O
Brasil foi desarmado para a guerra contra a pandemia
Como disse Pedro Malan, no Brasil até o passado é incerto. Avaliar o debate sobre a PEC Emergencial antes de sua aprovação é temerário. No entanto, quando escrevia esta coluna o Senado já tinha aprovado a proposta de emenda constitucional de forma razoável: abrindo espaço para o auxílio emergencial com a manutenção do teto de gastos. E, em meio a intenso debate, a emenda provavelmente será definitivamente aprovada nesse formato.
A
aprovação definitiva da PEC Emergencial respeitando a integridade do conceito
de teto de gastos é apenas uma batalha na guerra travada neste momento pelo
povo brasileiro. A questão fiscal permanece relevante com o futuro debate do
Orçamento da União e o andamento das reformas constitucionais e
infraconstitucionais. Mas outras batalhas estão em curso.
Meus leitores sabem que, no fim de janeiro do ano passado, coloquei aqui mesmo minhas preocupações com a epidemia que vinha da China. Alertava que seria um imenso desafio para governos e sociedade. E com repercussões alarmantes, caso se alastrasse. Tempos depois escrevi Ano Zero, livro que traz uma reflexão sobre a economia e a política no pós-pandemia e que está disponível em Veja Insights, no site desta revista.
“O
auxílio emergencial foi essencial, mas não houve um programa de retomada do
crescimento”
Embora
minhas preocupações e as de outros tenham sido transmitidas às autoridades
ainda em janeiro, o Brasil partiu desarmado para a guerra contra a pandemia.
Eventos tão extraordinários como esta crise sanitária exigem foco, liderança e
planificação. Aspectos que foram insuficientes ao longo da evolução da
pandemia. Pela capacidade econômica do Brasil, nosso programa de vacinação
deveria ter sido iniciado em dezembro do ano passado. Não fosse a “vachina” do
Instituto Butantan, a nossa situação seria muito, muito pior. Em tempos de pandemia,
cada dia desperdiçado resulta em vidas perdidas e atrasos na retomada das
atividades.
No
campo econômico, as respostas foram parciais e, de alguma maneira, não houve
uma tragédia maior. O auxílio emergencial foi essencial, mas não se traçou um
programa estruturado de retomada do crescimento econômico da magnitude que
situações como a pandemia exigem. Não há saída de crises profundas sem esforços
organizados. Foi assim na Grande Depressão, dos anos 30, no pós-guerra dos
anos 40 e após o crash de 2008.
Todos
sabem que as crises também significam oportunidades. Perdemos a chance de
debater soluções estruturantes para a miséria, a pobreza, a economia informal,
a qualidade da educação e o fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS).
Ficamos no meio do caminho cuidando da questão fiscal e distribuindo dinheiro
para os necessitados. Não basta. Infelizmente, o país não para de validar a
frase do economista Roberto Campos: “O Brasil não perde a oportunidade de
perder uma oportunidade”.
A
pandemia nos dá a possibilidade de encaminhar questões estruturais, que
deveriam ser enfrentadas com determinação, organização e patriotismo. Sobraram
chiliques, meias verdades, guerra de egos, conflito de competências,
indefinição e negacionismo. Milhares de pessoas morreram. E essa tragédia
poderia ter sido, pelo menos, minimizada.
Publicado em VEJA de 10 de março de 2021, edição nº 2728
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