O relatório da missão de assistência técnica do Fundo Monetário Internacional (FMI), que esteve no Brasil em março deste ano a convite do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, dá uma dimensão do imenso desafio que este e o próximo governo terão para reequilibrar as contas públicas brasileiras. A missão fez 18 recomendações, algumas devendo ser colocadas em prática a partir deste ano para que o teto de gastos da União, instituído pela emenda constitucional 95, consiga ficar de pé.
Em primeiro lugar, é preciso observar que o governo brasileiro não precisa seguir à risca as recomendações do corpo técnico do FMI, pois o Brasil não está submetido a nenhum programa de socorro do Fundo. Mas os técnicos fizeram, depois de exaustivas consultas a autoridades de várias áreas do governo, um roteiro útil para evitar um desastre fiscal de grandes proporções nos próximos anos.
Dois dados mostram com clareza a dimensão da crise fiscal vivida pela nação. Em 2016, as despesas obrigatórias da União corresponderam a 101,3% da receita líquida, de acordo com dados do Tesouro Nacional. Essa tendência vai se intensificar neste ano, quando elas corresponderão a 104% da receita líquida.
Isto significa que, mesmo se as chamadas despesas discricionárias (investimentos, gastos com custeio da máquina, etc.) fossem a zero - o que levaria a uma paralisação completa do Estado brasileiro - ainda assim o resultado primário do governo central (Tesouro, Previdência e Banco Central) seria deficitário.
Outro dado é a projeção feita pela economista Vilma Pinto, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da Fundação Getulio Vargas, de que o espaço para as despesas discricionárias será zerado já em 2021, mesmo que seja aprovada a idade mínima para requerer aposentadoria, que a correção do salário mínimo daqui para frente seja feita apenas pela inflação e que os gastos com a saúde e com a educação também acompanhem a inflação.
O rompimento do teto de gasto está, portanto, no horizonte de médio prazo. Para mantê-lo em pé, é necessário agir com tempestividade, com método e persistência. A missão técnica do FMI observou, em seu relatório, que o sucesso na implementação do teto exige mudanças estruturais, institucionais e processuais. Ela fez recomendações de curto e médio prazo e um plano de ação.
Os técnicos propuseram ampliar a flexibilidade do Orçamento, reforçar a gestão fiscal e orçamentária de médio prazo e mudar os procedimentos para a implementação, divulgação e monitoramento do teto. Para eles, a implementação do teto exige o apoio de um quadro fiscal de médio prazo, que pressupõe o fortalecimento das projeções macrofiscais, a formulação clara de uma estratégia de médio prazo, a definição dos principais objetivos fiscais e a incorporação desses elementos à elaboração do Orçamento.
Neste ano, a missão do Fundo considera que o governo deve iniciar o exame das despesas obrigatórias e das práticas de indexação. Fixar metas de economia e iniciar revisões de despesas em três ministérios. Ao mesmo tempo, começar a rever as renúncias de receitas e pesquisar o uso de dividendos de eficiência, entre outras providências.
Para 2018, os técnicos sugerem que o governo procure promulgar leis e normas para remover a indexação dos gastos e estenda as metas de economia e revisão de despesas a outros cinco ministérios a cada ano. Além disso, deve promulgar leis e normas com base nos resultados das diferentes revisões das despesas e das renúncias de receitas.
Outra proposta é que seja criado um Comitê Ministerial para Assuntos Fiscais, que seria integrado pelo ministro da Fazenda, o ministro do Planejamento e o chefe da Casa Civil. O Comitê passaria a definir, de comum acordo, as metas para o resultado primário e para o teto dos gastos, a estratégia fiscal de médio prazo, as prioridades do Orçamento e os limites de despesa para os ministérios, além de assegurar a comunicação eficaz e tempestiva da estratégia fiscal do governo.
Espera-se que o governo esteja avaliando as sugestões, mas a decisão de adotar as medidas de ajuste das contas do próximo ano somente após a decisão da Câmara dos Deputados sobre o prosseguimento da denúncia contra o presidente Michel Temer é um péssimo sinal.
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