O rumor de que Henrique Meirelles, ex-presidente do BC, substituiria Joaquim Levy no Ministério da Fazenda agradou ao mercado e fez o dólar cair. O PT pressiona pela troca, mas a presidente Dilma resiste.
• Dilma resiste à pressão do PT por Henrique Meirelles
Duelo pela Fazenda
• Levy Reage em meio a rumores de que deixaria ministério. Dilma resiste ao nome de Meirelles
Martha Beck, Catarina Alencastro, Gabriela Valente, Eliane Oliveira, Simone Iglesias e João Sorima Neto - O Globo
BRASÍLIA e SÃO PAULO- Em meio a rumores de que a presidente Dilma Rousseff poderia trocar o comando do Ministério da Fazenda, o ministro Joaquim Levy acabou se envolvendo num duelo velado com o ex-presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, candidato de Lula e do PT para assumir a pasta. E o encontro entre os dois ocorreu justamente num evento de empresários, que, da plateia, mostraram seu favoritismo por Meirelles. Além do setor produtivo, também no mercado financeiro cresce uma espécie de torcida pelo nome de Meirelles para ocupar a Fazenda. Os rumores de uma substituição fizeram o dólar cair ontem. Meirelles atualmente é presidente do conselho da J&F Investimentos, holding que controla entre outras empresas a JBS.
Levy, que na véspera ouvira críticas de senadores da oposição e da base aliada num jantar oferecido pelo líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE), ontem acabou dividindo com Meirelles um mesmo painel no Encontro Nacional da Indústria (Enai). Levy, que trabalha para permanecer no cargo, defendeu o ajuste fiscal no evento dos empresários e fez questão de ressaltar que tem visões parecidas com as de Meirelles, indicando que uma troca no comando da Fazenda não mudaria a política econômica. Meirelles, contudo, ganhou pontos com o empresariado ao se manifestar contra a CPMF, defender o emprego e o crescimento.
Saída inevitável, mas não imediata
Fontes do Palácio do Planalto já admitem que a situação de Levy se deteriorou muito e consideram sua saída inevitável, mas não seria imediata, pois o ministro ainda teria como missão trabalhar pela aprovação da segunda etapa do ajuste fiscal no Congresso. Segundo fontes, a presidente Dilma não tem dado sinais de que irá substituí-lo antes desse prazo, mas cresce a pressão em torno do nome de Meirelles.
Ao discursar no encontro do Enai, Levy destacou que o primeiro passo para que a atividade econômica se recupere é o ajuste fiscal:
— A gente precisa de segurança fiscal. Ninguém vai colocar dinheiro se acha que a gente vai ter mais problema.
Já Meirelles, em discurso feito sob medida para agradar o setor produtivo e também o mercaLogo do, defendeu a necessidade do ajuste fiscal por meio do corte de gastos, mas disse que a CPMF “não é necessariamente um imposto positivo”, lembrando que existem diversas formas de tributação que são produtivas para a economia. Ele também ressaltou a importância de uma agenda para o crescimento e mostrou preocupação com o aumento do desemprego:
— Cada posto de trabalho perdido é gravíssimo — afirmou Meirelles.
Empresários que participaram do evento afirmaram ter preferido o discurso de Meirelles e disseram que, devido a sua experiência e passado político, preferiam vê-lo da Fazenda. O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Andrade, fez duras críticas à política conduzida por Levy. O dirigente fez questão de dizer que não defende a saída do ministro, mas disse que o empresariado não quer apenas o ajuste fiscal e sim medidas para a retomada do crescimento. Ele foi aplaudido quando criticou a recriação da CPMF, proposta considerada essencial pela equipe econômica para o reequilíbrio das contas públicas:
— Não tenho comentário algum contra o Joaquim Levy como ministro da Fazenda. (...) Mas o que nós precisamos hoje é de alguém que mostre que o Brasil tem uma política econômica suficientemente boa para permitir o crescimento do país. E isso nós não temos visto no Ministério da Fazenda — afirmou Andrade.
Desde cedo, o grande assunto do Enai foi o possível embate entre o atual e o possível futuro ministro da Fazenda. Levy, que deveria discursar pela manhã, comunicou que não poderia comparecer no horário previsto, porque tinha uma reunião com parlamentares da Comissão Mista de Orçamento. Com isso, sua participação teve que passar para a tarde e acabou coincidindo com a de Meirelles. Levy chegou na hora do almoço e acabou sendo convidado a sentar numa mesa com o ex-presidente do BC e Robson Andrade. Como não havia mais tempo para a palestra de Levy, Meirelles cedeu parte de seu tempo para que o ministro dissesse algumas palavras iniciais.no começo da fala, Levy destacou as afinidades com Meirelles.
— Temos afinidades de pensamento. Concordo com tudo o que ele vai dizer (Meirelles). Trabalhamos juntos — disse, se referindo ao tempo em que ocupava a secretaria do Tesouro e Meirelles chefiava o BC.
Perguntado se havia recebido algum convite para assumir a Fazenda, Meirelles disse que não recebeu nada “concreto”:
— Não há convite concreto e eu, como disse, não comento especulações, nenhum tipo de hipótese. Eu não sei o que as pessoas estão pensando ou decidindo.
Dilma é contra articulações
Meirelles disse que segue a vida normalmente e procura colaborar com todos os setores como teria feito com a palestra para a indústria. Questionado se faria algo diferente de Levy, ele se esquivou:
— Por causa desse barulho todo que está acontecendo, eu prefiro não responder. Uma postura adequada e correta é que eu evite comentários específicos.
Segundo fontes do governo, a presidente Dilma Rousseff não gosta das articulações em torno do nome de Meirelles e atribui, em conversas reservadas, esses movimentos ao próprio ex-presidente do BC. Assessores da presidente citaram as conversas com o mercado e as demonstrações de que ele seria o candidato de Lula como motivo de constrangimento. Outra crítica é em relação a notícias de que Meirelles estaria condicionando seu ingresso no governo a superpoderes.Um ministro atribuiu os boatos da saída de Levy ao próprio Meirelles:
— Marola. Meirelles fica espalhando boato para colar e Levy se desgastar e sair.
No encontro da indústria, Meirelles reagiu com tranquilidade a uma pergunta sobre a resistência da presidente Dilma ao seu nome. Disse que a relação com a presidente é boa e lembrou que trabalhou com Dilma quanto ela comandava a pasta de Minas e Energia e da Casa Civil.
— Sempre tivemos uma relação cordial e tranquila com convergência e divergências de ponto de vista, o que é normal.
Procurada, a assessoria de imprensa de Meirelles negou que ele esteja fazendo qualquer tipo de articulação política. Segundo a assessoria, Meirelles sempre tem e teve bons contatos com políticos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário