Um
dia a casa cai (nada a ver com a mansão do Zero Um)
Ainda
bem que o presidente Jair Bolsonaro cancelou as assinaturas de jornais dos dois
palácios à sua disposição, o Alvorada onde mora, e o Planalto onde despacha, e
estendeu a medida aos ministérios e demais órgãos da administração pública.
Ainda bem, como disse outro dia, que já não assiste aos telejornais da Rede
Globo.
Talvez
se informe pelo SBT – o sistema bolsonarista de televisão que o poupa de
críticas. Do contrário, com a mania de perseguição que o atordoa a bater nos
píncaros, a essa altura teria concluído que o mundo inteiro, e um pouco além,
está de sacanagem com ele, e que ele tem mais é que ignorá-lo para preservar
sua saúde.
Por falar em saúde… Nas últimas 24 horas, o Brasil registrou 1.786 mortes. Morreram até ontem 261.188 vítimas da Covid. São, em média, 1.361 mortes por dia. É o sexto recorde seguido, um aumento de 30% em duas semanas. É a média de mortes mais alta desde o início da pandemia há um ano.
Gustavo
Franco, ex-presidente do Banco Central, fez a seguinte conta quando o número de
mortos era de 259.271: o Brasil tem 2,7% da população mundial; como o total
global de mortes desde o início da pandemia foi 2.580.000, deveriam ter morrido
69.660 pessoas no Brasil. Só que foram 259.271 – 189.611 mortes a mais.
Atualizando
a conta de Franco: 191.528 mortes a mais. E logo no dia em que, exasperado,
Bolsonaro foi a Uberlândia, no Triangulo Mineiro, e descontrolou-se quando
perguntado sobre a compra de vacinas. “Tem idiota que a gente vê nas redes
sociais, na imprensa: ‘Vai comprar vacina’. Só se for na casa da tua mãe”,
respondeu.
E
completou: “Não tem para vender no mundo”. De fato, não tem. Ou melhor: não tem
para governantes que desprezaram a compra de vacinas, duvidaram da sua
eficácia, esperaram ser procurados por vendedores aflitos e estimularam seus
governados a acreditar em tratamento preventivo à base de outras drogas.
Foi
o caso dele. Ainda ontem, no interior de Goiás à caça de votos para se reeleger
porque só pensa nisso, Bolsonaro esbravejou: “Chega de frescura e de mimimi.
Vão ficar chorando até quando?” No passado, ele chamou o Brasil de “país de
maricas” e aconselhou as pessoas a enfrentarem o vírus “como homem”.
Por
que não enfrentam o vírus como mulher? Bolsonaro dá preferência aos homens em
suas mensagens. Trai certo desconforto diante das mulheres. Talvez porque elas,
há dois anos, resistiram a votar nele. Bolsonaro deve sua vitória aos homens. E
é na companhia deles que se sente à vontade.
Desligar-se
da realidade ou negá-la é a maneira que encontrou para driblar tudo que o
contrarie. A Fiocruz fez um alerta sobre o avanço de variantes da Covid no
Brasil. Pesquisadores analisaram dados de oito estados. Em seis deles, mais da
metade das amostras apresentou vírus que sofreram mutação. (Te liga,
Bolsonaro!)
Ao
menos 13 milhões de doses da vacina da AstraZeneca esperadas para este
mês não deverão ser entregues, indica um cronograma do Ministério da
Saúde. Um levantamento de sete organizações da sociedade civil denunciou a falta
de transparência na divulgação de dados sobre a vacinação. (Te liga,
Bolsonaro!)
A
Confederação Nacional de Municípios cobrou a compra e a distribuição rápida dos
350 milhões de doses anunciados pelo Ministério da Saúde na última
quarta-feira. Se isso não acontecer, municípios e Estados partirão para a
aquisição suplementar dos imunizantes. Não podem mais esperar. (Te liga,
Bolsonaro!)
Catorze
governadores estaduais divulgaram uma carta ao presidente em que pedem
providências para obter novas doses de imunizantes de modo a controlar o
aumento exponencial de casos de infecção e mortes pelo coronavírus. Dizem que
estão no limite de suas forças e possibilidades. (Te liga, Bolsonaro!)
A
ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal, determinou que o Ministério
da Saúde reative imediatamente os leitos de UTI para Covid que foram fechados no
Piauí. Ela já acolheu pedidos semelhantes dos governos de São Paulo, Bahia e
Maranhão. O Ministério da Saúde nada disse. (Te liga, Bolsonaro!)
O
ministro da Economia, Paulo Guedes, defendeu a vacinação em massa e destacou
que, sem saúde, não há economia: “Precisamos de saúde, emprego e renda.
Primeiro a saúde, sem saúde não há economia. Da mesma forma, a vacinação em
massa é que vai permitir manter a economia em funcionamento”.
Até
tu, Guedes? Te liga, Bolsonaro! Um dia a casa cai.
Chega
de frescura e de mimimi contra o Supremo
Bolsonaro
diz ter um plano, só não diz qual
Vire
e mexe, dia sim e outro também, o presidente Jair Bolsonaro volta a repetir o
lenga-lenga de que o Supremo Tribunal Federal o impediu de adotar medidas para
combater a pandemia do coronavírus, transferindo tal poder para governadores e
prefeitos.
Da
vez mais recente, Bolsonaro disse: “Eu tenho um plano”. Não revelou qual. Esclareceu
que só não pode implantá-lo porque o Supremo não o deixa. Sob anonimato, um dos
11 ministros do Supremo respondeu em tom de deboche:
–
Os brasileiros são seres azarados. Os mortos pela Covid logo somarão 300 mil.
Perdem a vida antes de conhecer os talentos ocultos do chefe da nação. Morrem
sem saber que é um gênio o presidente do Brasil.
Em
seguida, citou trecho de uma nota a respeito divulgada pelo tribunal em 18 de
janeiro último:
“Na verdade, o plenário decidiu, no início da pandemia, em 2020, que União, estados, Distrito Federal e municípios têm competência concorrente na área da saúde pública para realizar ações de mitigação dos impactos do novo coronavírus. Esse entendimento foi reafirmado pelos ministros do STF em diversas ocasiões. Ou seja, conforme as decisões [tomadas pelo STF], é responsabilidade de todos os entes da federação adotarem medidas em benefício da população brasileira no que se refere à pandemia.”
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