- O Estado de S. Paulo
A prisão do marqueteiro João Santana e de sua sócia virou termômetro do impeachment de Dilma Rousseff. Se de temporária ela virar preventiva, não significará apenas que as malas de mão levadas pelos detidos serão insuficientes para o período que permanecerão em Curitiba. Será sinal de que Sérgio Moro e os investigadores da Lava Jato acharam mais do que anunciaram.
Mais, até. Implicará que a frase enfatizada no documento que justificou a prisão e que foi repetida à exaustão pelo governo - de que os valores pagos pelos serviços do marqueteiro durante as campanhas eleitorais de Dilma, Lula e Fernando Haddad foram legais - era um despiste. Reforçará suspeitas de que Moro disfarça seu alvo porque ele está além de sua alçada como juiz.
Se, de fato, houver mais do que foi anunciado sobre os valores pagos a Santana, a hipótese de cassação de Dilma pelo Tribunal Superior Eleitoral ganhará força. As eventuais descobertas da Lava Jato devem ser anexadas aos processos contra a presidente, como já antecipou aquele ministro que costuma ser mais vocal fora dos autos do que dentro. Mas aí as coisas se turvam em vez de clarear. As implicações da cassação atingem o vice-presidente Michel Temer, o poder do PMDB e o eventual sucessor de Dilma.
O julgamento do TSE não é rápido nem definitivo. Seja qual for o veredicto, haverá recursos. Não é impossível que se arraste por seis, oito ou até dez meses. Enquanto isso, os políticos e o Congresso vão se mexer. Se sentirem que o TSE pende pela cassação da chapa Dilma/Temer, devem se antecipar para não perder o controle da sucessão.
Nesse cenário, o impeachment de Dilma pela Câmara deixará de ser uma possibilidade remota para se tornar uma probabilidade iminente. Ao PMDB interessará mais manter-se no poder, com Temer na Presidência, do que se arriscar numa eleição para a qual não tem candidato forte - o que aconteceria se a cassação da presidente e do vice ocorresse até 31 de dezembro, isto é, na primeira metade dos mandatos para os quais foram eleitos.
É um cenário que também abre possibilidades para os tucanos rivais de Aécio Neves. Com Lula batendo recordes de rejeição, todos acham que a próxima eleição presidencial será uma oportunidade única de vencer. Mas, se ela for antecipada - pela lei, ocorreria 90 dias após a vacância da Presidência -, será muito difícil para Geraldo Alckmin e José Serra tomarem a vez de Aécio. O mineiro aparece melhor do que ambos no Ibope.
Ou seja, a cassação de Dilma/Temer pelo TSE até 31 de dezembro interessa a Aécio, mas não necessariamente a todo o PSDB, muito menos à maioria do PMDB. Já o impeachment de Dilma pela Câmara manteria o calendário eleitoral para 2018 e daria chance aos outros tucanos de se viabilizarem, seja dentro do PSDB, seja em outra sigla. Para complicar ainda mais, há o fator Marina Silva.
A presidenciável da Rede mostrou viabilidade na pesquisa do Ibope sobre potencial de voto. Sua rejeição é a menor entre os seis nomes testados. No caso de uma eleição agora, sob o repúdio aos políticos tradicionais, ela pode tentar surfar a onda da renovação - e fazer da fragilidade do seu partido uma arma.
Tudo isso sem falar que, em caso de cassação de Dilma e Temer, quem assume por 90 dias é o presidente da Câmara. Hoje, Eduardo Cunha seria presidente da República por três meses se os ministros do TSE julgassem procedentes as denúncias da Lava Jato. Se ocorrer cassação só em 2017, aí a eleição é indireta e o novo presidente terá a legitimidade de quem foi eleito por deputados e senadores.
O resumo é que as consequências da Lava Jato são mais complexas do que aparentam. As investigações não acabarão com a crise nem levarão a um horizonte claro sobre seu fim. Por isso, nem só petistas anseiam por saber se Santana será liberado logo. Se não for, o jogo é outro.
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