quinta-feira, 11 de junho de 2020

Ascânio Seleme - Impávidos que nem Muhammad Ali

- O Globo

Vale relembrar as melhores frases dele neste momento

O maior boxeador de todos os tempos seria bem-vindo nestes dias em que se tenta descontaminar o planeta do ódio e do racismo. Mesmo ausente, sua memória vive, e não apenas nos ringues onde era o rei, mas também no debate da questão que mobiliza o planeta. Muhammad Ali sempre teve uma posição incontestável sobre o racismo. Foi ultrajado muitas vezes por isso, mas nunca abandonou seu discurso em favor da igualdade racial. Em 2005, 11 anos antes de morrer, ganhou do então presidente George W. Bush a Medalha Presidencial da Liberdade.

Vale relembrar as melhores frases de Muhammad Ali, mas antes é preciso salientar sua capacidade de convencimento. Seus argumentos eram sólidos, e sua capacidade de atrair pessoas, indiscutível. No dia 4 de junho de 1967, quando Ali recusou-se a integrar as Forças Armadas apesar de ter sido convocado, 11 dos mais renomados desportistas negros dos Estados Unidos, ídolos do futebol americano, do basquete e do beisebol, se reuniram com ele para demovê-lo da decisão. O encontro conhecido como “Ali Summit” durou quatro horas. Ao seu final, os atletas saíram apoiando o boxeador.

Ali não serviu alegando motivações religiosas, já que pouco antes ele tinha se declarado muçulmano. Mas essa foi a saída política que encontrou para um conflito interno. Na verdade, aos seu amigos dizia que não iria para a Guerra do Vietnã, que estava no auge da sua escalada sob a presidência de Lyndon Johnson, porque “não se sacrificaria por um país que o segregava racialmente”. Ali perdeu o cinturão de campeão e foi afastado do boxe. Nos dois anos que se seguiram ao “Ali Summit”, todos os atletas que o apoiaram foram afastados de seus times, de suas ligas e alguns banidos do esporte. O que se queria dizer era que o esporte nos EUA tinha donos, e eles eram brancos.

Em homenagem a George Floyd e a todos os manifestantes que impávidos que nem Muhammad Ali mobilizaram o mundo nas últimas duas semanas, seguem os melhores momentos do grande lutador.

“Negros têm sofrido lavagem cerebral. Roubaram nossos nomes, roubaram nossa cultura, roubaram nossas verdades, roubaram nossa história”.

“Com a medalha de ouro dos Jogos Olímpicos no peito, fui a um restaurante no centro da minha cidade natal. O atendente falou para mim: ‘Não servimos negros’. Eu respondi que também não os comia e pedi um cachorro quente. Não me serviram e tive que sair do restaurante”.

“Numa igreja, olhando imagens santas, perguntei para a minha mãe: ‘Por que Jesus é branco, loiro e de olhos azuis? Por que na Última Ceia só tem homens brancos? Perguntei para a minha mãe se iríamos para o céu quando morrêssemos, ela respondeu que sim. Perguntei então por que não havia anjos negros na igreja. Só aí me dei conta de que se os brancos também vão para o céu, então os negros estarão na cozinha preparando o jantar”.

“Tarzan é o rei da floresta na África, mas ele é branco. Ele bate nos negros locais, quebra queixo de leões com um soco e fala com os animais. E os africanos que vivem lá há séculos não conseguem falar com os bichos”.

“O melhor sabão é o que lava mais branco, o presidente vive na Casa Branca, o patinho feio é preto, Papai Noel é branco, gato preto dá azar, o bolo do anjo é de creme, o bolo do diabo é de chocolate. É evidente que alguma coisa está errada aqui”.

“Malcolm X disse coisas corajosas, não tinha medo de nada. Mas isso não o torna um grande homem negro, o torna um grande homem”.

“Quem foi linchado? Fomos nós que queimamos cruzes? Fomos nós que cobrimos de óleo e penas, batemos com paus, violentamos e enforcamos pessoas? Nós escravizamos povos? Quem foi escravizado por 400 anos? O que foi que fizemos para que os americanos brancos agora digam que nós os odiamos?”.

“Sou feliz porque sou livre. Eu marquei minha posição. Todos os negros terão de fazer o mesmo, mais cedo ou mais tarde”.

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