Há
disputa nos bastidores em torno da potência de instrumentos como retomada do
BEm
Há
quatro condições necessárias para a retomada do crescimento, segundo se avalia
no gabinete do ministro da Economia, Paulo Guedes: 1. vacinação; 2. fiscal; 3.
fiscal e 4. fiscal.
O
alerta contido no boletim regional do Banco Central não poderia ser mais claro:
em janeiro, a economia do Amazonas retornou aos níveis de abril de 2020. Dava
sinais de haver se acomodado ainda abaixo disso no fim de fevereiro. O que
aconteceu lá “sinaliza os possíveis impactos de um agravamento severo da
epidemia em outras regiões”.
A
“frescura” e o “mimimi” estão jogando a economia na lona de novo. A
intensificação das medidas de isolamento, que nenhum governante queria adotar,
se impôs.
O
primeiro trimestre de 2021, antes contado como parte de uma recuperação em “V”
da economia, agora é dado como perdido em termos de crescimento. Possivelmente,
o segundo trimestre também será comprometido, avalia-se na área econômica. Se a
vacinação avançar sem percalços, é possível pensar em melhora no segundo
semestre deste ano.
Nesse quadro, medidas de socorro que se pretendiam encerradas em 31 de dezembro de 2020 vão ter de voltar. É aí que mora o perigo.
Serão
despesas a mais num país cujas contas já estavam mal antes da pandemia. No ano
passado, o governo federal gastou o que podia e o que não podia: R$ 549,8
bilhões em medidas emergenciais. Agora, se vê limitado na adoção de novos
instrumentos de socorro. Precisa mostrar à banca que terá como pagar essa
dívida, que só cresce.
O
risco de perda de controle sobre as contas está no horizonte há algum tempo e
já vinha apresentando a fatura: dólar mais alto, risco-país mais elevado, taxas
de juros futuras apontando para cima. Há oito semanas, analistas de mercado
revisam para cima suas estimativas para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo
(IPCA) de 2021.
A
alta da inflação ligou sinais de alerta no Ministério da Economia. Se a
política fiscal não der sua contribuição para conter os preços, o trabalho
sobrará para a política monetária. Ou seja, os juros subirão e o Brasil voltará
a ser o “paraíso dos rentistas” que Paulo Guedes tanto se orgulha de ter
eliminado.
Por
isso a área econômica tanto insiste que a retomada das medidas emergenciais
contra a pandemia seja feita de forma sustentável para as contas públicas. A
prorrogação do auxílio emergencial foi proposta junto com medidas que permitem
cortar gastos, para transmitir essa mensagem.
Foi
nesse ponto que o trem quase descarrilou. No início da semana, o clima no
Ministério da Economia era de pânico diante da possibilidade de ser incluída na
Proposta de Emenda à Constituição (PEC) Emergencial a retirada do Bolsa Família
do teto de gastos.
Seria
o início do fim do teto, pois outras despesas poderiam seguir o mesmo caminho.
Pior ainda: essa proposta contou, na melhor das hipóteses, com a simpatia do
presidente Jair Bolsonaro. Negociadores chegaram a atribuir a ele a ordem de
furar o teto.
Foi
o ápice de uma tensão que escalava havia alguns dias. Desde a semana passada,
pessoas próximas a Guedes demonstravam preocupação com o rumo da negociação. O
que se via no eixo Planalto-Congresso era interesse apenas na prorrogação do
auxílio emergencial. Nada de contrapartidas impopulares. E zero empenho do
presidente para segurar as pressões por mais gastos.
Esse
era o ambiente quando, na sexta-feira passada, Guedes deu uma entrevista para o
youtuber Thiago Nigro, do canal Primo Rico, que foi ao ar na última
terça-feira. Avisou que o Brasil poderia entrar em crise econômica como alguns
países vizinhos. Deu prazos: para virar Argentina, seis meses. Para ser
Venezuela, um ano e meio. E apresentou o contraponto: para virar Estados Unidos
ou Alemanha, são 15 anos no sentido oposto.
Na
mesma terça-feira, foi divulgado um documento produzido pela Secretaria de
Política Econômica (SPE), que integra a estrutura do Ministério da Economia.
Traduzindo do economês, a mensagem é: se quiserem colher os louros fáceis de
prorrogar o auxílio emergencial sem nenhum sacrifício de corte de outras
despesas, saibam que as consequências econômicas serão graves e vão surgir
logo. Antes das eleições.
Por
outro lado, prossegue a mensagem subliminar da nota da SPE, o político
suficientemente esperto pode se creditar dos resultados produzidos pela
consolidação fiscal. Juros baixos, por exemplo. O financiamento da casa própria
está barato.
Ajudado
pelo mercado financeiro em polvorosa com a perspectiva da retirada do Bolsa
Família do teto, Guedes conseguiu virar o jogo. Depois de um dia tenso, a PEC
foi aprovada pelo Senado sem o dispositivo. A segunda votação ocorreu ontem sem
maiores dificuldades.
Mas
o clima segue tenso na área econômica. A matéria ainda tem de passar pela
Câmara. A esperança é que a reação positiva do mercado às declarações do
presidente da casa, Arthur Lira (PP-AL), a favor do teto sirva de reforço
contra novas investidas na mão contrária.
Se
o dique não se rompeu, segue sob ameaça. Não se sabe qual será a extensão das
novas medidas de isolamento social ou seus reflexos sobre a economia.
A
área econômica já admite a possibilidade de retomar programas com impacto
fiscal, para combater os efeitos de mais essa etapa, priorizando os mais
efetivos.
Há
disputa nos bastidores em torno da potência dos instrumentos. A ideia dos
técnicos é recriar o BEm numa versão mais restrita, na qual a compensação para
o trabalhador que teve o contrato de trabalho suspenso ou reduzido venha do
Fundo e Amparo ao Trabalhador (FAT) e seguindo regras mais rígidas de acesso.
Mas outra ala quer reeditar o programa de 2020.
Os próximos dias serão difíceis, com a covid-19 mais violenta do que nunca e a queda da economia diante das inevitáveis medidas de isolamento. Essa tragédia terá de ser enfrentada com responsabilidade, e não com populismo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário