Por Sérgio Lamucci – Valor Econômico
SÃO PAULO - A resistência da inflação de serviços, em meio à forte e duradoura recessão vivida pelo país, foi apontada pelo Banco Central (BC) como um dos fatores que impedem o Comitê de Política Monetária (Copom) de reduzir de maneira mais rápida a taxa básica de juros (Selic). Na quarta-feira, o comitê cortou a Selic de 14,25% para 14% ao ano e, ontem, o mercado entendeu que o ritmo continuará lento graças à preocupação demonstrada pelo BC com os preços dos serviços.
Na primeira metade do ano, a inflação de serviços teve uma queda razoável, de 8,2% nos 12 meses até dezembro para 7,1% nos 12 meses até junho. Apesar disso, ficou muito acima da meta de 4,5%. Desde então, subiu em agosto para 7,5% e, em setembro, recuou para 7,1%, fato que chamou a atenção do Banco Central.
No biênio 2015/16, a contração do Produto Interno Bruto (PIB) pode ficar em torno de 7%, com recuo da renda per capita no mesmo período superior a 8%. Este cenário está tendo um efeito devastador no mercado de trabalho. No trimestre de junho a agosto, a taxa de desemprego, calculada pela Pesquisa Nacional Domiciliar do IBGE, ficou em 11,8%, muito acima dos 8,7% do mesmo período do ano anterior.
Diante desses dados, o fato de os preços dos serviços mostrarem forte resistência intriga os economistas. Uma possível explicação estaria no comportamento da renda real. No trimestre encerrado em agosto, o rendimento médio caiu 1,7%, já descontada a inflação, de acordo com o IBGE. É uma queda moderada, considerando-se o forte recuo tanto da atividade econômica quanto do emprego.
Um fator que, segundo analistas, torna mais difícil e lenta a contenção dos preços dos serviços é a inércia, fenômeno pelo qual a inflação passada alimenta a futura, numa economia com grau elevado de indexação como a brasileira. Neste ano, a chamada inflação subjacente de serviços, que exclui do cálculo itens mais voláteis, como as passagens aéreas, recuou de 9,4% no fim de 2015 para 6,9% nos 12 meses até setembro deste ano. No entanto, houve leve alta mensal de agosto para setembro, quando subiu de 0,4% para 0,42%, e deve continuar subindo neste mês.
Resistência da inflação de serviços influencia BC
O comportamento dos preços de serviços é fundamental para entender a cautela do Banco Central (BC) ao iniciar o ciclo de redução dos juros com um corte de 0,25 ponto percentual, e não de 0,5 ponto. Na primeira metade do ano, a inflação desse grupo caiu de 8,2% para 7,1% no acumulado em 12 meses, uma queda razoável para um período de seis meses, mas depois parou de ceder.
Ela chegou até mesmo a subir para 7,5% em agosto nessa base de comparação, recuando novamente para 7,1% em setembro. No mês passado, os serviços mostraram um resultado mais favorável, com variação de 0,33%, abaixo do 0,59% do mês anterior, segundo a LCA Consultores.
A queda relativamente moderada da renda, mesmo num cenário de forte contração da economia, contribui para explicar a resistência da inflação, segundo analistas. No trimestre de junho a agosto, o rendimento médio caiu 1,7%, descontada a inflação, em relação ao mesmo período do ano passado, de acordo com o IBGE. Também tem peso aí a inércia, o fenômeno pelo qual a inflação passada alimenta a futura, numa economia com grau elevado de indexação. Com a influência desses fatores, a inflação demora a cair, apesar de uma retração do PIB estimada em cerca de 7% no acumulado de 2015 e 2016 e de um forte salto no desemprego. No período de junho a agosto, a desocupação ficou em 11,8%, bem em acima dos 8,7% do mesmo intervalo de 2015.
Neste ano, a chamada inflação subjacente de serviços, que exclui quatro grupos de itens mais voláteis, está em queda mais forte no acumulado em 12 meses, recuando de 9,4% no fim de 2015 para 6,9% em setembro deste ano. No entanto, houve leve alta de agosto para o mês passado, de 0,4% para 0,42%. Em outubro, deve avançar 0,53%, segundo estimativas do economista Fabio Romão, da LCA.
Apresentado pelo BC no relatório de inflação de setembro, essa medida tem como objetivo identificar melhor a tendência das cotações de serviços, eliminando os itens que podem dificultar esse processo: os grupos de turismo (passagem aérea, hotel e excursão), serviços domésticos, cursos e comunicação.
Nas contas de Romão, essa inflação subjacente de serviços em 12 meses deverá seguir em baixa, mas terá um processo mais lento de queda daqui para a frente. Deve terminar 2016 em 6,8% e 2016 em 6,2%. Para o grupo original de serviços, o recuo será parecido, fechando este ano em 7% e o próximo em 6,3%.
Coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper, o economista Naercio Menezes tem ressaltado que o salário real (descontada a inflação) tem caído menos agora do que em outros episódios de contração mais forte da atividade. Em 1999 e 2003, por exemplo, o rendimento real teve recuos na casa de 7% a 8%. Na visão de Naercio, o salário cai menos na atual recessão porque uma parcela maior dos trabalhadores tem vencimentos próximos ao salário mínimo, devido à adoção da regra do reajuste do piso em 2007. Por ela, o mínimo é corrigido pela inflação do ano anterior, acrescido da variação do PIB de dois anos antes. Com isso, o piso teve aumentos bem maiores do que o salário médio.
Romão, por sua vez, avalia que o aumento da formalização no mercado de trabalho na última década também contribui para a queda menor da renda, mesmo num ambiente recessivo. Hoje, há mais trabalhadores favorecidos pelos dissídios salariais que ocorrem anualmente.
Em relatório, o economista-chefe do Itaú Unibanco, Mario Mesquita, diz acreditar que "a evolução dos dados e das notícias" vai permitir um corte de 0,5 ponto na próxima reunião do Copom, marcada para o fim de novembro. No entanto, ele admite que o tom do comunicado do BC, "principalmente em relação ao comportamento da inflação de serviços", sugere que a probabilidade de mais um corte de 0,25 ponto tenha aumentado".
Para Romão, a trajetória da inflação de serviços subjacente não abre espaço para uma redução agressiva da taxa Selic. Como ocorre desde meados de 2008, diz ele, essa medida deve continuar acima de 6% - o teto da banda de tolerância da meta de inflação de 2017.
Além disso, haverá uma recuperação gradual da demanda, lembra ele. Nesse cenário, Romão avalia que o BC deverá promover um "ajuste cauteloso das condições monetárias" ao longo dos próximos dois anos, apostando que não haverá cortes agressivos dos juros. A LCA espera que a taxa Selic, atualmente em 14% ao ano, terminará 2017 em 11,75%. Alguns economistas são mais otimistas, prevendo que o BC cortará a Selic para 10% ou até menos no ano que vem, por acreditarem que a grande ociosidade na economia e a piora adicional do mercado de trabalho vão derrubar a inflação.
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