Para as autoridades, restrição no contato com detentos inibirá os ‘pombos correio’
A invasão da Favela da Rocinha por cerca de cem bandidos, na madrugada de 17 de setembro, e o caos que a ação provocou na cidade, com mortes, tiroteios, vias interditadas e fechamento de comércio, escolas e postos de saúde, chamaram a atenção para um problema que costuma ser neglicenciado. A ordem para tomar o morro partiu do traficante Antônio Francisco Bonfim Lopes, o Nem da Rocinha, que cumpre pena no presídio federal de Porto Velho, em Rondônia, distante mais de três mil quilômetros do Rio. De sua cela, numa penitenciária supostamente de segurança máxima, Nem teria arquitetado o plano para derrubar o ex-aliado Rogério Avelino da Silva, o Rogério 157, que controla o rentável comércio de drogas numa das mais populosas favelas do Rio.
Por mais surpreendente que pareça, esse telecomando do crime não chega a ser novidade nas penitenciárias brasileiras. Do mesmo presídio federal de Porto Velho, o traficante Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, controlava seus “negócios” — que incluem o tráfico de drogas, máquinas caça-níqueis e até taxas sobre a venda de gás — em comunidades de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. Em maio deste ano, a Polícia Federal descobriu que o bandido tinha um esquema para driblar a segurança e se comunicar com advogados e parentes. Ele repassava bilhetes ao vizinho de cela, que, por sua vez, os entregava à mulher durante as visitas. As mensagens eram então levadas a uma digitadora que as enviava por celular aos integrantes da quadrilha. Após o escândalo vir à tona, Beira-Mar foi transferido para o presídio de Mossoró, no Rio Grande do Norte.
Não é por acaso que o governo federal planeja instalar parlatórios em todas as penitenciárias do país, de modo que o contato com os presos seja feito somente por telefone, e através de um vidro, sendo as conversas gravadas e monitoradas em tempo real. Nos quatro presídios federais (Porto Velho, Mossoró, Campo Grande e Catanduvas), o sistema já funciona para advogados, mas parentes ainda têm livre acesso aos presos. Para as autoridades, um maior controle no acesso aos detentos dificultará a ação dos chamados pombos-correio. Um dos defensores da proposta, o ministro da Defesa, Raul Jungmann, argumenta que as penitenciárias brasileiras se transformaram em home office das facções criminosas.
A preocupação não é sem motivo. Em novembro do ano passado, uma ação da Polícia Civil e do Ministério Público de São Paulo levou à prisão de mais de 30 advogados acusados de envolvimento com o Primeiro Comando da Capital (PCC), maior facção criminosa do país. Segundo as investigações, eles serviam de intermediários entre os presos e membros das quadrilhas em liberdade.
Se nada for feito para controlar o acesso aos presos nas penitenciárias, bandidos continuarão a exercer suas atividades criminosas de dentro de suas celas. Eles são os maiores interessados em que continue tudo como está.
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