Os
filhos zero ajudaram o pai a ganhar mais uma vez
Despenca o grau de segurança dos ministros e demais auxiliares de Jair Bolsonaro quanto à permanência de cada um deles no governo. E por uma simples razão: se você faz algo no cargo que desagrada a Bolsonaro, pode ser demitido a qualquer momento. Se você obedece a todas as ordens dele, arrisca-se a ser demitido.
Tem
mais: se você cair na mira de fogo de alguns dos filhos zero do presidente, seu
emprego não vale nada. Foi assim que Gustavo Bebianno, então ministro da
Secretaria-Geral da presidência, acabou dispensado. Carlos Bolsonaro, o Zero
Três, sentia ciúmes de sua aproximação excessiva com o pai. Daí…
Outro
ministro, esse tido como poderoso porque amigo há mais de 40 anos de
Bolsonaro, também desagradou a Carlos e dançou. O filho convenceu o pai de que
o general Carlos Alberto dos Santos Cruz, ministro da Secretaria do Governo,
conspirava para derrubá-lo. Valeu-se para isso de uma notícia falsa.
A
insegurança dos que servem a Bolsonaro aumentou depois que ele demitiu o
ministro da Saúde, o general Eduardo Pazuello, cujo erro foi ter cumprido todas
as vontades do presidente sem nem pestanejar. A ponto de humilhar-se certa vez
ao dizer com um sorriso amarelo: “Manda quem pode, obedece quem tem juízo”.
Não bastou para Pazuello ter juízo. Ele foi obrigado a ceder o lugar a um cardiologista que nunca ocupou um cargo público e que deve sua indicação a Flávio Bolsonaro (Republicanos), conhecido como Zero Um e às voltas com a justiça desde que foi denunciado por peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
Pazuello
caiu, pois, por excesso de obediência, além do fato de que o Centrão pediu a
Bolsonaro a cabeça dele, e para manter a sua, o presidente entregou. Marcelo
Queiroga será o quarto ministro da Saúde em pouco mais de um ano. Henrique
Mandetta foi demitido porque não quis obedecer. Nelson Teich, pelo mesmo
motivo.
Os
filhos zero deram mais uma inegável demonstração de força junto ao pai quando
pareciam enfraquecidos. Eduardo Bolsonaro, o Zero Três, participou do
interrogatório da médica Ludhmila Hajjar, cardiologista famosa, cujo nome era
apoiado pelo Centrão, o presidente da Câmara e ministros do Supremo Tribunal.
Convocada
a Brasília, ela compareceu pensando que se tratava de coisa séria. Estava
disposta a aceitar o convite. Pediu autonomia para montar sua equipe e mais
vacinas. Mas era uma farsa. Foi recebida por Bolsonaro, Eduardo e Pazuello, que
admitiu estar de saída porque carecia de apoio político. Imaginem a cena…
Eduardo
quis saber a opinião dela sobre aborto e armas para a população – Ludhmila
espantou-se e desconversou. Bolsonaro foi logo dizendo que ela não poderia
decretar lockdown no Nordeste para não “foder” a reeleição dele. Antes que o
encontro terminasse, a médica já estava sendo achincalhada nas redes sociais.
De
volta ao hotel, ficou sabendo que o número do seu celular havia sido divulgado
em grupos de WhatsApp e que estava sendo ameaçada de morte. Ainda passou pelo
susto de três tentativas frustradas de invasão do seu apartamento. No dia
seguinte, procurou Bolsonaro, agradeceu o chamado e despediu-se.
Antes
de embarcar para São Paulo, onde trabalha no Instituto do Coração, leu em sites
que o ministro das Comunicações, Fábio Faria, negou que ela fora convidada
para suceder Pazuello. Só então se deu conta da armadilha em que se deixou
aprisionar. Decência é um atributo que falta à família presidencial brasileira.
Era
previsível o desfecho do episódio. Bolsonaro nunca quis rever sua posição em
relação ao combate à pandemia que, segundo Ludhmila, poderá matar de 500 mil a
600 mil pessoas. Está perto das 300 mil. É para que morram os que tiverem de
morrer da “gripezinha” que, em dezembro, estava no seu “finalzinho”.
Então
que venha Queiroga, um ilustre desconhecido, curtidor dos comentários do
presidente e amigo da família. Boa sorte! Porque da próxima vez, como observa
irritado um dos líderes do Centrão, não estará em foco a troca de mais um
ministro da Saúde caso Queiroga fracasse, mas sim a troca do presidente da
República.
A
semente da violência política se espalha pelo país
O
mau exemplo vem do alto
Um
repórter do jornal O Estado de Minas foi agredido, ontem, em Belo Horizonte por
manifestantes bolsonaristas que protestavam contra as medidas de isolamento,
pediam o fechamento do Supremo Tribunal Federal e defendiam a ditadura militar
de 64.
O
cardápio, pois, era o de sempre, apresentado há um ano em Brasília diante do
Quartel-General do Exército com a presença do presidente Jair Bolsonaro. O
Supremo abriu inquérito para apurar quem financia manifestações hostis à
democracia.
Mas,
como se vê, elas voltaram a se repetir, e, agora, com o emprego de violência
contra jornalistas obrigados a cobri-las. O resultado da parceria de Bolsonaro
com a Covid está deixando os bolsonaristas cada vez mais nervosos, e aí mora o
perigo.
O
governador João Doria registrou queixa na polícia contra os que o ameaçam de
morte. Em vídeo gravado no último dia 13, em São Paulo, um homem dá tiros em
alvos improvisados e chama Lula de “filho da puta”. Depois, vira-se para a
câmera e vocifera:
“Presta
atenção no recado que eu vou dar para você, seu vagabundo: se você não devolver
os R$ 84 bilhões que você roubou do fundo de pensão dos trabalhadores, você vai
ter problema, hein, cara? Você vai ter problema”.
A
segurança de Lula será reforçada em breve. E os que no momento fazem parte dela
receberão novos treinamentos. A direção nacional do PT pedirá a abertura de
processo contra o homem do vídeo. Avisado, Doria tomará suas providências.
O
governo federal não dá sinais de preocupação com nada disso. Pelo contrário:
sempre que pode, como ocorreu na semana passada, Bolsonaro fala em Estado de
Sítio, afirma que é muito fácil implantar uma ditadura no país e diz que o
ditador seria ele.
Não levar a sério o que o presidente da República propaga nas redes sociais lembra o comportamento de milhões de brasileiros que apenas o viam como um candidato dado a falas exageradas. Não havia exagero. Era Bolsonaro em estado bruto tal como é.
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