Concluir a apreciação do processo que descriminaliza o usuário pode ajudar a conter pressões no governo para insistir-se em políticas baseadas na repressão
A questão da política sobre drogas parecia ter entrado no prumo, com a lei 11.343, de 2006, que tomou a direção certa de proteger o usuário e concentrar a repressão no traficante. Mas não passou de um engano, porque a falta de parâmetros objetivos para definir o viciado manteve sem solução o problema do encarceramento de pessoas que precisam de cuidado médico e não de penitenciária.
Este é um tema da agenda mundial. No Brasil, conquistado o avanço conceitual da Lei de Drogas, ainda falta a definição destes critérios, para separar o usuário do traficante.
Neste aspecto, ajudará bastante o Supremo Tribunal retomar o julgamento da constitucionalidade ou não da punição do usuário, suspenso por um pedido de vista do ministro Teori Zavascki. Com a morte de Teori, Alexandre de Moraes o substituiu, e cabe a ele liberar o processo, sobre o qual já foram proferidos três votos pela descriminalização do consumo de drogas — Gilmar Mendes, Edson Fachin e Luís Roberto Barroso.
Este propõe que se estabeleça como limite a posse da quantidade máxima de 25 gramas de maconha para definir o usuário da droga. Gilmar, por sua vez, defende não se criminalizar a posse de qualquer substância.
O ministro Alexandre de Moares, ex-secretário de Segurança de São Paulo, e que já criticou a prisão de usuários, tem experiência para contribuir neste julgamento. O importante é liberar o processo para ele voltar a tramitar.
Os críticos da política de drogas apenas repressiva alertam para a prisão indiscriminada de usuários que, na cadeia, passam a conviver com traficantes já formados e se convertem ao crime.
A Lei de Drogas, ao mesmo tempo em que adotou o princípio da descriminalização do consumo, agravou as penas para traficantes. Mas, sem a definição formal de usuário, para efeito de aplicação da legislação, as prisões indiscriminadas decorrentes de drogas aumentaram bastante.
Documento da Human Rights Watch aponta que, em 2005, 9% da população carcerária respondiam por crimes relacionados a drogas. Em 2014, já eram 28%. Afirma-se que a grande maiores deles foi apanhada com pequenas quantidade de drogas, que não justificariam a prisão.
Os 25 gramas de posse de maconha propostos por Barroso, para separar o usuário do traficante, são adotados em Portugal, exemplo de êxito na aplicação de uma política de descriminalização.
Mas, a depender do ministro da Justiça, Torquato Jardim, que disse ao GLOBO ser contra a descriminalização, o impasse continuará. A conclusão do julgamento no Supremo, porém, em que se espera que os três votos já apresentados sejam seguidos por mais ministros, servirá para que a agenda de uma política mais inteligente de enfrentamento das drogas se imponha.
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