sexta-feira, 5 de março de 2021

Nelson Motta - Quanto vale uma vida?

- O Globo

Muitas vezes viajando pela Europa me impressionava o valor que davam a vidas humanas. Enquanto isso, no Brasil, sempre me horrorizou o desprezo que o Estado e a sociedade têm pela vida humana

Para as famílias e os amigos, não tem preço. Mas, para a economia, a política e o Estado, tem, em reais ou em dólares.

Muitas vezes viajando pela Europa me impressionava o valor que davam a vidas humanas, os cuidados, a proteção. Aos poucos entendi que não era só por humanismo, mas pelo que cada um custava ao Estado do bem-estar social, até se tornar um pagador de impostos em tudo que trabalha, produz e consome.

Enquanto isso, no Brasil, sempre me horrorizou o desprezo que o Estado e a sociedade têm pela vida humana (a imagem-símbolo é um corpo estirado chão coberto por um jornal ), que foi explicitado e exacerbado na pandemia pelo negacionismo e a impiedade do presidente da República. Na falta de coração, deveria ao menos pensar no bolso do cidadão, mas o cara ignora o prejuízo real, em reais, que os mortos e contaminados dão a um Estado que gasta R$ 40 mil por ano com cada preso e R$ 15 mil por estudante do ensino superior. Imaginem com internações hospitalares.

Quanto custa ao Estado, ao contribuinte, manter, do berço à universidade, um cidadão brasileiro? Qual o valor contábil de uma vida inteira usando maternidades, creches, escolas e universidades públicas, serviços públicos de saúde, tudo bancado pelo Estado? Algum economista amigo por favor me ofereça um cálculo aproximado. Só se sabe que é um custo monstruoso, mas não o seu exato tamanho. Quanto custou o cidadão até entrar no mercado de trabalho e começar a produzir e pagar impostos? Quanto vale uma vida, em reais ou dólares, no Brasil ?

Enquanto as famílias choram a perda de seus 250 mil mortos, o Estado sequer lamenta a diminuição na força de trabalho e nos consumidores e pagadores de impostos, um baita prejuízo que será pago por todos que sobreviverem.

Ainda me lembro de Bolsonaro dizendo, colérico, no início da pandemia: “Se todo mundo ficar em casa, a economia acaba, e, se a economia acabar, acaba o meu governo.”

O “Axioma de Jair” é incontestável e está sendo provado todo dia por suas palavras e ações. Criou um chavismo de direita, fez uma aliança pelo atraso com o Centrão, e também com o PT, unidos pelo nacionalismo estatizante e pelo fim da Lava-Jato, gerando um inimaginável bolsopetismo, que exclui qualquer possibilidade de uma frente de esquerda, de centro e de centro-esquerda capaz de derrotá-lo.

Para ir ao segundo turno lhe bastam seus 30% de fanáticos. Os restantes 60% que o desaprovam só unidos podem vencer a eleição com Ciro, Dória, Moro, Mandetta ou Haddad.

Outro exercício de futurologia: como Flávio Bolsonaro vai pagar as prestações de R$ 18 mil a R$ 21 mil da mansão com seu salário liquido de R$ 25 mil do Senado? Como vai manter uma casa imensa que exige muitos empregados, todos com carteira assinada e direitos trabalhistas? Como não vai ser senador para sempre, quando sair, como não sabe fazer nada, vai pagar como? Ah, tem a mulher dentista, que vai começar a buscar clientes em Brasília.

O maior burro é o que acha que burros são os outros.

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