O primeiro Relatório de Inflação do Banco Central do ano deixou claro que a queda da inflação observada permite uma "intensificação moderada" do ritmo de redução dos juros em relação à realizada nas duas últimas reuniões do Comitê de Política Monetária, isto é, um corte de 1 ponto percentual. Em qualquer dos quatro cenários apresentados pelo BC, o IPCA ficará abaixo da meta de 4,5% no fim do ano.
O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, afirmou que poderá revisar as metas para os próximos dois anos, a de 2018, já dada, de 4,5% e a de 2019, que terá de ser fixada pelo Conselho Monetário Nacional até junho. Após ruídos na comunicação oficial, o governo descartou a possibilidade de mexer no objetivo de 2018 - que só pode ser feita mediante autorização do presidente da República. Mas a chance de que isso ocorra para a inflação de 2019 continua de pé.
O BC já tem a inflação de 2018 no radar, dado que as ações da política monetária tendem a estender seus efeitos por cerca de dois anos. E suas projeções consideram também o IPCA nos quatro trimestres encerrados no primeiro trimestre de 2019. A partir deles pode-se especular sobre a viabilidade e a conveniência de apertar um pouco a meta de inflação, reduzindo-a para 4,25%, por exemplo, o número mais provável.
Com os dados amplamente favoráveis de hoje, e uma inflação ancorada, os dois cenários mais favoráveis à redução do centro da meta são os dois menos utilizados pelo BC. Se os juros permanecerem em 12,25% ao ano e o câmbio ficar constante (R$ 3,10), a inflação estaria correndo a 4,1% no início de 2019. Esse número seria um pouco maior, de 4,23%, se os juros fossem constantes, mas o câmbio variasse de acordo com a pesquisa Focus.
Nos dois outros cenários, o IPCA permaneceria ligeiramente acima da nova meta, mas muito perto dela e dentro da margem de tolerância. O cenário que considera o dos analistas privados, com Selic a 9% em 2017, 8,5% em 2018 e 2019, e câmbio de R$ 3,28 e R$ 3,40 (2018), a inflação projetada é de 4,6%. No que considera as mesmas taxas de juros com o câmbio constante (R$ 3,10), chega-se a 4,4%.
A redução da meta é, nestas condições factível, mas sugere que há um preço a pagar. A taxa de juros estacionaria em 8,5% a partir do ano que vem, pressupondo um juro real em torno de 4,5%, tido como piso para a política monetária ou, com alguma aproximação, seria essa a taxa de juro real neutra, a que mantém a inflação constante possibilita o crescimento da economia perto de seu potencial.
Do ponto de vista da atividade, porém, pode se tornar conveniente cortar os juros abaixo dos 8,5%. Observando a trajetória do juro real ex-post (a taxa efetiva de juros acumulada nos últimos doze meses), nota-se que ele chegou a potentes 8,8% no fim do ano, enquanto que o juro real ex-ante (expectativa de juros descontada a expectativa de inflação em 12 meses) ele é de 4,7% e já está próximo do limiar de 4,5%, considerado a taxa neutra real longa.
Mas assim como os juros podem ser muito altos para debelar uma inflação crítica, podem cair abaixo da taxa neutra de longo prazo para auxiliar na reanimação da economia. A condição essencial é que a inflação esteja ancorada. Na gestão anterior, o juro real caiu abaixo de 2% e a Selic caiu a 7,25%, quando a inflação era ascendente e os gastos públicos disparavam.
Vale a pena perder certa flexibilidade para obter uma meta 0,25 ponto percentual menor, para vigorar em um período no qual, conforme o resultado das eleições presidenciais, a própria equipe do BC não estará mais lá? Grande parte dos economistas argumenta que a meta está em 4,5% há 12 anos e que a margem de tolerância é alta. E também que a função do sistema de metas é derrubar a inflação. Ao reduzir a meta, as expectativas do comportamento dos preços futuros se adequarão a ela e os juros, mais para a frente tornarão a cair, em um círculo virtuoso.
Vantagens e desvantagens dependem do comportamento da economia. Depois de uma recessão histórica, da qual a economia ainda sai vacilante e com perspectiva lenta de recuperação, não se pode descartar ousadia temporária e criteriosa na redução dos juros. A redução da meta tende a inibir essa possibilidade. Diante do descontrole inflacionário recente, de anos a fio abusando do intervalo de tolerância, o melhor trabalho que poderia ser feito já está sendo feito pelo BC - recuperar a credibilidade do sistema e a da própria autoridade monetária.
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