A forte queda do consumo das famílias teve impacto fulminante no recuo da economia em 2016. Em consequência da desaceleração do nível de atividades, do encolhimento do mercado de trabalho e do endividamento elevado, as famílias apertaram os cintos e reduziram o consumo em 4,2% no ano passado. Como as despesas das famílias representam 64% do Produto Interno Bruto (PIB) pelo lado da demanda, três vezes mais do que os 20,2% do consumo do governo, acima dos 15,4% dos investimentos e dos 12,5% das exportações, sua queda contribuiu bastante para derrubar o PIB em 3,6%. O mesmo já tinha acontecido no ano anterior, quando o consumo das famílias encolheu 3,9% e o PIB perdeu 3,8%. Em dois anos, as despesas das famílias foram reduzidas em 8,3% e voltaram aos níveis de 2011.
Um dos principais fatores que levou as famílias a reduzirem os gastos foi o salto no corte das vagas no mercado de trabalho. Apenas no trimestre terminado em janeiro, 879 mil pessoas perderam o emprego e a população desocupada cresceu 7,3% em relação ao trimestre anterior, de agosto a outubro, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua. Em comparação com o mesmo trimestre do ano anterior, a população desocupada saltou 34,3%, o equivalente a 3,3 milhões de pessoas. Existem 12,9 milhões de desempregados atualmente.
O esforço das famílias para reduzir o endividamento foi outro fator que tolheu o consumo. Ao longo do ano passado, o crédito se tornou mais caro e difícil de obter. O saldo das operações com pessoas físicas aumentou 1,2% nominal, não repondo nem a taxa de juros que, seguindo o parâmetro da Selic média subiu de 13,3% para 14,1% entre 2015 e 2016. Em janeiro, o saldo total do crédito era equivalente a 48,7% do PIB, bem abaixo dos 53,2% do mesmo mês de 2016. Depois de ter atingido quase 45% da renda líquida anualizada das famílias, o endividamento diminuiu para o equivalente a 42,2% ao final do ano passado. Excluindo o crédito habitacional, correspondia a 23,62%, depois de ter chegado a 25,75% em 2007.
Um outro indicador que ajuda a explicar a queda do consumo das famílias é a diminuição do PIB per capita, em que o crescimento da população potencializa a queda de renda em um cenário de economia em retração. O PIB per capita cresceu continuamente de 2001 a 2012 e começou a cair em 2013. Mas foi em 2014 que ficou no negativo, último ano em que o PIB ainda cresceu, 0,5%, mas não o suficiente para fazer frente ao aumento da população, que se dá ao ritmo de 0,9% por ano. Em 2015, o PIB per capita recuou 4,6%; e, no ano passado, 4,4%. No acumulado desses três anos, a queda chega a 9,1% e marca um retrocesso para o patamar de 2008.
A perspectiva é que o PIB per capita vai cair novamente neste ano e se recuperar apenas em 2018, quando o crescimento econômico deve voltar a superar o da população. O mercado de trabalho, embora possa estar abrindo algumas vagas em determinados segmentos, só deve apresentar uma reação mais disseminada a partir do segundo semestre, provavelmente nas áreas de varejo e serviços, embora em ritmo bem distante do necessário para a reposição dos milhões de vagas perdidas.
Mas há outros sinais que indicam que o consumo das famílias pode voltar a crescer. Um dos impulsos para isso é certamente a liberação dos recursos das contas inativas do FGTS, que deve resultar na injeção de R$ 43,6 bilhões e beneficiar 30 milhões de pessoas. Os recursos vão impulsionar a economia à medida que as pessoas poderão quitar dívidas antigas e abrir espaço para novas operações, consumir ou investir. O Ministério do Planejamento estima que o saque do FGTS vai ter impacto positivo de 0,48 ponto no PIB deste ano. (Valor 13/3).
Outro fator que pode abrir espaço para a recuperação do consumo é a massa de rendimentos, que vem caindo menos. A massa de renda real das famílias, calculada pela soma da renda do trabalho e benefícios previdenciários, diminuiu 3,2% entre 2015 e 2016 - um ponto a menos do que o consumo das famílias. Desde 2014, quando o consumo das famílias recuou 8,2%, a massa de rendimentos caiu 6,4% (Valor 10/3). Em contexto de recessão e aumento do desemprego, as famílias passaram a poupar mais para pagar dívidas. À medida que a economia exibir sinais de reação, a postura meramente defensiva das famílias pode ser revertida e dar um alento ao consumo.
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