Folha de S. Paulo
A ditadura chinesa se legitima entregando
generosos índices de crescimento
Se Lula pretende mesmo pintar-se com as
cores do candidato moderado que nos livrará de Jair Bolsonaro, não pode
atravessar o mar do Caribe para abraçar problemas que não são seus e
fazer afagos
na ditadura cubana. Moderados de verdade não passam a mão na cabeça de
regimes autoritários quando reprimem manifestações populares.
O que eu gostaria de discutir hoje, porém, não é tanto Lula, mas a legitimidade de ditaduras. Nossa reverência quase religiosa para com a democracia faz com que tenhamos dificuldade para pôr na mesma frase as palavras "legitimidade" e "ditadura", mas a grande verdade é que a maioria dos habitantes do planeta está mais interessada em seu próprio bem-estar e no da família do que em abstrações como liberdade de expressão, freios e contrapesos institucionais etc.
Com efeito, muito antes de o primeiro
sistema representativo instalar-se no planeta, regimes políticos tinham de
lidar com o espectro de revoltas populares que poderiam derrubá-los. O remédio
sempre foi uma combinação de repressão com populismo, que podia assumir a forma
de "pão e circo" ou recorrer a expedientes mais sofisticados.
A ditadura chinesa se legitima entregando,
já há várias décadas, generosos índices de crescimento econômico. Os militares
brasileiros também fizeram algo parecido na década de 70. Mesmo em democracias,
é relativamente barato comprar a boa vontade do eleitor. Até o Bolsonaro
conseguiu com o auxílio emergencial, que, por um tempo, lhe assegurou
confortáveis taxas de popularidade.
O problema de Cuba é que já faz um bom tempo que o regime parou de entregar bem-estar —e não por causa do embargo americano. A economia cubana funciona mal porque economias planificadas funcionam pior do que as de mercado. A China descobriu isso e foi capaz de fazer as reformas que permitiram promover dinamismo econômico conservando os aspectos ditatoriais do regime. Cuba não conseguiu.
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