- O Globo
O dia de ontem pareceu curto demais para tantos eventos, mas a política trouxe o mais impactante dos fatos. Foram denunciados ao Supremo Tribunal Federal (STF) o presidente da Câmara e um ex-presidente da República. Os efeitos econômicos do agravamento da crise no Congresso são evidentes. Vai aumentar a guerrilha legislativa e nada se discutirá que nos permita sair do atoleiro fiscal.
Aeconomia precisa de previsibilidade. Isso é tudo o que não há neste momento. De qualquer maneira, o país precisa do avanço do Ministério Público no trabalho de apuração dos desvios cometidos pelos partidos aliados em empresas estatais. Por temperamento, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, se defende atacando. O ex-presidente Collor, também, como se viu nos impropérios entre dentes contra o procurador-geral da República.
A partir de agora, os dois ficarão mais fracos. E o poder se alimenta da expectativa de poder. Se o Supremo aceitar a denúncia do Ministério Público, Cunha perderá paulatinamente a capacidade de aglutinação que exerceu nos últimos meses na Câmara dos Deputados. Quanto a Collor, ele não é um polo de poder, é apenas um senador de modos histriônicos.
A dúvida que surge diante da denúncia do ex-presidente Collor é por que uma pessoa joga fora a segunda chance que a sociedade lhe deu? No caso, a sociedade de Alagoas. Após o processo de impeachment e de cassação temporária dos direitos políticos, ele voltou a ser eleito. Por que novamente se envolver em negócios duvidosos e ter carros de origem nebulosa? Aparentemente, é da natureza do senador.
Cunha está convencido de que foi vítima de uma conspiração; Collor se diz vítima de perseguição do procurador-geral, Rodrigo Janot, o mesmo Janot cujo nome terá que passar pelo Senado. O país continuará vivendo meses de tensão institucional. Isso aumentará a paralisia da economia. Contudo, o processo iniciado pela Lava-Jato tem permitido fatos inéditos e há uma enorme chance de o país sair muito melhor de toda essa crise.
Na economia, chegou o momento pior da crise. O desemprego vem subindo fortemente. Era 4,3% em dezembro e ontem foi anunciado que em julho chegou a 7,5%. O desemprego de jovens foi a 18,6%.
Essa é a taxa de desemprego metropolitana. Mede apenas o que ocorre em seis capitais. O novo indicador, a Pnad Contínua, com abrangência nacional, já havia mostrado um número mais alto, de 8,1%, no trimestre encerrado em maio. O que as duas pesquisas informam é que o ambiente do mercado de trabalho está tendo uma forte deterioração este ano.
A população desocupada, ou seja, o número total de desempregados, aumentou 56% em um ano, a maior elevação da série histórica. O rendimento médio real caiu 2,4% nesse período. O desemprego aumenta, a renda encolhe.
Hoje é dia de o Ministério do Trabalho divulgar os dados do emprego formal do Caged, e, conforme antecipou ao jornal O GLOBO o ministro Manoel Dias, julho terá novo fechamento de vagas, depois do corte de 111 mil em junho.
O dia de ontem teve também visita ao Brasil da chanceler alemã Angela Merkel, renúncia do primeiro-ministro grego Alexis Tsipras, e queda da bolsa americana Dow Jones ao menor nível do ano, por medo de uma forte desaceleração na China. A renúncia de Tsipras fará os gregos terem novas eleições, aumentando a incerteza econômica e política. Pelo menos, terão a chance de mudar ou de fortalecer o governo, como queiram. Será a sexta vez em oito anos que o país irá às urnas para escolher um primeiro-ministro.
Se o tempo fosse mais favorável, haveria muito a conversar com a Alemanha. Mas este é o momento de um governo enfraquecido no Brasil e sem capacidade de ação. O comércio entre Brasil e Alemanha foi favorável aos alemães em US$ 7,5 bilhões no ano passado. Exportamos US$ 6,6 bilhões e importamos US$ 13,8 bi. Até julho deste ano, o nosso déficit chega a US$ 3,1 bilhões. Nossos três principais produtos exportados aos alemães foram café, minério de cobre e soja. Com a plataforma de exportação que é a Alemanha, a conversa poderia ser sobre um tema que temos relegado: a integração nas cadeias globais de suprimento. Mas o Brasil, neste mês de agosto, anda assim: a cada dia basta a sua própria cota de eventos. A de ontem foi além da conta.
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