O Brasil foi surpreendido com a notícia de que a Lei Orçamentária Anual, além de ter sido aprovada muito tardiamente, alocou o valor de R$ 49,3 bi em emendas dos parlamentares ao Orçamento. Políticas públicas provenientes dessas emendas são peça-chave para a sobrevivência eleitoral de parlamentares, pois, ao nutrir as suas redes locais de interesse nos municípios, elas aumentam as chances de reeleição dos legisladores.
Esse
valor é substancialmente maior do que os alocados em anos anteriores. Na
realidade, tanto a demanda dos parlamentares por emendas como seu gasto efetivo
durante o governo Bolsonaro quase triplicaram: de R$ 19,2 bi para R$ 46,3 bi
(LOA) em 2019 e de R$ 5,7 bi para R$ 16,1 bi (pagas) em 2020, respectivamente.
Para
abrir espaço a essa demanda vultosa de emendas, os parlamentares subestimaram
alguns dos gastos obrigatórios do governo. Diante dos riscos de que essa
escolha abrisse flancos jurídicos com a Lei de Responsabilidade Fiscal e com o
teto de gastos, o governo foi obrigado a vetá-las parcialmente para o montante
de R$ 35,5 bi.
Por que o governo Bolsonaro tem sofrido esse expressivo aumento nos custos de governabilidade?
Os
custos de governabilidade são inflacionados quando o presidente está
politicamente vulnerável com a sociedade e/ou quando gerencia mal a sua
coalizão. Além de pagar mais caro, o presidente também corre riscos de perder
poderes outrora delegados pelos próprios legisladores.
No
governo FHC, por exemplo, a perda em 2001 da prerrogativa de reeditar
indefinidamente medidas provisórias decorreu da quebra da sua coalizão, com
saída do PFL, e da queda de sua popularidade. Em 2015, Dilma perdeu o direito
de executar de forma discricionária as emendas individuais ao Orçamento, após
ver sua popularidade despencar e enfrentar vários problemas na sua coalizão.
Temer também foi compelido a executar de forma impositiva emendas dos
parlamentares para barrar as denúncias de corrupção da PGR. Já Bolsonaro viu o
Congresso promulgar o Orçamento impositivo também para as emendas coletivas das
bancadas estaduais ao Orçamento quando perdeu suporte entre os eleitores sem
ter uma coalizão majoritária.
Os
parlamentares perceberam que as emendas impositivas não mais exigiriam apoio ao
governo para que fossem executadas. Com isso, o governo tem precisado encontrar
outras moedas de troca, como é o caso das “transferências especiais”,
conhecidas como emendas “cheque em branco”, pois não requerem informação sobre
a destinação de recursos nem prestação de contas aos órgãos federais de
controle.
Os
custos que o presidente tem enfrentado não são apenas financeiros. O Executivo
nutria a esperança de que a sua vida viesse a ficar mais segura e tranquila com
a eleição dos seus candidatos a presidente da Câmara e do Senado. Mas o perfil
minoritário de sua coalizão não foi suficiente para que a CPI da Covid deixasse
de ser instalada e em condições de minoria.
Se
as organizações de controle “externas” à política (Judiciário, Ministério
Público, Polícia Federal, Tribunais de Contas etc.) têm apresentado um certo
arrefecimento diante das iniciativas de interferência do governo Bolsonaro, os
parlamentares conseguiram, por meio da CPI da Covid, ressuscitar um dos
objetivos precípuos e constitutivos do Legislativo. Qual seja, exercer o
controle direto do Executivo.
Parece existir no Brasil uma espécie de efeito substitutivo entre mecanismos de controle externos e internos ao Executivo. Quando os primeiros estão presentes e ativos, o Legislativo prefere não arcar com os custos de controlar diretamente o presidente. Mas, quando percebe fragilidades nos controles externos, assume esse papel abertamente.
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