• As despesas obrigatórias não param de subir
- Valor Econômico
Primeiro, o governo aumentou a despesa. Em seguida, propôs a criação de um limite para o gasto anual. Isto ocorreu na sexta-feira da semana passada, quando o governo elevou para 19,1% do Produto Interno Bruto (PIB) a despesa da União em 2016, de acordo com a programação orçamentária e financeira divulgada pelos ministros da Fazenda, Nelson Barbosa, e do Planejamento, Valdir Simão. É o nível mais alto, em proporção do PIB, da história do Brasil. Depois, foi apresentada a proposta de estabelecer um teto para o gasto, em proporção do PIB.
Em 2015, o gasto atingiu 19,4% do PIB, de acordo com os dados da Secretaria do Tesouro Nacional (STN), mas é preciso retirar deste total o pagamento de R$ 55,6 bilhões das chamadas "pedaladas fiscais" referente a despesas com subsídios em exercícios anteriores. Por determinação do Tribunal de Contas da União (TCU), o governo foi obrigado a quitar esses passivos, o que elevou de forma atípica a despesa de 2015. Com a exclusão do pagamento das "pedaladas" referentes a anos anteriores, o gasto em 2015 cai para 18,6% do PIB.
A despesa vai aumentar em 2016, em proporção do PIB, por dois motivos. Primeiro, o próprio PIB encolherá com a continuidade da recessão. O governo estima que haverá uma queda real de 2,9% do PIB neste ano. A expectativa do mercado é maior, de 3,4%, de acordo com o último boletim Focus, editado pelo Banco Central. Em segundo lugar, a despesa poderá crescer em termos reais. Como o governo trabalha com taxa de inflação de 7,1%, medida pelo IPCA, o aumento projetado da despesa é de 0,82%, em termos reais. O mercado, por sua vez, já trabalha com inflação de 7,6%. Em valores nominais, a despesa crescerá R$ 87,32 bilhões em comparação com 2015.
A rigor, a despesa de 2016 é ainda maior que a de 2015 por causa de uma compensação que a legislação em vigor manda o Tesouro fazer à Previdência Social, em virtude da perda de receita que ela tem com a desoneração da folha de pagamento. Essa compensação, no entanto, não representa uma despesa efetiva da União, assim como não significa uma receita genuína da Previdência, pois é dinheiro que já ingressou nos cofres do Tesouro. Os registros contábeis se anulam, não tendo impacto sobre o resultado primário, mas terminam afetando as estatísticas do Tesouro sobre a receita e a despesa da União.
Em 2015, a compensação foi de R$ 25,4 bilhões, enquanto que em 2016, ela deve cair para R$ 18,5 bilhões. A redução do valor da compensação para este ano dá uma falsa ideia de que houve uma diminuição da despesa primária da União, o que efetivamente não aconteceu.
É preciso abrir também um parêntese. A despesa total da União em 2016 ficará um pouco menor em virtude de uma mudança que será feita no pagamento dos precatórios federais. O governo considerou, como receita deste ano, os pagamentos de precatórios feitos pela União em anos anteriores, depositados na rede bancária, mas que não foram sacados pelos respectivos beneficiários há mais de quatro anos. O governo estimou que o mesmo percentual dos pagamentos de precatórios não sacado se repetirá neste ano. Desta forma, chegou ao valor de R$ 12 bilhões que foi considerado como receita. Não está claro qual será a redução do gasto da União com o pagamento de precatórios nos próximos anos, com a nova fórmula. A mudança ainda terá que ser aprovada pelo Congresso.
O nível de 19,1% do PIB para a despesa da União é muito superior à média registrada nos cinco primeiros anos de governo da presidente Dilma Rousseff, que foi de 17,45% do PIB. É muito superior também à média registrada no primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que foi de 15,83% do PIB. No segundo mandato, Lula elevou as despesas para uma média de 16,97% do PIB - em seu último ano, o ex-presidente pisou fundo no acelerador do gasto, que atingiu 18,02% do PIB, de acordo com os dados da STN.
A decisão do governo de apresentar uma proposta fixando um limite para o gasto anual da União em proporção do PIB merece ser elogiada, pois representa um avanço em relação às posições defendidas até agora pela ex-presidente Dilma Rousseff. Ainda está viva na memória de todos a setença de "rudimentar", que ela proferiu, em 2005, em relação ao plano apresentado pelos ex-ministros da Fazenda Antonio Palocci e do Planejamento Paulo Bernardo de limite para o crescimento das despesas da União. Para justificar sua posição, Dilma, que ocupava o cargo de ministra da Casa Civil, disse que "gasto é vida". Agora, a presidente mostra que está pensando de maneira diferente e quer um teto para a despesa.
O governo não anunciou qual será o limite para o gasto que irá propor, mas o ministro Nelson Barbosa já adiantou que o teto precisa ser inferior aos 19,1% deste ano, pois, com esse nível de gasto, segundo ele, a atual receita disponível não garantirá um resultado primário suficiente para estabilizar a dívida pública em proporção do PIB.
O problema é que as despesas que estão crescendo neste ano são as obrigatórias, principalmente os benefícios previdenciários, de assistência social e o abono e o seguro-desemprego. Há um crescimento vegetativo desses gastos, representado pelo aumento líquido anual dos benefícios concedidos, que não pode ser reduzido sem mudanças nas suas atuais regras, algumas delas definidas pela Constituição. Sem alteração das regras, o teto para o gasto será apenas a promessa de algo que não pode ser entregue.
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