Caberá agora ao Senado não referendar as decisões, mantendo as proibições previstas na LC 173
Com o apoio de todos os líderes políticos, o Senado e a Câmara aprovaram uma ajuda de R$ 60,15 bilhões da União aos Estados e municípios, como forma de compensar a queda de receita que eles teriam com a recessão econômica provocada pela pandemia da covid-19. Além disso, os governos estaduais e as prefeituras foram beneficiados com a suspensão dos pagamentos de suas dívidas com a União e puderam também reestruturar as suas operações de crédito interno e externo junto ao sistema financeiro e a instituições multilaterais de crédito.
O pacote de ajuda custou caro aos cofres públicos, mas foi necessário em um momento de grave crise sanitária no país e no mundo. Ao aprovar a lei complementar 173, que autorizou o auxílio financeiro, o Parlamento procurou evitar que os recursos repassados pelo Tesouro fossem desviados para outras finalidades, que não o combate à covid-19.
Procurou também olhar para o futuro, para o pós-pandemia, uma vez que é preciso ajustar as contas públicas depois de gastos tão vultuosos. De janeiro a julho deste ano, o déficit primário do governo central (Tesouro, Previdência e Banco Central ficou em R$ 505,187 bilhões.
Por isso, a lei complementar 173 estabeleceu que a União, os Estados e os municípios não podem conceder aumento salarial ou qualquer outro tipo de vantagem aos servidores até 31 de dezembro de 2021. A proibição foi estendida à criação de cargos, alteração de estrutura de carreira, contratação de pessoal, realização de concurso público e criação de qualquer despesa obrigatória de caráter continuado.
O Senado chegou a derrubar um veto do presidente Jair Bolsonaro a um dispositivo da lei que autorizava aumentos para os servidores diretamente envolvidos no combate à covid-19. Uma grande articulação de líderes políticos manteve o veto, quando ele foi votado na Câmara dos Deputados. Agora, no entanto, é o Senado que pode colocar um freio no destempero dos deputados.
Desconhecendo as proibições da LC 173, os deputados aprovaram, na semana passada, dois projetos que aumentam as despesas do Judiciário com pessoal. Um deles autoriza a criação do Tribunal Regional Federal da 6ª Região. Outro permite a transformação de cargos vagos de juiz substituto em cargos de juiz efetivo dos Tribunais Regionais Federais.
Em nenhum dos dois casos, houve cumprimento dos dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF, que manda que o ato que autoriza a criação ou aumento da despesa seja acompanhado de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subsequentes, e mostre como os efeitos financeiros da medida serão compensados, seja com a elevação da receita ou a redução de outro gasto.
Agora, a Câmara deverá votar outro projeto de lei, que cria, no âmbito do Ministério Público Federal, 111 cargos, sendo 18 de procuradores regionais da República, 39 técnicos, 18 analistas, 18 comissionados e 18 funções de confiança. Segundo a justificativa do projeto, a criação do TRF-6 demanda a criação de estrutura correlata no Ministério Público Federal.
Os três projetos foram apresentados no fim do ano passado e estavam parados. O que impressiona é que eles começaram a andar justamente depois que a LC 173 foi aprovada. Ou seja, depois da legislação que proíbe expressamente a criação de novas despesas até 31 de dezembro do próximo ano. É difícil acreditar que a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara dos Deputados, onde se aprecia a constitucionalidade e a legalidade de uma propositura, não tenha avaliado os projetos de lei à luz da LC 173.
Também caberia à Comissão de Finanças e Tributação emitir parecer sobre os méritos do projeto, mostrando que eles não cumprem os dispositivos da LRF e nem atendem ao artigo 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), que exige que a proposição legislativa que crie ou altere despesa obrigatória ou renúncia de receita seja acompanhada da estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro.
Com suas decisões da semana passada, os deputados abriram a porteira para o aumento das despesas públicas. Caberá agora ao Senado não referendar as decisões, mantendo as proibições previstas na lei complementar 173.
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