibieza se manifestou mais uma vez com a decisão de usar bancos oficiais para socorrer alguns setores – como sempre, os mais organizados e com maiores condições de pressionar o governo.
E mais uma vez uma decisão mal explicada contraria a estratégia defendida publicamente, desde o começo do ano, pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Obviamente derrotado, ele ainda tentou defender, quase gaguejando, o improvisado afrouxamento do crédito, como se isso em nada conflitasse com as medidas de estabilização defendidas pela Fazenda e pelo Banco Central (BC).
No mercado financeiro e nas consultorias, a nova ajuda às montadoras, às fornecedoras de componentes de veículos e a algumas outras indústrias foi logo percebida como reedição das ações “anticíclicas” do ministro Guido Mantega, antecessor de Levy. Chegou-se a falar em “manteguização” da política econômica. O neologismo descreve com razoável fidelidade o novo desvio da política oficial. É um benefício improvisado e dirigido, pelo menos inicialmente, a indústrias sempre favorecidas por facilidades fiscais, financiamentos especiais e protecionismo comercial.
Esse padrão, constante desde o segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi mantido quando a pior fase da crise havia passado nos países mais afetados pelo estouro da bolha financeira. A insistência nessa política favoreceu a inflação, sacrificou as contas públicas e fracassou como estratégia de crescimento. A atual crise brasileira é clara consequência desses erros.
O retorno às ações “anticíclicas” contraria tanto as promessas quanto as concepções defendidas pelo ministro Joaquim Levy e o enfraquece politicamente. Quanto vale sua palavra, se o seu discurso pode ser desmentido a qualquer momento pela presidente da República? E quanto valem as decisões do Comitê de Política Monetária (Copom), responsável pelo combate à inflação, se a presidente pode afrouxar a política de crédito, de forma voluntarista, por meio de uma ordem aos bancos oficiais?
As expectativas de produtores, comerciantes, investidores e consumidores podem contribuir para o sucesso de políticas de ajuste ou para dificultar sua execução. Não há novidade nesta afirmação nem dúvida quanto à sua sensatez, mas a presidente da República parece desconhecer ou menosprezar esse dado elementar. Ao ceder, de novo, às pressões de alguns grupos empresariais, ela desmoraliza os compromissos de ajuste proclamados por seus ministros e multiplica incertezas nos mercados.
Empresários favorecidos poderão até aplaudir essa política errática, mas dificilmente voltarão a investir enquanto os rumos da política forem mal definidos. Quanto à manutenção de empregos, objetivo anunciado como condição dos financiamentos, só ocorrerá, de fato, se os empresários quiserem. Eles até podem ter interesse em preservar os quadros de pessoal, mas terão a palavra decisiva sobre o assunto. O resto é encenação e só os muito ingênuos e desinformados podem afirmar o contrário.
Ao ceder à pressão de grupos, Dilma mostra sua fragilidade política mais uma vez e confirma sua vulnerabilidade. Em outros momentos, suas ações voluntaristas, como a contenção política de tarifas, mostraram inconsequência e graves falhas de compreensão dos fatos econômicos. Desta vez, a decisão de reeditar uma política fracassada revela a desorientação de uma presidente abandonada pelos aliados, acuada num cenário de escândalos e ameaçada por investigações cada vez mais próximas das autoridades. Uma das consequências será o prolongamento da crise econômica.
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